sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

Obrigado, Yo-Yo Ma

Por Edmilson Siqueira

De pais chineses, Yo-Yo Ma nasceu em Paris. O pai era maestro e compositor e a mãe cantora. Estudou violino, viola e quando foi para o violoncelo não largou mais. Esse amor pelo instrumento aconteceu aos quatro anos de idade. Aos seis, o primeiro concerto, ao lado do pai. Em seguida, a família se muda para Nova York e aos oito aparece na televisão americana num concerto produzido por ninguém menos que Leonard Bernstein. 

Yo-Yo entrou para a Juilliard School (na qual tinha aulas com Leonard Rose), e passou um semestre estudando na Universidade de Columbia, antes de se matricular na Universidade de Harvard. Nessa idade, pouco mais de 15 anos, ele começou a se questionar se valeria a pena continuar a estudar até que, nos anos 70, o estilo do genial Pablo Casals o inspirou. Aí ele retorna à França para tocar com a Orquestra Nacional da França e com a Orquestra de Paris, sob a direção de Myung-Whun Chung. 

A carreira começa a ficar mais que sólida, pois desde a infância e adolescência, Yo-Yo possuía uma fama bastante estável e havia tocado com algumas das melhores orquestras do mundo. Suas gravações e interpretações das suítes para violoncelo solo de Johann Sebastian Bach são particularmente aclamadas.

Pois bem, esse prodígio que tem encantado o mundo com seu violoncelo, aos 47 anos (hoje ele em 55) reuniu um ótimo time de compositores, cantores e instrumentistas brasileiros para fazer um disco só com a tal de MPB. 

O disco, que poderia se chamar "Obrigado, Yo-Yo Ma" por levar a fina música brasileira mais longe ainda, tem no nome uma situação inversa. É Yo-Yo quem agradece ao Brasil pela excelência de sua música. Um dos textos do encarte diz: "Esta gravação é um tributo de todos eles [Yo-Yo e os artistas], para a rica cultura brasileira que produziu essa única, maravilhosa e variada tradição musical através dos anos".

O time é mesmo dos melhores e produziu um fantástico trabalho tanto instrumental quanto vocal, com escolha de um repertório dos mais sérios e ecléticos. Cesar Camargo Mariano, Rosa Passos, Cyro Baptista, Hélio Alves, Paulo Braga, Sergio e Odair Assad (o Duo Assad), Oscar Castro-Neves, Egberto Gismonti e Romero Lubambo são os brasileiros que participam do disco. A eles se juntaram Paquito d'Rivera e Katrym Stott para mostrar ao mundo uma pequena e preciosa parte do melhor produto de exportação que o Brasil produz: a nossa música. E que atrai gente com o talento de Yo-Yo Ma para registrá-la para a eternidade, dando-lhe novas nuances que acabam por encantar a todos.

O repertório, como disse, é dos mais ecléticos, quase todo instrumental, como Cristal (Cesar Camargo Mariano) que abre o disco. Apenas duas músicas são cantadas, ambas de Jobim e Vinicius e ambas por Rosa Passos: o clássico Chega de Saudade e O Amor em Paz. 

Mas há muito mais. A Lenda do Caboclo de Heitor Villa-Lobos com o Duo Assad; Doce de Coco (Jacó do Bandolim) com Paquito D'Rivera e Romero Lubambo. Dansa Brasileira e Dansa Negra, de Camargo Guarnieri, com o piano de Katryn Stott. Apelo (Baden Powell e Vinicius). O famoso 1 a Zero, choro de Pixinguinha, com Paquito, Romero e Cyro. A sensível Menino, de Sergio Assad. 

Um sucesso instrumental de Cesar Camargo Mariano também está presente. É Samambaia, do disco do mesmo nome. A música seguinte é nada menos que Carinhoso, de Pixinguinha. Alma Brasileira, de Villa-Lobos, Bodas de Prata e Quatro Cantos, ambas de Egberto Gismonti se unem numa só faixa, com o próprio Egberto ao piano. 

O disco iria terminar com um apoteótico Brasileirinho, de Valdir Azevedo, onde a clarineta e o violoncelo de Paquito e Yo-Yo se complementam fantasticamente. Mas há uma faixa bônus, Salvador (Egberto Gismonti) onde os dois praticam algumas peripécias encerrando o disco com um som futurista que se mistura a um longo e triste solo de cello.

Ouvir todos esses clássicos da MPB convertidos para os pungentes sons do violoncelo de um grande artista, além do prazer imensurável que dá, é prova cabal da riqueza da nossa música. 

Num longo texto de Philip Huscher no encarte do disco, está escrito: "O Brasil, vislumbrado nos instantâneos musicais desta gravação, é uma terra definida pelo seu ecletismo, pois em nenhum outro lugar do mundo os sons da África, da Europa e da América se unem para fazer uma música tão distinta e atemporal." 

Além de concordar totalmente com Huscher, deixo aqui meu agradecimento não só a Yo-Yo Ma pelo grande trabalho, mas a todos que se uniram para produzirem essa espécie de tesouro musical, onde a MPB se mostra em todas as suas belas faces.

O disco Obrigado, Brazil está disponível no Youtube    https://www.youtube.com/watch?v=4NdNgh0z8JA além do Spotify, Amazon Music e Deezer.

Zé Geraldo

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