terça-feira, 10 de maio de 2022

Dave Brubeck e suas canções de amor

Por Edmilson Siqueira 

Foi muito bom alguém ter a ideia de juntar num só discos várias gravações de Dave Brubeck que versam sobre o romance, o amor, temas mais delicados que, na maestria do seu piano, se tornam inesquecíveis. Ainda mais se a esse piano se juntam ao sax alto de Paulo Desmond, o contrabaixo de Eugene Wright e a bateria de Joe Morello. O resultado é um disco onde a suavidade do grupo e a criatividade dos instrumentistas, todos jazzísticos por natureza e talento, se sobressaem nas ricas melodias de vários e grandes compositores norte-americanos. 


O texto na contracapa do disco, que infelizmente não é assinado, assinala:  "Todo o material aqui, exceto as pérolas de Brubeck, "In Your Own Way" e "Audrey", pertencem ao The Great American Songbook Alist, com contribuições de mestres como Porter, Bernstein, Rodgers and Hart, Burke & Van Heusen e Soudhein, cintilantemente digitalizado. A maior parte do repertório é executada pelo Dave Brubeck Quartet - apresentando o saxofone alto do parceiro de longa data Paul Desmond, o sempre constante baixista Eugene Wright e a bateria espetacular de Joe Morello - que durante todos esses anos juntos, de 1958 a 1967, foi o mais popular conjunto jazzístico do seu tempo, talvez de todos os tempos. E por uma boa razão, pois as conversas de Brubeck e Desmond em contraponto eram ao mesmo tempo sofisticadas e completamente acessíveis." 


O disco se chama "Love Songs" e o título não poderia ser mais apropriado para a coletânea escolhida. Logo de cara, "My Romance", de Rodgers e Hart, seguida de "What Is This Thing Called Love" de Cole Porter. "These Foolish Things" de H. Marvell, J. Srachey e H. Link, vem a seguir. A quarta faixa - In Your  Own Sweet Way, do próprio Dave - é a única apenas com seu piano. O quarteto volta na faixa seguinte - "Somewhere", de L. Bernsteins e S. Sondhein. "La Paloma Azul", um tema folclórico com arranjo do próprio Brubeck é a sexta faixa. Uma parceria entre Brubeck e Paul Desmond - "Audrey" é a próxima faixa e nesta, Bob Bates é o baixista e Joe Dodge é o baterista. Eugen Wright e Joe Morello voltam na música seguinte - "You Go To My Head", de H. Gillespie e J.F. Coots. A ´penúltima faixa é "Like Someone In Love", de J. Burke e J. Van Heusen. O disco se encerra com um toque latino com o clássico "Besame Mucho", de C. Velazquez.

Trata-se do mais puro jazz que um quarteto de piano-sax-baixo-bateria poderia oferecer, habilmente apresentado por talentosos músicos comandados por um dos gênios do gênero: Dave Brubeck 


O CD está à venda nos bons sites do ramo e pode ser ouvido na íntegra no YouTube neste endereço: https://www.youtube.com/watch?v=NgoLOT7QQiM&list=PLjibNeIuIqXc45salNlTAwMku-X8dJAkr . 

segunda-feira, 9 de maio de 2022

À Tatiana Rocha

 Por Ronaldo Faria


Trazida de longe. Tátil, Ana.

Riso maroto. Brancos dentes a sorrir. Em mi.

E o Sol dá-se em ré. Haja dó. Nem que seja lá.

Defronte, o mar se mostra frágil ponte.

Lá longe, um horizonte.

Um dragão por trás dos montes...

Tragicomédia além da fonte.

 

Vinda de outras terras, falácias, falésias e quimeras.

Caranguejos ao dente, feras a dobrar.

E areia molhada a vestir o velho porvir.

Poetisa que se mimetiza a sorrir.

Embriagada de vento a voar e cerzir.

A costurar presente e futuro,

Entre um acordar e um tanto de dormir.

 

Filha do tempo, fluminense, baiana e o que vier por vir.

Ser passageiro, carinho matreiro.

Metro e uns tantos, para lá de métricos volteios.

E assim vai: sempre de onde veio...

Descobrindo a diferença entre o pão e o centeio.

Passeando no fio da navalha, no meio.

Tatiana, à tua rocha lapidada, o veio...

 

A pular as ondas, passar-se ao tempo,

A descobrir que entre o homem e a morte há sorrir e lamento.

E panelas saudosas, plantas aquosas.

Cães a latir e árvores a plantar magias sem fim.

Ruas iguais, quais sensações como tais.

E novos palcos e mil cantares fetais.

Trazida de longe, tátil e Ana, vive apenas a querer mais.

Que os deuses da África a mostrem feito mágica.

sábado, 7 de maio de 2022

A gente faz por telepatia

 Por Ronaldo Faria

 


Barulho, arrulho, milho e olho, caolho.

No Nordeste fala-se “mirolho”...

Cata-cavaco, caô, canal...

Filho de santo e cabeça, animal.

“O normal é anormal.”

Solitário e notívago, de olheiras e tal.

À espera de abrir-se desigual.

Novembro me espera sem horário, lalau.

E desce cerveja, desce vodca, tudo banal.

Para rimar, a mulher e o seu cheiro (...)

Bom dia, boa noite. É Carnaval!

sexta-feira, 6 de maio de 2022

Um Noel diferente com Cristina Buarque e Henrique Cazes

Por Edmilson Siqueira 

Que Noel Rosa foi um dos maiores compositores da tal da música popular brasileira não resta qualquer dúvida. Em apenas oito anos de atividade musical ele inovou em todos os campos do samba, criou várias tendências, deixou um repertório irrepreensível que, exatos 85 anos depois de sua morte (ele morreu em 4 de maio de 1937) continua sendo gravado.  


E entre todas as regravações da obra de Noel, como a ótima de Ivan Lins já comentada aqui, uma das mais interessantes foi a produzida por Cristina Buarque e Henrique Cazes, em 1993. Os dois, grandes conhecedores do samba e da música em geral, decidiram fazer não um disco comum, com os grandes sucessos de Noel e sim algo "que fugisse do repertório óbvio e não caísse no vazio das releituras ecléticas", como assinala o texto no encarte do disco que, infelizmente não é assinado. 


Partindo desse princípio, o que se vê no disco são várias obras de Noel que pra muitos soam como inéditas, já que não fazem parte do repertório tradicional que é sempre reproduzido quando se quer homenagear o Poeta da Vila.  

Henrique Cazes participou, por mais de 15 anos, do conjunto Coisas Nossas, especialista na obra de Noel, e Cristina, desde sempre, foi familiarizada com o universo do samba. Juntos, montaram um disco - na verdade foi um show montado que virou disco - para mostrar as várias facetas de Noel, como "o cronista que não perdeu a atualidade, o humorista, o inovador de formas..." 


O título do disco e do show é "Sem Tostão... A Crise Não É Boato" e junta o nome de um samba com a uma afirmação de Noel durante uma entrevista: "A crise é a única coisa no Brasil sobre a qual podemos afirmar... não é boato". Noel morreu em 1937 e a crise, bem a crise insiste em nos acompanhar eternamente.  


O sucesso do show foi tanto que a dupla preparou um segundo, que também virou disco. Mas é o primeiro disco que estamos sugerindo aqui. O segundo será assunto num dia desses.  


A ótima seleção do show começa com Três Apitos, um samba mais que conhecido de Noel, mas logo entra no repertório mais "escondido" do compositor: Mulato Bamba, Mulata Fuzarqueira, João Ninguém, Saí da Tua Alcova, Para me Livrar do Mal (com Ismael Silva), Nunca Dei a Perceber (com Ismael Silva). Muitas dessas faixas são precedidas de uma história engraçada ou curiosa, contada por Henrique Cazes, como é o caso de O X do Problema, Triste Cuíca (com Hervê Cordovil) e Século do Progresso.  


Quando o Samba Acabou, Você por Exemplo, Tudo que Você Diz, Pra que Mentir (com Vadico) , Mentir, Você Só ...Mente (com Hélio Rosa), cordiais Saudações, Quem dá Mais, Faz Três Semanas, Sem Tostão (com Arthur Costa), Onde Está a Honestidade?, Pela Décima Vez, Só Pode Ser Você, (com Vadico), Cem Mil-Réis (com Vadico), Quem Ri Melhor, Último Desejo, Adeus (c0m Ismael Silva), Feitiço da vila (com Vadico) completam o disco-show que dá um panorama diferente – e com a mesma qualidade de sempre - da obra do grande Noel Rosa.

 

O disco pode ser ouvido no YouTube - https://www.youtube.com/watch?v=7hQgItYiZmc&t=35s - e também adquirido por aí, nos bons sites do ramo. 

quinta-feira, 5 de maio de 2022

A foto, o feto

 Por Ronaldo Faria

"Morrer é foda. Viver é difícil!"

(Renato Russo)

 

Um homem mais feliz que a felicidade. Um garoto a brincar de bola entre uma foto e um instantâneo piscar de olhos. Um menino contra o outro. Ambos afoitos, fetos do futuro que não cabe a nós traduzir, ver ou medir. E quantos abraços não terão acontecido nesta disputa louca e irreal, marcada em fotograma e química, unindo vidas que se foram e se fundiram em risos e rezas pelo dia de amanhã. Coisa de paixão e sonho de vazio real, feito a última gota que cai no copo translúcido como o riso da infância sem saber o que será a vida para frente: se vai acabar de repente ou vai seguir em rompantes do haver. É, será ou há de ser?

Um homem mais feliz que a saudade. Um menino a driblar cárceres e sinas de fugas e fétidas celas encravadas no simulacro de eras para milhares de feras. E quantas brincadeiras não terão se refeito de unir e vaticinar dias melhores, cheios de torcidas e cismas ensimesmadas de um toque a mais, um drible refeito, um gozo fértil de olhar para o céu, ver o sol e dizer: este momento, finito, não há de morrer.

Coisa de criança, anciã na saudade que arde e infantil no simulacro que existe entre o estar feliz e ser triste. Ou, senão, simplesmente, ser. A ilusão vai vencer o que há de limite entre o céu e a terra. E o gol sairá e a volúpia da embriagada jogada em verdade far-se-á. Ela sempre há de se fazer e verter. Até a derradeira dividida do que é e daquilo que não foi. Até o último tocar em um passado que voltou.

A água que cai tosca molha a terra e espera o líquido da eternidade. E se a chuva é fria, molhada e louca é dela que a vida a vida trará a perfídia. Tratante ou tátil, insone ou louca.

Ps.: Acabaram dúzias de cerveja. A verve ainda há de se comprar do arremate entre o que se vê agora e aquilo que se quer que o outro veja no porvir do virá!

quarta-feira, 4 de maio de 2022

Toda a ternura de Al Jarreau

Por Edmilson Siqueira 

Quando eu espeto o pendrive no carro, a primeira música que aparece é "Mas que Nada", o grande sucesso mundial de Jorge Ben Jor. Só que o arranjo é diferente, começa com um bom batuque de samba, evolui para uns metais e entra um coro com a introdução famosa para, logo em seguida, surgir um cantor norte-americano cantando em português, num honesto esforço de dizer as palavras como elas soam pra nós.  


Pois esse cantor é ninguém menos que Al Jarreau, que nos deixou em fevereiro de 2017, às vésperas de completar 77 anos. Só para situar o leitor no tamanho de Al Jarreau, ele foi o único cantor a ganhar três Grammys em três categorias vocais diferentes. Suas qualidades de transformar qualquer música em algo diferente e, muitas vezes, melhor, talvez seja única.  


O disco que abre com o nosso Jorge Ben Jor, cuja música talvez tenha sido a mais "respeitada" em sua forma original de todas as outras onze, se chama "Tenderness", referência à segunda música, "Try a Little Tenderness", outro sucesso mundial. Foi gravado em 1993, onze músicas em Los Angeles e uma em Nova York.  

O disco todo, aliás, é feito de clássicos de alguns gêneros, como diz o texto da contracapa. Al decidiu, depois de ganhar os três Grammys em categorias vocais diferentes - R&B, pop e jazz, fazer um disco recheado dessas três categorias. 

"Mas que Nada", não se encaixa em nenhuma delas, mas tudo bem, ficou ótima a versão.  


Depois de cantar Try a Little Tenderness, numa interpretação de tirar o fôlego, é a vez do pop ser representado pelo primeiro sucesso de Elton John, "Your Song", no qual Al Jarreau passeia com toda a categoria que sua voz lhe representa.  


O jazz vem em seguida, num clássico que, se não era jazz na sua origem, vários grandes instrumentistas puxaram "My Favorite Things" para o gênero. Aqui, a música é apresentada na companhia da soprano lírica Kathleen Battle, o que dá mais brilho ainda ao trabalho. 


Como o disco é recheado de clássicos de três gêneros, os Beatles não poderiam ficar de fora. Do vasto repertório da banda, Al Jarreau pescou uma pérola de Paul McCartney - "She's Leaving Home". à já melodiosa música, Jarreau empresta todo seu talento vocal e perpetra novo arranjo, tornando tudo mais tenso e, difícil missão, nada fica a dever à gravação original. Eu diria que ficou até melhor.  


Outra que não poderia faltar é "Summertime", uma das músicas mais regravadas do mundo e, por isso mesmo, difícil de nela colocar novos elementos que diferenciem de tudo que já foi feito em torno da melodia do espetáculo "Porgy and Bess". Mas Jarreau, talvez influenciado pelo "Mas que Nada" de Jorge Ben, tasca um acentuado ritmo de samba, o que lhe proporciona vários malabarismos vocais. E, claro, ficou ótimo.  


O lado compositor de Al Jarreau aparece em três faixas: "We Got By", "You Don't See Me" e "Dinosaur", essa última em parceria com Marcus Miller e Robby Scharf. As três são ótimas. 

Pra encerrar, "Wait for the Magic" e "Go Away Little Girl" completam esse disco que eu recomendo a quem quer ouvir música muito boa. 


O CD está à venda nos bons sites do ramo e pode ser ouvido na íntegra no YouTube em https://www.youtube.com/watch?v=tCbwd7tcm6g&list=PL7gp579CMkT8kvW9agRTRRO3BeBEIOtml . 

Saudade ao som de baião

 Por Ronaldo Faria Saudade, essa maldade intrínseca e seca que devora a gente em cada pedaço de ser. Que não devolve a vida que nos faz fa...