segunda-feira, 9 de outubro de 2023

Viola e insônia crua e encruada

Por Ronaldo Faria


Na viola do violeiro, o esgueiro de um som que foge entre os ouvidos e olvida ser maior do que é. Na insônia crua e encruada na madrugada que é tragada pelas horas, a histriônica história inglória de Jesus Aldo, filho de Maria e José. Ou terá sido de José e Maria? Saber-se-á...

Carregador num mercado de secos e molhados, vive molhado de suor do seu ir e voltar com quilos de sebos e restos fervidos. E segue em passos pequenos e cansados à espera do relógio de ponto bater no ponto em que possa ainda, nessa sina, mesmo quase morto, viver.

Aldo, aldeão da sua aldeia inexistente, vive como um ser premente, desses que espera tanto que o tempo não deixa sequer sobreviver. Logo joga em cova rasa, tão rasa que nem os pés cabem pra dentro e se largam feito erva daninha a brotar em qualquer lugar e se largar.

Mas nos dedos do violeiro, primeiro ser a dedilhar o som do silêncio sepulcral, Jesus Aldo se prende à sua cruz. Ao invés de pregos, pregoa aos ventos sua solidão inclemente. E mente a si mesmo de que seguir levará a algum lugar. No ar, fuligem de mata nova se põe a chegar.

Jesus, amado mestre, que sobrevive a toda a peste, cuide de Aldo, no seu descalabro. Deixe que ele, assoberbado, presenteie sua vida com a mesma chama que vem do candelabro. Num canto de sala, na insólita glória, certamente alguém cantará um perdido tema de amor.

Mas, na viola de um violeiro, o centeio da semente que se espraia no chão seco e carcomido de quem sabe que, em outra era, será como serpente a correr o trilho de terra onde o pó passeia a presentear quem, como Aldo, almeja ser apenas um Judas a moedas contar.

Zé Geraldo

 Por Ronaldo Faria A viola viola o sonho do sonhador como se fosse certo invadir os dias da dádiva que devia alegria para a orgia primeira...