segunda-feira, 7 de março de 2022

Um disco chamado Brazil

Por Edmilson Siqueira 

Sabe daqueles discos que você pega na estante da loja e sente um certo orgulho de ser brasileiro? Eu sei que sentir esse orgulho está meio difícil, já que o país só derrapa onde deveria andar seguro e pra frente, mas tem hora que a gente estufa o peito e dá aquele sorrisinho de superioridade que tanta falta nos faz.  


Pois foi o que senti quando, acho que na saudosa Hully Gully Discos, ali na Doutor Quirino, no Centro de Campinas, peguei um CD importado tendo na capa um cartão da baía da Guanabara com o nome dos dois artistas: Rosemary Clooney e, um pouco menor, John Pizzarelli. Dois grandes do jazz num disco chamado Brazil. 


Comprei na hora e em casa a expectativa se confirmou. Um disco com grande produção e só com música brasileira, cantada em inglês.  


A própria Rosemary escreve no encarte: "Numa manhã de verão de 1968, eu olhei pela janela do hotel e vi montanhas e o mar banhado numa luz de lavanda que eu nunca havia visto antes. O sentimento que eu tive naquela manhã só voltou de novo quando eu ouvi músicas do Brasil." E, em seguida, ela dedica o disco a Antonio Carlos Jobim, Frank Sinatra e Nelson Riddle, acrescentando John Pizzarelli, Diana Krall (que participa do disco numa das faixas), Oscar Castro Neves e Paulinho da Costa. 


Apaixonada pela boa música brasileira, essa cantora de dezenas e dezenas de LPs e CDs gravados, de 1952 até pouco antes de morrer em 2002, não fez por menos. Chamou John Pizzarelli para acompanhá-la com seu violão e voz em algumas faixas e também Diana Krall para fazer dueto com ela em Garota de Ipanema. 


Logo de cara, Aquarela do Brasil, de Ari Barroso, que nos EUA se chama apenas Brazil, na letra em inglês de Sidney Russel, cantada suavemente, num arranjo leve e delicioso. 


Corcovado (Jobim e Vinicius) que em inglês virou Quiet Nights, tem Paulinho da Costa na percussão, o que não deixa o ritmo brasileiro se perder. 


Garota de Ipanema, cantada por Rosemary e Diana Krall virou The Boy From Ipanema, mas não perdeu o balanço nem a sensualidade que Jobim e Vinicius propuseram. 


Wave (Jobim) é a primeira música em que Pizzarelli canta sozinho e não deixa a peteca cair. 


Amor em Paz (Jobim e Vinicius) que virou Once I Loved na letra em inglês de Ray Gilbert, tem belo solo instrumental de Chouncey Welsch no trombone. 


Desafinado, a próxima faixa, é a única do disco que soa meio estranha, talvez pela ausência de um percussionista brasileiro. Curiosamente, o encarte credita a música apenas a Newton Mendonça, deixando de lado o outro autor, Tom Jobim. Além disso, o nome em inglês (Out of Key) também não aparece.  


I Concentrate On You, de Cole Porte é a única música de um autor não brasileiro do disco, mas a presença de Oscar Castro Neves no violão e nos vocais e de Paulinho da Costa na percussão, tornam a música uma bossa nova quase genuína.  


O disco segue mantendo a linha mais que brasileira com Samba de Uma Nota Só (Jobim e  Newton Mendonça, creditada erroneamente a Vinicius no lugar de Newton); How Insensitive (Insensatez de Jobim e Vinicius), Let Go (a versão em inglês feita por Norman Gimbel de Canto de Ossanha, de Baden e Vinicius);  Dindi, o sucesso mundial de Aloysio de Oliveira e Jobim, com letra em inglês de Ray Gilbert) cantada - e muito bem - por John Pizzarelli; Águas de Março (Jobim) num belo dueto de Rosemary e Pizzarelli; Meditação (Jobim e Newton Mendonça); Sweet Happy Life (Samba de Orpheu, de Luiz Bonfá, Antonio Maria e André Salvet); A Day in the Life of a Fool que não é outra senão Manhã de Carnaval (Luiz Bonfá, Antonio Maria) na letra em inglês de Carl Sigman.    

E, pra encerrar, e pra não deixar dúvida algum de que se trata de uma grande homenagem à música brasileira, a Aquarela do Brasil de Ari Barroso é repetida, numa versão bem menor, fechando o disco. 


O CD é importado (não sei se foi editado no Brasil) e está à venda ainda em sites como Mercado Livre e Amazon. Muitas de suas faixas podem ser ouvidas no YouTube. 

Zé Geraldo

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