terça-feira, 25 de outubro de 2022

O atormentado e genial Charles Mingus

Por Edmilson Siqueira

"A partir da metade dos anos 1950, depois de uma mudança para Nova York e uma imersão na cena jazzística dos night clubs da metrópole, Mingus encontrou seu caminho. Liderando todos os tipos de grupos de jazz, com todos os instrumentos possíveis. Durante vinte anos ele experimentou o folk, o beebop ou formas sinfônicas - sem se importar com o repertório que cada grupo usava como ponto de partida. Mingus fazia de tudo alguma coisa nova, atormentado, mas altamente organizado, que olhava para o futuro e o passado do jazz, às vezes dentro da mesma peça." 


O texto acima, infelizmente sem o nome do autor, está na contracapa de um disco de Charles Mingus dentro da série - ótima, por sinal - denominada "Ken Burns Jazz", extraída dos legados da Columbia e do Verve Music Group. São 22 títulos e seria difícil destacar um deles.  


O disco é um ótimo panorama da música do genial Charles Mingus, talvez o mais ousado e criativo entre os gigantes do jazz norte-americano, mesmo sendo um contrabaixista. Um de seus discos - "Three or Four Shades of Blues", ainda de vinil, - foi minha primeira experiência com o jazz, há mais de 40 anos, comprado numa loja aqui de Campinas, que não existe mais, a Raposa Vermelha, e indicado pelo amigo Tatá que ali trabalhava e que, infelizmente, também já se foi. 


São apenas 9 faixas, mas muito bem escolhidas, oito das quais do próprio Mingus. A primeira é "Haitian Fight Song", do disco The Clown e por ela, nos seus quase 12 minutos, percebe-se bem o que vem pela frente: uma fusão de tudo que parece com tudo e é somente jazz, se é que isso se trata de alguma explicação. Só ouvindo mesmo. 


A segunda é "Goodbye Pork Pie Hat", que estava naquele LP que comprei, mas aqui foi extraída de outro CD, "Mingus Ah Um". Uma balada lenta que se encorpa nos seus 5 minutos e 42 segundos de execução, com muitos metais. 

 

A terceira também vem do LP famoso e foi reproduzida no "Charles Ah Um". É quase rock, quase jazz, numa festa de sons. Tem 7 minutos e 21 segundo que passam rapidamente.  


A quarta faixa é "Original Faubus Fables", extraída do CD "Charles Mingus Presents Charles Mingus" e gravada em dezembro de 1960. Nela há um momento meio raro: Mingus cantando, ou falando durante a música dentro do ritmo, brincando com os sons dos metais.  


Depois é a vez de "Peggy’s Blue Skylight", gravada em vinil em 1961 e extraída do CD "Tonight At Noon". Lindos solos de sax numa faixa em que Mingus deixa o contrabaixo para Doug Watkins e se incumbe do piano. 


"Eat That Chicken" tem novamente Mingus ao Piano e ao vocal, com sua voz rouca, e, com seus 4 minutos e 37 segundos é a mais curta de todo o disco. Outra festa de sons com lembranças do jazz sulino. 


A sétima faixa, embora não seja a mais longa do disco, tem o maior título: "Solo Dancer - Stop! Look! And Listen, Sinner JimWhitney (The Black Saint and The Sinner Lady)". Aqui Mingus vai de piano e baixo, tendo como acompanhantes nada menos que outros nove músicos, quase uma orquestra.  


A oitava faixa é a única que Mingus não assina. O autor é nada menos que Edward Kennedy Ellington, que assina E. K. Ellington, e ficou mundialmente famoso como Duke Ellington, a maior inspiração de Mingus, segundo o próprio. A música é o clássico "Mood Indigo", uma delicada balada que nem o "atormentado" Mingus teve coragem de mexer muito. Mesmo seu solo de baixo é contido. E genial, claro. 


Por fim "The Shoes of the Fisherman's Wife Are Some Jive Ass Slippers", gravada em 1971, é a mais nova do disco e foi extraída do CD "Let My Children Hear Music". Apesar do nome, a música tem aspectos sinfônicos. 

Eu não encontrei o CD no YouTube, mas ele está à venda nos bons sites do ramo. 

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

À Lígia do Tom

 Por Ronaldo Faria

Fumaça enternecida e quase esquecida. A Lígia do Tom eu vi, face to face. Num cursinho do Méier. Ao lado da primeira amada, meio índia como a Lígia do Tom. E não é que depois consegui ser jornalista. Num misterioso qualquer após e em diarreia que só saberei depois de morrer. Ou não. Hoje, à Lígia do Tom, fumo, bebo, revejo e viajo no tempo. Ainda bem que esse há!

sábado, 22 de outubro de 2022

Clube de Esquina de novo (e ao Lô Borges)

 Por Ronaldo Faria

Mortal ou imortal? Fatalidade, senão. Um tempo atemporal e imoral, irreal, cabal, letal, fetal, fatal, abismal. Afinal, não há momento eterno (nunca haverá). Talvez um terno tocar de mãos e corpos, invólucros e desnudos, incapazes do tempo parar, ou um terno de roupa a balançar entre mãos, inútil, para se colocar à derradeira veste que irá queimar ou apodrecer. Mas, hoje, há um marco definitivo. O saber de que valeram a troca da toca, o crer que há mais do que você, um seguir de esperanças e crenças mil. Um passar de genes, trens doidos, dias doídos, uma inenarrável leveza do ser - ou não. Poeta de músicas mil (nunca levadas às notas), centenas de milhares madrugadas afagadas de vozerios e cheiros tardios, me jogo ao jogo sem joio a catar todo o trigo.

sexta-feira, 21 de outubro de 2022

Cinco discos de Sergio Mendes numa caixinha

Por Edmilson Siqueira 

Navegando pelo site da Amazon, encontrei uma oferta dessas que a gente tem de aproveitar. Trata-se da Original Album Series, uma caixinha com cinco CDs de um determinado artista. São dezenas de artistas, diga-se, e os discos não são os últimos lançamentos deles, pelo contrário, são antigos, alguns de início de carreira, muitos com as capas dos LPs originais, reduzidas para caber nos envelopinhos que guardam os CDs. 


Comprei a caixa de Sergio Mendes por apenas R$ 55,80. Chegou no dia seguinte, que foi quarta-feira e, desde então, os discos têm acompanhado minhas tardes, porque na parte da manhã voltei a trabalhar e não dá pra misturar música com o que faço. 


Os cincos CDs são oriundos de LP lançados nos Estados Unidos e também no Brasil e contêm praticamente os primeiros anos da aventura de Sergio Mendes nos Estados Unidos, onde se formou não só como um músico respeitado, mas também como empresário dono de uma gravadora em sociedade com Herbert Albert (a AM Records) que colocou inúmeros sucessos nas paradas americanas. Sergio Mendes chegou a cantar na Casa Branca durante o mandato de dois presidentes. É, sem dúvida, ao lado de Jobim, o músico brasileiro de maior sucesso nos Estados Unidos. E talvez no mundo. 

A caixa tem os seguintes discos com as respectivas músicas:  


The Swinger From Rio - The Girl From Ipanema, Useless Panorama, Sambinha Bossa Nova, The Dreamer, Só Danço Samba, Maria Moita, Consolação, Batida Diferente, Pau Brasil, Primavera e Favela. 


In Person At El Matador! - Reza, O Morro, Samba Do Astronauta, Tem Dó De Mim, Jodel, Samba De José, Noa Noa, Black Orpheus Medley (Manhã De Carnaval, Batuque De Orfeu, e Samba De Orfeu), A Felicidade, Arrastão, Vai De Vez e Caminho De Casa.


The Great Arrival - Nana, Don't Go Breaking My Heart, The Great Arrival (Chegança), Monday Monday, Morning, Carnaval, Girl Talk, Boranda, Bonita, Tristeza De Amar, Canção Do Amanhecer e Here's That Rainy Day.


The Beat Of Brazil - Ela E Carioca (She's A Carioca), Amor Em Paz (Love In Peace), Coisa No. 2, Desafinado, Primitivo, Nana, Corcovado, Noa Noa, Garota De Ipanema (The Girl From Ipanema) e Neurotico.


Sergio Mendes' Favorite Things - My Favorite Things, Tempo Feliz (Happy Times), Ponteio, Veleiro (The Sailboat), A Banda (Parade), I Say A Little Prayer, Comin' Home Baby, Boa Palavra (The Good Word), O Mar É Meu Chão (The Sea Is My Soil) e So What's New. 


Além da Amazon, há vários outros sites que também estão vendendo esses discos. 

quinta-feira, 20 de outubro de 2022

Trapizonga - Tavinho Moura

 Por Ronaldo Faria

Trapizonga cômica masculina como empedernido sonho feito formicida colocado no nosso dia findo ao infundado. Mais uma etapa tracejada de sonhos e perdas. Quaresmas mil, bazófias quaisquer, emblemáticas auroras que nunca vão raiar.

Trovões, nem por isso, far-se-ão. Talvez um pingo ou outro respingo onde ele haverá de se fazer. No caminho sôfrego, o âmago a se tragar na draga que o pó a estrada há de levar.

No abrir da rosa visceral, um desigual porvir entre a realidade e o senão. No meio de tudo, um sermão. Ser ou não ser, eis a questão? À loucura utópica e ótica, alguém por certo saberá grassar. Daqui, tudo o que o mestre irá mandar. E se ele não o fizer, creiam valerá ter sido o mais rápido esperma numa corrida entre o sabugo e o gavião. Na vida, osmótica e ótica, vale o que for nas teclas tardias e lógicas. Há prosódia no mundo?

Trapizonga cônica e afônica como nada ser. Calandras nunca viradas em ideias e teias tragicômicas. Mistura de histórias mal contadas e palavras nunca ditas, inauditas ao ouvir do senão. Brincadeiras repaginadas em maresias da Zona Sul, augúrios férteis em estrelas douradas. Canções de reis sem coroa, como um faminto a comer sua broa. Um tempo atemporal, casual, far-se-á como qualquer decrépito dia.

quarta-feira, 19 de outubro de 2022

A era do swing com o Flashback Quartet

Por Edmilson Siqueira 

E lá vou eu novamente com uma deliciosa hora de jazz. A coleção que já comentei aqui é das mais completas em termos de história do jazz, abrangendo, em seus mais de cem discos, praticamente o século 20 inteiro. Eu só tenho 24 discos da coleção, mas um dia ainda a completo. 


O disco de hoje se chama "The Flashback Quartet & Friends" e tem por subtítulo "Clarinet Games". É uma descarada e amorosa homenagem a Benny Goodman (1909-1996), o artista que causou uma pequena e maravilhosa revolução no jazz com seu clarinete e seus grupos e orquestras.  


No encarte, um artigo assinado por Skip Voogd diz que "Benny Goodman foi uma daquelas raras personalidades do jazz que se tornaram uma lenda antes de morrer. Seu nome e seu clarinete serão sempre indelevelmente associados à era do swing. Sua banda atingiu o auge de popularidade durante o verão de 1935, depois que ajudou a dar origem à era do swing no Palomar Ballroom em Los Angeles. A partir de então, com suas gravações, abriu caminho para uma recepção entusiástica em todo o mundo." 


(...) "Durante muitas décadas Benny Goodman inspirou toda uma escola de clarinetistas de jazz e um de seus admiradores holandeses é Bop Kaper, atualmente com 83 anos, justamente quem toca clarinete e comanda esse "The Flashback Quartet".   


"Bob Kaper consegue improvisar com os melhores colegas, mas nunca deixa que uma ideia se torne tão importante que o impeça de 'falar' com vocês.  Ele opera com base na teoria de que a linha melódica é importante demais para ser descartada", diz Voogd 

Com Bob Kaper neste disco estão os seus habituais companheiros do grupo, como Marcel Hendricks e seu piano swingado, Adrie Braat esbanjando categoria no baixo e a sólida bateria de Huub Janssen. Em algumas faixas, amigos de Kaper, como três clarinetistas holandeses e o vibrafonista francês Dany Doriz. 


Por fim, Voogd afirma que "para muitos amantes mais velhos do jazz esse disco é um testamento de amigos que proporcionam uma lembrança nostálgica da esfuziante era do swing. Já para os mais jovens esse disco significará a descoberta de um novo mundo musical. 


O CD ainda está à venda por aí e pode ser ouvido na íntegra no YouTube em https://www.youtube.com/watch?v=kJ_-S4V6xfk&list=OLAK5uy_mGwLICFynlHW7G7BhHZaVOgDsgFpOcm5U . E eu garanto: é ótimo! 

terça-feira, 18 de outubro de 2022

Ao Geraldo Azevedo

 Por Ronaldo Faria

No tambor cheio de dor, desando a andar no mar da China para onde for essa tal ensimesmada sina. A produzir um pouco ou tanto para mim mesmo, ou quem ninguém mais existe. Serei início, começou ou fim? Não sei ou sequer saberei. À areia aérea cercada de abelhas, urubus, gaivotas ou pombas, que o porvir seja megalômano ou atônito em si a esmo. Ensimesmado e autômato, trilho caminhos e descaminhos tracejados de sílabas e fonemas. Poucas verdades, enclausuradas maldades, sobre tais maneiras surpresas. Eu sou a presa. Não cobrem muito de mim. Talvez tenha ido além do por fazer mais. Se não o fui, talvez ainda busque esse canal, letal. Hoje, sei, esse fim que eu temo é tão pequeno e rarefeito que ninguém sabe onde estará. Na catança sem nuvem ou pajelança, que valha cada andança. Afinal, no final, nada será a chama que me ilumina. Um dia sairei da minha esquina e um clube criarei...


Presságio natalino

 Por Ronaldo Faria O Natal corre brejeiro e cheio de cheiros, madrigal. Se esconde nas cercanias de casarios perdidos no tempo ao vento qu...