terça-feira, 9 de janeiro de 2024

No Reino do Quebra-Mar

 Por Ronaldo Faria

 

Pisadas frias e rápidas no corredor que está repleto de pó e penduricalhos mil. Afrânio, conhecido como “O Sofredor I”, rei da terra inexistente de um dia por vir, caminhava em ávidas saudades e falácias fálicas e frágeis. Era o soberano tirano e o aldeão que vagava pela estrada na busca de um lugar para cair e ficar. O som dos seus passos era como percalços de uma história sem canção. No anoitecer que o céu deixava tecer, um tecido de nuvens escondia o desmazelo. Sem zelo, na inexatidão do tempo vivido, ia Afrânio afanar segundos para poder viver. E ver, sobreviver, rever, num reverso que só o verso maldito dá e sente. Com sangue e cheio de trovas e trotes a sim apenas.
Em trôpegas e infindas vazias letargias, ia o homem fatigado pelo tempo na busca de um lugar além do quebra-mar. Sem portos de onde sair ou voltar, navega entre sereias, monstros mil e loucuras de um ser senil. Entre um barco e outro perdido, com náufragos a nadarem sem rumo ou prumo, ia o almirante Afrânio. Conhecido como o “Grumete da Vida”, navegava de oceano em oceano a passar por tormentas e maremotos, corpos mortos e jogados ao mar que desemboca em nenhum lugar. No caminho dos afluentes que só os doentes de paixão sabem onde ficar, o homem balançava de embriaguez e, sem sensatez, beijava a tez que, em perfídia, aparecia no espelho da vitrine apagada.
Nas vertiginosas hostes que saber-se-á de onde surgem, corre e surge a tropa que seguirá aquele conhecido como o “Capitão sem Aptidão”. Na inexatidão da contemporaneidade, ele transitava entre loucos e bêbados, mulheres nuas e adventistas tristes. Perseguia um fugitivo que, sem saber, era ele mesmo. Com seus soldados maltrapilhos e famintos, famigerados famélicos de emoção, ia a ouvir um sambista que perdeu a mocidade, a sorrir. “Capitão, por favor, a tropa precisa descansar!” – gritou o sargento à base de unguentos. Desmemoriado, o homem, por fim, grita: “Paremos e sintamos o cheiro de jasmim!” Como peças de dominó, os comandados caem um por um, a sorrir.


Zé Geraldo

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