quinta-feira, 19 de outubro de 2023

Acorda Maria Bonita

Por Ronaldo Faria


Maria Bonita acorda desesperada. Talvez soubesse que uma bala irá lhe dar bom dia. Não haverá mais choro, trilhas com plantas carcomidas e secas do sertão, nem mesmo um cantão na grota de Angico. Nada sobrará. Nem calangos, cangaceiros ou macacos. Talvez, no futuro, um augúrio. Quem viver, verá.

 

Nas vertentes das veredas que se embrenham na lua que se esconde no céu, trabucos soltam o som da morte e descobrem no sangue derramado a trama que nenhuma viola saberá tocar. Depois da matança, cabeças expostas ao vento, os homens e mulheres, alhures, viram apenas festança e esperança de cordelistas pelo mundo. Sejam eles primogênitos ou geneticamente curtidos no sertão do passado, de lampiões de querosene e luares imensos ao som de um gado que vai parir e morrer, seguem no precipício que há entre o nascer e findar. Serão fotos, decapitados de seus corpos antes andantes e amantes, viverão em histórias mil. Serão cantados, declamados, difamados, afortunados por sobreviverem aos tempos que cada vez menos tempo nos dá. Como parte de um país senil e febril, semearão amores e ódios, ordinárias vertentes de sementes que, com certeza e presteza, brotarão. E caberá a cada um desdenhar ou regar o que disso puder sobreviver... Daqui, do mundo moderno, vejo, sem credo, que como diria o poeta, a mula pula. Ou seja, nada sei e sei que nada nunca saberei.

Zé Geraldo

 Por Ronaldo Faria A viola viola o sonho do sonhador como se fosse certo invadir os dias da dádiva que devia alegria para a orgia primeira...