quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

Saudade I

 Por Ronaldo Faria


João Nogueira. Paulo César Pinheiro. Rio de Janeiro. Mar. Areia. Cheiro de maré. Fé. Madrugada. A fada. A primeira foda. Vinicius de Moraes. Tom Jobim. Arlequim. Carnaval sem fim. Fiasco. Subúrbio. Zona Sul. “Ah, senão fosse o violão...” Cruzada. O pacau. A iugoslava alemã. A vala no meio da rua. O batuque com a morte do lado. O afago. A fresta. A festa. Os fogos. Ano novo. Um povo. Um samba. A sorte. A poesia. A azia. Um cigarro ou outro. Uma orgia. A mata da PUC. A urbe. Os olhos vermelhos de maconha. A professora bisonha. A baiana cheia de trama. Artigo dez. Vinicius de Moraes visto ao vivo no palco e no álcool. Candelária. Praça 11. Lagoa. Leblon. Um tom. “Meu Deus, vou me enterrar perto do Tom!” Prenúncio, anúncio de saudades demais. Prepúcio puxado à força. A forca. A farsa. A frase. O foco. O filme do cinema tijucano. O cano. O caso. Ocaso. Torquato Neto. O feto. O versículo dito pelo capuchinho. A avenida contínua. O ônibus. O menino e seus botões. Cada um com seu nome. A jogada. Linha de fundo. O mundo. Com uma sina. E tem a menina. Morena. Sirena. Lábios carnudos. Cabelos negros e longos. Tevê. Te vi e não te conquistei. Brinquedos de plena ausência. A Ciência. O foco. Vertigem de se saber finito. O minúsculo ósculo. A prostituta a jogar o travesseiro. O banho (que é de Copacabana, mas não é do mar). A cachoeira. A janela para a morte. A sorte. O sorteio. O sortilégio de ser do Brasil. Inenarrável. Frágil. Ágil. O estar sempre longe. A aorta. A sorte. A perda. O roubo. A poesia. A fazenda. A renda. O cheiro. O enterro. Alamedas. Medos e mídias. A escolha. A trolha. A troça. A telha de Araraquara. A vara. Um dia inteiro de trepação. A ação. O sim e o som. O sino. O desatino. A espera. A pedra. Sempre há uma pedra no meio do caminho. A poesia mandada para o poeta. O silêncio. Talvez Drummond não tenha um asceta. Vestibular. O lar. O professor que dá o caminho. O aninho. Aninha. Ah, como era linda a Aninha... O tempo de faculdade. Barra da Tijuca. Farol da Barra. Porres. Luta contra a ditadura. Passeatas. Gente que não sabia viver sem militares. O fonema. O papel. O cordel. O fel. A vertigem. O primeiro porre. O primeiro e o derradeiro cantar. “Que falta que você faz, João Nogueira!” Um cá estou eu, sem eira e nem beira. A se embriagar. O epitáfio. O Estácio. Viver e ócio. A saber-se finito. Tito. Flamenguista. Artista. Diretor da peça de Luiz Eça. Nelson Rodrigues, quem dera. Estou pelo mundo, à Vera. Inverossímil. Eterna criança. Sem andança. Rio de Janeiro. Aplausos solitários na noite. “Meu medo maior é o espelho se quebrar”. Ter ou não ter? Lanche frio de atum do Bob’s. Cinema suburbano. O pano. A pane. A palavra equânime. A paixão. A perda. A pérgula. A antítese. A tese. A teoria. Ágora. Paulo César Pinheiro pedindo para a madrugada entrar. Entra. Nem precisa pedir. O corpo. A cópula. A hóstia. A promessa. Mas, como um ateu pode prometer? O meter. Miscigenação. Ação. O imbróglio. A favela. A vela. Torquato Neto. O feto. O frio. Som de tiro. Miro a paixão na mulher. Os olhos escuros. O furo. A fera. Lembranças sobre a Terra. Miséria. Férias. Fatos e frívolas eras. Paixões. Soluções. Tesões. Imaginações em sonhos bisonhos. Realidade. Cidade. Esta ainda arde. Copos de uísque. Brindes à solidão. Como Eva e Adão. Um paraíso no caminho e a maçã em prejuízo. O juízo. A morte da filha amada. Nina. Falta a serpente. Há um ausente que sente. Lamenta e mente. Para si e para a outra. Há a louca. Afoita e solta. Há a solicitude. A aflição. A atitude. A amplitude do amor. A flor e a dor. Dóceis feito enigma sem praguejos e torpor. Há, por fim, uma cidade a se espraiar e planar. Um Vinicius de Moraes, de novo, meu poeta e senhor. Há a flor que nunca dei. Mater Dei. Há um forno aberto. Quem sabe a traição do poeta. Se tudo é um só segundo, porque não fazermos neste momento, entre espelhos, o nosso mundo? Há a Lapa. O baixo meretrício. O poema fictício. O bêbado a morrer de cirrose. O ócio. O impróprio e dócil escriba. O câncer maldito. Chega! Te quero! E que se fodam as regras e rezas: quero ser modernista, antropofágico e repleto de erros. Quero ser. Poeta e homem, à busca da fêmea perdida, suicida e fugaz. Como no jogo de pôquer, um az. Escrito imenso que ninguém vai ler. Sem parágrafo. Ágrafo. Meticuloso e mentiroso. Como quem já perdeu amores e mulheres. Chega! Meu enterro só eu vou seguir. Garoto em cobertas de taco a sobreviver ao fim. Como teatro de bailarina e arlequim. Eu e você, mulher de cetim. Cinzas misturadas e caladas, queimadas e moídas, humanas e caninas.

Que merda: redescobri o uísque. Mas ele não dura nem uma semana, quiçá três dias. Haja bolso para este novo Carnaval...


Zé Geraldo

 Por Ronaldo Faria A viola viola o sonho do sonhador como se fosse certo invadir os dias da dádiva que devia alegria para a orgia primeira...