segunda-feira, 18 de setembro de 2023

No samba (e na Farofa Carioca)

Por Ronaldo Faria


Gostosa além da conta. Era essa a referência que qualquer home, lúcido ou chapado, tinha para Verônica. Mesmo que estivesse afônica, a tônica dos homens era igual: “Como ela não há. Temos que tirar o chapéu para a dupla que a fez!” E o Seu Amâncio e a Dona Zuleika nem eram tudo isso. Dois comuns, desses que a gente corre os olhos toda a vez que entramos num trem de subúrbio ou numa rua qualquer. Mas ela, com certeza, era a mulher. Seu corpo não tinha um centímetro ou polegada fora do lugar. A boca era doe outro mundo. Aliás, se um ET tivesse outra igual, que o planeta seja invadido nessa hora. Os olhos brilhavam fora das íris. Eram com vida própria, na forma mais exótica que há. Enfim, Verônica era uma escultura ambulante de semblante que nenhum artista conseguiria reproduzir. E ela sabia o quanto valia à mente tardia do macho que a desejava possuir. Subia o morro como se flutuasse além das nuvens. E não dava crédito qualquer a nenhum mero mortal. Seu portal era bem mais acima do que o final.

Mas ela era bem mais do que gostosa, apetitosa ou qualquer sinônimo que o gênero dê. Afinal, os tempos são outros. O discurso é outro. Verônica, musa delirante de delírios ofegantes, não se prendia em estereótipos, olhares óticos, versos utópicos. Era uma deusa inclemente, dessas que cortam as vísceras dos loucos e dos que vivem noutra dimensão, em diáspora absoluta e frágil. Era muito mais do que vasos e músculos, úteros e peitos. Era algo afeito ao sonhar que o defeito das mentes não chega ao coração. Para ela, não há oração, procrastinação. Verônica é muito mais, aliás. Seu rebolado, atolado de trejeitos e defeitos, é muito melhor do que um bailado de cisne qualquer. Seu pensar, falar, sonhar, até a caligrafia, são muito mais além do que possamos pensar. No salão o samba rola. No teto, rolinhas põem ovos em proporção. A ação está prestes a acabar. Verônica entra em casa. Maldito sejam os tijolos que a escondem. Que um lobo qualquer de história infantil os derrubem. Longe de tudo, o poeta poetiza a mulher maior.

Zé Geraldo

 Por Ronaldo Faria A viola viola o sonho do sonhador como se fosse certo invadir os dias da dádiva que devia alegria para a orgia primeira...