sábado, 14 de maio de 2022

Quincy Jones e os primórdios da bossa nova

 Por Edmilson Siqueira 

"A adaptação da bossa nova a uma grande banda de jazz era obviamente a tarefa de Quincy Jones." 


Assim começa um texto escrito por Gene Lees para o disco "Quincy Jones Bossa Nova Big Band". Só que a "tarefa" de Quincy Jones, em 1962, ano de lançamento do disco, não foi tão fácil. Disse ele sobre a tarefa:  "O maior problema foi orquestrar o ritmo, para que fosse compatível com a música que se desenrolava sobre ele." 


Essa dificuldade de Quincy é uma das razões pelas quais a bossa nova estourou nos Estados Unidos. O norte-americano, acostumado a um ritmo mais "certinho" de suas baladas, rocks e do próprio jazz, não conseguia entender direito como uma batida "atravessada" se casava tão perfeitamente à música que se ouvia. Claro que a excelência das melodias ajudou bastante, mas a batida, aquela que João Gilberto transferiu do tamborim maneiro para as cordas do violão, intrigou e conquistou o público norte-americano. Prova disso tudo é que na famosa noite do Carneggie Hall, nesse mesmo ano de 1962, muitos jazzistas famosos estavam na plateia, para entender "ao vivo" o que era aquela música com uma batida diferente que já os havia conquistado. 


O disco que Quincy Jones produziu e que chamou de "bossa nova" é um ótimo exemplo de que, em 1962, os músicos americanos ainda estavam tentando entender a nova música brasileira. Tanto que adaptá-la para uma grande orquestra acaba sendo tarefa ingrata. A bossa nova, com sua economia de instrumentos, seu cantar intimista e seu balanço contido, não se sente à vontade numa orquestra cheia de metais e com uma sessão rítmica acentuada. Assim, o disco acaba se parecendo mais com um disco de samba ao qual foram inseridos alguns temas da bossa nova.  


Mas não se trata de um disco ruim, longe disso. Quincy Jones já era, em 1962, um grande produtor e tinha grandes músicos na sua orquestra. Ele próprio escreveu o tema que abre o disco, "Soul Bossa Nova", uma música que até hoje é tocada em rádios da Europa. 


Mas nos primórdios da bossa nova nos Estados Unidos, ainda havia uma confusão geral sobre ela, tanto que o texto de Gene Lees afirma num dos seus parágrafos: "Bossa Nova - que significa 'nova onda', 'nova voz' ou 'nova coisa', representa uma revolução contra o tradicional samba. Ritmicamente, é muito mais sutil e fluída que o samba, mas não menos agitada. E tem uma sensação que pode ser melhor descrita como movimento controlado. Embora permaneça ritmicamente estável, como o jazz, tem uma sensação constante de propulsão para a frente. É tocada, para usar a frase de um músico, muito em cima da batida." 


Como se vê, havia um esforço para o entendimento da bossa nova, colocando-a inclusive como um movimento contra o samba, quando na verdade, o que a moçada da zona sul carioca estava fazendo era apenas "um sambinha", sem movimento algum contra o samba tradicional.  

Quincy Jones fez um disco que representa o modo como se concebia a bossa nova que ainda engatinhava pelas terras do Tio Sam. Fosse feito dez anos depois, tenho certeza que ele já teria aprendido as lições de Jobim no disco de Frank Sinatra e faria algo completamente diferente, já que talento jamais lhe faltou. 

Mas, apesar dos senões em relação à bossa nova, trata-se de um disco gostoso de ouvir. Basta não dar muita atenção para os arroubos dos metais ou para as sessões rítmicas um tanto exageradas para a bossa nova ou quando elas parecem mais acompanhar um bolero que um "sambinha". 

Zé Geraldo

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