segunda-feira, 25 de março de 2024

Família Caymmi

Por Ronaldo Faria

 


Cair em Caymmi é navegar nos mares da Bahia. É voltar aos revoltos tempos sem lumiar. É se banhar num istmo que se envolve de águas salgadas e doces e adocicar a tristeza feito ela fosse algo que nunca no corpo morou.
Se envolver em Caymmi é como entrar de novo no cinema onde o escuro esconde a mão que se põe sobre a mão da menina que o destino de loucos não deixará nunca juntar. É fazer dia onde a noite cobriu o sol da esperança.
Ouvir Caymmi é trazer o passado ao presente que se ressente de nunca ter visto o futuro que poderia ser. É reviver sem sequer viver. É dormir sem deitar na cama, é acordar num universo em que o verso é somente voltar a ter.
Catar Caymmi entre tantos milhares de CDs é correr o milharal antes do sabugo colher. É olhar a semente que um dia irá ser flor e secará esturricada na seca do fim. É tirar cheiro do alecrim. É comer com a mão a solidão do porvir.
Cantar canções de ninar de Caymmi é balançar na rede que faz um vento quieto que se embaralha com o cheiro de lampião que o querosene traz. É ouvir o mugir do gado a chorar o bezerro desmamado no brilhante luar.
Beber ao som de Caymmi é cair num poço que está cheio de medos e sonhos que se misturam num vai e noutro vem. É correr os caminhos que se foram no desdém. É beijar bocas sedentas e secar nas sedes de outro alguém.
Morrer em Caymmi é amar a nostálgica estrada nunca trilhada, os amores que se deixaram sem fim, um enfim ensimesmado de perfídia e sim. É escrever no derradeiro e sincero esmero de sangrar em veias dos meros confins.
Escrever em Caymmi é saber ser de Humanas e até hoje não conseguir fazer conta. Os contos e poemas tomaram o pouco espaço no cérebro que restou. Enfim, ser Caymmi é acreditar que um dia o nosso dia ensolarado virá.


Zé Geraldo

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