terça-feira, 16 de abril de 2024

Iluminado Dominguinhos

 Por Ronaldo Faria


A retreta à treta que rola entre amores e discórdia toca corações nas vozes que fazem da prosódia algo e nada. Na concórdia de tudo o gesto mudo do infausto arguto que sonha com uma terra de verde onde a poeira marrom da seca passeia. Um sanfoneiro, n’algum lugar, irá tocar as teclas como fossem o som da brincadeira derradeira do amar. O mar, esse ser que o sertanejo nunca vê, vira prosopopeia de uma heroica história onde o histrionismo é algo sem ser. Ao ver, no reverso do verso menor, na estrada desbragada de sonoridade e veleidade, os amantes margeiam a apoteose que cada dose traz. Por detrás de tudo, ao mero descrer de ser, um pássaro passeia de galho em galho como fossem esses um atalho. No mormaço de dois corpos quentes pelo sol que decide se mandar para dormir e depois voltar a chegar, o beijo derradeiro da cena derradeira que o prelúdio, em dilúvio e eflúvios, traz. A paz.
Na casa de pau a pique e sapê, a mãe chora o filho, quase ainda feto, que se foi. Um caixãozinho pequeno e de madeira quase calcinada pela seca é o primeiro e derradeiro leito do menino que dorme num nunca acordar. No lampião que suplica por um pouco de querosene para queimar na sua sina que só quem viveu no passado sabe existir, um ou outro mosquito se joga para arder em chama escura e amarela, que qualquer avó de nome Amélia saberia ser homenagem de filho antes maltrapilho à sua matriarca sem ter tido sua fuzarca. No longínquo perto demais, o bezerro berra o brotar de um leite que derrama das tetas murchas da sua mãe. Sem entender, o boiadeiro grita para o gado se recolher. No fogão de lenha, que faz os galhos antes vivos gritam em crepitar a sua morte final, a senha da sanha da fome.
Na noite que chega e se achega devagar, uma estrela ou outra brilha de ser branca no negror que o torpor dos raios de sol que descasam e descansam num lado qualquer. No corpo nu da mulher, o mundo que tantas rotas deu às mãos que acariciavam a solidão se transmuta de cores e seus odores, sabores que só o universo de lábios sedentos de línguas e dentes dá. Talvez uma rede largada ao luar que viaje para o poema desejar. A pele lavada de pingos de prazer e suor. A maneira de quem sabe, em talagadas, que amanhã será um dia de dizer a si mesmo o desmazelo que as letras e as teclas agora dão. Na diáspora de cada segundo que sempre é passado há a incógnita de casas caiadas e caladas, metáforas que a vida faz em si mesma à eternidade que a saudade faz – invólucro de poemas que se formam em fonemas e letras mil. Quem sabe algo possa rimar, pela rima, com céu pueril e de cor anil...


Zé Geraldo

 Por Ronaldo Faria A viola viola o sonho do sonhador como se fosse certo invadir os dias da dádiva que devia alegria para a orgia primeira...