terça-feira, 23 de maio de 2023

Término com Francis Hime

 Por Ronaldo Faria



O derradeiro e último gole. O que ele nos traz? Onde começa, lá no início, e termina como líquido numa terrina? O que desfaz, apraz, liquefaz? Não sabemos. E isso é que faz dele o melhor, o primórdio do passado, o futuro ineficaz, o presente da gente. Quem sabe, ávido de se descobrir, não seja um descortinar do nosso mais fiel interior, aquele que se esconde no recôndito que só serve pra culpar nosso viver num morrer que chegará logo mais. Onde nada seremos, viveremos num inexistir de unguentos, teclas digitadas em lamentos. Quiçá, nos queixaremos ao tempo ser tão rápido e fugaz. E fugiremos de nós, brincaremos de alguma coisa qualquer, frigiremos ovos numa panela suja e na fé, quem sabe até. Afinal, o final não cabe a nós, entre óbitos e algum algoz.
 
II
 
Ele subiu o morro como quem desce para um asfalto que inexiste. Presto, pôs os olhos a ver o tempo que se foi. Disse oi àquele que sobe, prestimoso lembrou tempos de Borel. Ou, pensando agora: “Quando a coisa é muito boa, falta a coragem de lutar”. Mas ele lutou, brigou no trem, no ônibus, na desvariada andada sob o sol inclemente de uma zona norte, torta ou prestes à própria sorte. Na atmosfera linear, a Lua Cris cruza o céu iluminada e feito parecida a maçã. Mas ele continuou a subir o morro íngreme e disforme, como fosse a forma mais certa de ser. Mas o que será o cercear de uma flor? Ficará morta sem saber brotar ou far-se-á rosa para o mais fortuito amor? Roubada de um quintal em ser. Nas cordas do violão, certamente brincará de essência e ciência para o poeta arquitetar seu dissabor. Senão será somente semente a florir num canto qualquer do ser sem lamento. E assim provar que o amor sempre saberá vencer.
 
III
 
Saber colocar o último líquido que sai e se esvai num copo sem deixar cair é coisa de prática de anos e vidas de fragmentos perdidos e inusitados, fardos de histórias histriônicas ou patéticas, verves de fragmentos que lotam a mente da gente como fossem passagens a se liquefazerem em espumas e cores amarelas, fátuas certezas de que o momento é agora, mesmo que em ágoras alguns gritem feito loucos iguais àquilo que somos. Zumbis e soníferos mendicantes de algo que nos faça senhores de si, ao menos nos pesadelos que chegam entre o negror e o alvorecer, vamos a brincar de ser. A vida, solerte, rápida, única e saber-se-á que dará frutos que nem Maria-sem-vergonha dá. E assim continuaremos, uníssonos, senhores de si, ensimesmados, fugazes, bêbados e trêbados, iremos em dias e diásporas a viver o que nos resta a repetir entre um alvorecer e um luar. Certamente, em algum lugar, viveremos nosso sonho imaginário no torpor.

Zé Geraldo

 Por Ronaldo Faria A viola viola o sonho do sonhador como se fosse certo invadir os dias da dádiva que devia alegria para a orgia primeira...