quinta-feira, 28 de abril de 2022

O primeiro disco de Ricardo Matsuda

Por Edmilson Siqueira 

Ricardo Matsuda é hoje um artista reconhecido e muito respeitado no meio musical brasileiro. Se não é conhecido do grande público é porque seu talento o levou para um tipo de música que não frequenta rádio e televisão populares. Mas é bom, muito bom.

 

Violonista, compositor e arranjador, há passeou por alguns estilos, já gravou vários discos, já tocou outros instrumentos de corda, participou de vários grupos e sempre deixou a marca de sua personalidade musical. 


Já formou trios com gente do quilate de Pepe D’Elia (baterista) e Ronaldo Saggiorato (contrabaixo); já participou, por vários anos e com muitos prêmios, do Grupo Anima. O grupo ficou conhecido pelo trabalho original a partir da pesquisa de repertório da música antiga ibérica e da tradição oral brasileira. Entre 2001 e 2008, período em que participou do grupo, gravou dois discos, que renderam turnês por 18 estados brasileiros e concertos na Argentina, Bolívia, Canadá, Colômbia, Estados Unidos, México, Paraguai e Uruguai. 


Formou um duo com a cravista Patrícia Gatti e com ela gravou dois discos "Contos Instrumentais" e "O Cravo e a Rosa - Suítes Populares para Cravo e Violas Brasileiras", com uma inédita e bonita sonoridade obtida da união entre a viola caipira e o cravo. Ambos os discos foram muito bem recebidos pela crítica especializada. 


Só que quando gravou "Dança das Estações", o disco que vou sugerir hoje, Ricardo nem pensava nisso tudo. Foi antes de sua entrada no Anima que, no inverno de 2001, ele entrou no MM Estúdio para gravar 9 músicas de sua autoria e uma de Kosaku Iamada e Rofu Miki e outra de Mané Silveira. 


Para a empreitada estavam presentes duas cantoras - Isa Taube e Érika Sasazaki - e os músicos Mané Silveira (sax e flauta), Guilherme Ribeiro (acordeão) e Dalga Larrondo e Magrão (percussionistas). 


Ricardo Matsuda toca violão em todas as 11 faixas, algumas solitariamente. O que se ouve por todo o disco é uma música instrumental rica em detalhes, com duas delas soladas pelo sentido canto de Isa e Érika, e que guardam uma característica comum: são de alta qualidade. 


A voz de Isa passeia pelo Canto do Povo do Vale, primeira faixa, lentamente, e a todo momento se pensa em Milton Nascimento, tal a beleza da música e a sonoridade do solo vocal.  

Coqueiral, Akatombo, Invernal, Latina, Marcha da Praia, Outrora, Aleijadinho, Boya, Outono e O Pequeno Tigre, completam o disco, num verdadeiro show de música instrumental da maior qualidade.  

Infelizmente não encontrei cópia do CD no Youtube e nem à venda nos bons sites do ramo. Se alguém encontrar por aí pode comprar, que é muito bom. 

quarta-feira, 27 de abril de 2022

Charlie Brown Jr

 Por Ronaldo Faria

Noite, abismal abismo entre a realidade e o cismo. Cataclismo e sofismo. Ínfimo cântico no ir e vir. Versejos e tracejos entre o ir e vir.  Gracejos de quem ainda estar por se ouvir. Cansaço, asco, grasso querer. A morte está perto de viver. 


terça-feira, 26 de abril de 2022

Mojo Mamas, o grande blues de Chicago

Por Edmilson Siqueira 

Foi o Osny, na saudosa Hully Gully Discos da Dr. Quirino, no Centro de Campinas, quem me mostrou o CD. Logo de cara ele me disse: "Olha só que capa!" E realmente a capa é linda, como vocês podem ver mais abaixo. Trata-se de um quadro do artista plástico John Carrol Doyle. O nome do CD é o mesmo do quadro, Mojo Mamas e, embora a capa apontasse para um grupo tocando blues num local que leva a pensar ser um cabaré do sul dos Estados Unidos (na verdade a turma é de Chicago), eu confesso que nunca tinha ouvido falar das Mamas que aqui se apresentam. São todas da cena musical negra de Chicago e só essa informação já nos leva para uma música forte e vibrante, com detalhes jazzísticos, de rock, mas principalmente de blues que é a fonte onde todas beberam desde criancinha. 


Mojo é uma palavra do inglês que tem origem numa crença folclórica, mas com o tempo passou a significar uma qualidade que pessoas têm para atrair outras e que faz de você uma pessoa bem sucedida e cheia de energia.   

Linda Cain, no longo texto do encarte que acompanha o disco, destaca que "Mojo Mama é um personagem criado pelo artista para encarnar o espírito indomável da atemporal cantora de blues. As mulheres talentosas do Blues de Chicago definitivamente têm seus "mojos" trabalhando horas extras: basta ouvir uma vez e essas mulheres chorosas lançarão seu feitiço em você!" A maior parte do texto é para falar de cada uma das oito mulheres que cantam as 14 músicas do CD. Não são cantoras que estão em filmes ou em paradas de sucesso por aí. Na verdade, acho que no Brasil, poucos as conhecem. Mas nada disso quer dizer que lhes falta alguma qualidade no que se propõem a cantar. Muito pelo contrário: todas são ótimas.  


É o mais puro blues de Chicago. Alguns podem pensar que a cidade, por ficar no centro-norte dos Estados Unidos, à margens do Lago Michigan, não estaria geograficamente adequada para ser berço do blues, pois este nasceu no Sul, nas plantações das fazendas tocadas pelos escravos negros vindos da África. 


Mas, diz a história que o tal do "Chicago blues é uma forma de música que foi criada em Chicago com a adição de instrumentos elétricos, bateria, piano, baixo e algumas vezes saxofone ao estilo básico de cordas/gaita do Delta blues."  


E, para deixar claro que a origem é a mesma, o texto pinçado da Wikipédia, completa: "Este estilo desenvolveu-se principalmente como consequência da grande migração de trabalhadores negros pobres do sul dos Estados Unidos para as cidades ricas do norte, Chicago em particular, na primeira metade do século XX." 


Como se vê, o blues de Chicago tem berço e isso fica mais que provado nesse Mojo Mamas, gravado nos dias 6 e 7 de dezembro de 1999, no Riverside Studio em, naturalmente, Chicago.  

As cantoras que fazem uma verdadeira festa nas 14 faixas do disco são: Graná Louise, Shirley Johnson, Sarah Streeter, Zara Young, Gloria Shannon, Maggie Burrell, Mary Lane e Pat Scott. 


Quando o Osny botou pra rodar o disco na lendária lojinha da Dr. Quirino, eu percebi que iria comprá-lo para ouvir sempre em casa. E foi o que aconteceu. Hoje, as mamas do Chicago Blues comparecem nas caixas de som sempre que o ambiente requer uma recompensa musical para atenuar os tristes dias que vivemos, cheios de corrupção, ignorância e guerra.  

O CD que tenho é importado e acho que não há edição brasileira. Mas tem na Amazon americana à venda. Preste atenção se for comprar porque o preço é em dólar. 

segunda-feira, 25 de abril de 2022

À Júlia Vargas

 Por Ronaldo Faria

Brincadeiras de sons, onomatopeias de soluções e solidões. Lamentos vis e febris. À voz, o algoz. Vilarejos benfazejos e anjos arcados e praguejos. Sertanejos de marés e viés. À lucidez, mil barnabés. Ao que puder vir, que seja o que vier. Maracatus, sons de Nordeste, vida em presto e vazia de si mesma, à crisma nunca feita. Talvez um desejo de morte, à sorte ditada. Um beijo de língua, à mingua, a se esvair nas ondas pequenas que batem do lado da cama que dorme ao fado primeiro. Ao fastio que se denota em si, a foda redescoberta na madrugada insone que levanta sons e poeiras. Candeeiros que iluminam seu próprio destino de morrer ao fim do querosene. No limite entre a lucidez e o improvável, o calado e insone poeta se faz blasfêmia e essência. Na cadência do som, a essência de querer pouco virar. Entre o começo e o fim, há um pedaço de ar a se respirar...

sábado, 23 de abril de 2022

Ao Vander Lee

 Por Ronaldo Faria

Píncaros sem glória. Pouco ou nada da história. Histriônicas verdades em ilusórias inverdades. Vazios de um antes e outro depois. Aos déspotas, um pequeno e ateu amém. Aos carros e aviões, meras poesias ou canções. Quem sabe um pouco de paz. Um triscar de dedos no copo que quase cai. Senão, uma ladeira que sobe e desce no início e fim da viela. Talvez uma cabrocha a rodar para o amante brocha. Na brincadeira, passado não serve de passarela. No canto, um passista come pão com mortadela. 

Cataclismos ínfimos e fátuos. Falácias ágrafas e frágeis. Fatídicos istmos e rios a correrem, sem descobrir que logo à frente existe um mar. Na magia de chegar e catar, um incongruente a arfar. No tempo atrás, candeeiros que sopram de qualquer lugar. Um passo na areia quente que se desvanece e arrefece ao simplório ser não ou ser sim. Na capadócia, vestes travestidas de canção. No Méier, caminho para Ipanema, rompido de festas nunca encerradas para uma paixão, crivadas de antemão.

Vinhos cheios de taças e rolhas. Ruminantes bois e vacas a comerem sua própria orgia altaneira. Quiçá um bezerro a chorar a fome derradeira. Senão, o vaqueiro a correr conta o tempo para ver a si mesmo, a esmo. Talvez um caminhoneiro que percorre os caminhos sem fim do seu coração. Ao longe, a beata termina sua oração. Num canto pequeno, vazio de sonhos e orgasmos, românticos olham sob os vazios quânticos. Na inverídica verdade, urge a madrugada para que se faça, logo mais, outra tarde.

sexta-feira, 22 de abril de 2022

Chet Baker nas baladas

Por Edmilson Siqueira 

"Chet Baker acreditava em baladas". Assim começa o artigo no encarte de um disco do trompetista norte-americano, que surgiu como um sonho e acabou vivendo vários infernos em sua vida, cheia de belíssimos discos, grandes apresentações e um punhado de drogas. As baladas do título são músicas lentas, jazzísticas, normalmente de grande beleza, muito comuns no cancioneiro norte-americano.  


A morte de Chet, até hoje sem uma definição entre acidente, assassinado e suicídio, contrasta com a leveza de sua arte e com a beleza de seu rosto jovem. Mas, se a música que ele fazia nos enlevava, sua vida era da pesada, entre amores desfeitos e traficantes. Pena. Partiu aos 58 anos, entre uma apresentação e outra em Amsterdã.   


Ruy Castro, nosso maior biógrafo, na orelha da melhor biografia de Chet Baker, escrita por James Gavin, afirma que Chet Baker "...ao surgir no jazz dos anos 50, encarnou o ideal de sua geração: o jovem de romântica beleza que, com seu trompete e sua voz, transmitia um inconformismo e conforto em surdina com os valores vigentes - um ameaçador não-estar-nem-aí que era o epítome do que significava ser cool. Em toda parte, inclusive no Brasil, outros jovens foram afetados pela música de Chet Baker."

O artigo a que referi no primeiro parágrafo está no disco The Art of the Ballads", uma coletânea do que de melhor Chet produziu no estilo cool das baladas e foi escrito por Paul de Barros em 1998. As faixas reunidas foram gravadas em 1958, 1959 e 1965, com várias formações diferentes e, em duas delas, Chet troca o trompete pelo flugelhorn e, nas duas últimas, temos o trompetista cantando também, ele que criou um estilo de cantar quase sussurrado que influenciou inclusive João Gilberto.    


A coletânea de baladas começa com Polka Dots and Moonbeans, gravada em 1958, em Nova York. Apesar do nome (Bolinhas e Raios de Lua) sugerir algo ligeiro, é uma música suave, como convém às baladas e que tem Al Haig ao piano e Paul Chambers no contrabaixo. Completam o repertório Autum in New York; My Old Flame; Alone Together; I Should Care; When Lights Are Low; Stairway to the Stars (a primeira em que Chet toca flugelhorn); Indian Summer; Almost Like Being in Love; I've Been  Accustumed to Her Face; Lament for the Living (a outra em que Chet toca flugelhorn); I'm Old Fashioned e My Heart Stood Still. 


Desde que que comprei esse CD, em Londres, em 2001 (lá se vão 21 anos e não sei se alguma gravadora lançou-o por aqui), tenho ouvido constantemente e não me canso. É um desses discos eternos que, daqui a séculos, ainda provocarão prazer no ouvinte.  

Ele está à venda com preços módicos e elevados (encontrei por R$ 29,00 na Amazon e por R$ 250,00 no Mercado Livre) e também pode ser ouvido inteiro no YouTube em https://www.youtube.com/watch?v=zA8BnjZ7zZ4&list=OLAK5uy_nTwzVsSNbSHBEHVZPKvmKy7frpB1R9KyU . 

quinta-feira, 21 de abril de 2022

A Silvio Rodríguez

 Por Ronaldo Faria

Ao unicórnio azul, prateados sonhos de se ter. Sejam estes quais forem. Talvez um voo a mais. Um pouso inconsciente ou demente. Um desejo de rever, recomeçar, deixar, ser. Seja em que lugar for. Entre lágrimas ou dor. Ao tempo, atemporal fortuito, um temporal de certezas incertas e falésias em indiscriminada avalanche daquilo que parece só infinito mas é derradeiro odor.

Presságio natalino

 Por Ronaldo Faria O Natal corre brejeiro e cheio de cheiros, madrigal. Se esconde nas cercanias de casarios perdidos no tempo ao vento qu...