quinta-feira, 21 de julho de 2022

Um trio brasileiro e universal

Por Edmilson Siqueira 

“Produzir, sem medo de ousar, a boa música instrumental brasileira”. Assim o Aquarela Sonora encara seu trabalho. Com piano, bateria e contrabaixo, o trio tem uma formação clássica que nos remete, logo de cara, a um trio de jazz ou aos trios que desvendaram inúmeros caminhos da moderna MPB nos fins dos anos 50 e início dos 60 no bojo da bossa-nova. E a relação com o jazz e a bossa-nova, influência mesmo dessas manifestações gêmeas, são visíveis em todo o CD "Estação Suburbana", que o trio lançou em 2003 e que vai continuar sempre atual. Ike Siqueira (não é parente meu, infelizmente) é o baterista do conjunto, Paulo Miotta (piano) e Paulo Signori (baixo acústico) completam essa turminha que nos brinda com um disco prenhe de excelentes composições. O trio é daqui de Campinas, onde vivo, mas poderia ser do Rio, de São Paulo ou de Nova York.   


Com exceção de "Caminho de Minas", escrita pelo produtor do CD, Marco Ferrari, todas as outras 12 músicas são de Paulo Miotta, que já pode ser considerado uma das mais gratas revelações da música instrumental brasileira dos últimos tempos.  

O CD é suave e forte ao mesmo tempo, equilibrando muito bem a brasilidade das composições com elementos que a internacionalizam. Remete, em alguns momentos, a Egberto Gismonti e suas aventuras ao piano; outras ao lendário Zimbo Trio, que encantou toda uma geração. Mas, qualquer que seja a lembrança, a música do trio tem uma criatividade difícil de se encontrar por aí. 


Um dos aspectos mais interessantes do trabalho é que, a partir de uma formação tradicional, o Aquarela consegue buscar caminhos que dão a ele uma aparência moderna, mercê as excelentes performances de Paulo Miotta ao piano. Bateria e contrabaixo aparecem na medida exata da contribuição que podem dar à música, sem exageros ou exibicionismos, coerentes com a proposta de fazer música pelo prazer e pela beleza, sem abrir mão da ousadia. No caso, ousar é saber. 

É saber, por exemplo, que a riqueza da música brasileira reside na simplicidade dos temas que a sensibilidade pesca por aí, que a miscigenação ocorrida por aqui, com os elementos africano e índio se misturando ao europeu, resultou num povo de extrema musicalidade. E que essa musicalidade atravessa fronteiras derrubando barreiras pelo mundo afora e colocando o músico brasileiro numa posição de destaque em qualquer país. 


O CD do Aquarela Sonora é um trabalho que pode ser classificado de excepcional, mas que, infelizmente, pouco toca nas rádios brasileiras. Se encontrar o CD por aí, não titubeie: você estará comprando 47 minutos e 49 segundos da melhor música instrumental brasileira.  


Ainda há alguns exemplares do Estação Suburbana por aí, nos bons sites do ramo. E ele pode ser ouvido na íntegra no Spotfy em https://open.spotify.com/album/0fSDslNADuHqpbPcGP0dGQ . 

Zé Geraldo

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