sexta-feira, 22 de abril de 2022

Chet Baker nas baladas

Por Edmilson Siqueira 

"Chet Baker acreditava em baladas". Assim começa o artigo no encarte de um disco do trompetista norte-americano, que surgiu como um sonho e acabou vivendo vários infernos em sua vida, cheia de belíssimos discos, grandes apresentações e um punhado de drogas. As baladas do título são músicas lentas, jazzísticas, normalmente de grande beleza, muito comuns no cancioneiro norte-americano.  


A morte de Chet, até hoje sem uma definição entre acidente, assassinado e suicídio, contrasta com a leveza de sua arte e com a beleza de seu rosto jovem. Mas, se a música que ele fazia nos enlevava, sua vida era da pesada, entre amores desfeitos e traficantes. Pena. Partiu aos 58 anos, entre uma apresentação e outra em Amsterdã.   


Ruy Castro, nosso maior biógrafo, na orelha da melhor biografia de Chet Baker, escrita por James Gavin, afirma que Chet Baker "...ao surgir no jazz dos anos 50, encarnou o ideal de sua geração: o jovem de romântica beleza que, com seu trompete e sua voz, transmitia um inconformismo e conforto em surdina com os valores vigentes - um ameaçador não-estar-nem-aí que era o epítome do que significava ser cool. Em toda parte, inclusive no Brasil, outros jovens foram afetados pela música de Chet Baker."

O artigo a que referi no primeiro parágrafo está no disco The Art of the Ballads", uma coletânea do que de melhor Chet produziu no estilo cool das baladas e foi escrito por Paul de Barros em 1998. As faixas reunidas foram gravadas em 1958, 1959 e 1965, com várias formações diferentes e, em duas delas, Chet troca o trompete pelo flugelhorn e, nas duas últimas, temos o trompetista cantando também, ele que criou um estilo de cantar quase sussurrado que influenciou inclusive João Gilberto.    


A coletânea de baladas começa com Polka Dots and Moonbeans, gravada em 1958, em Nova York. Apesar do nome (Bolinhas e Raios de Lua) sugerir algo ligeiro, é uma música suave, como convém às baladas e que tem Al Haig ao piano e Paul Chambers no contrabaixo. Completam o repertório Autum in New York; My Old Flame; Alone Together; I Should Care; When Lights Are Low; Stairway to the Stars (a primeira em que Chet toca flugelhorn); Indian Summer; Almost Like Being in Love; I've Been  Accustumed to Her Face; Lament for the Living (a outra em que Chet toca flugelhorn); I'm Old Fashioned e My Heart Stood Still. 


Desde que que comprei esse CD, em Londres, em 2001 (lá se vão 21 anos e não sei se alguma gravadora lançou-o por aqui), tenho ouvido constantemente e não me canso. É um desses discos eternos que, daqui a séculos, ainda provocarão prazer no ouvinte.  

Ele está à venda com preços módicos e elevados (encontrei por R$ 29,00 na Amazon e por R$ 250,00 no Mercado Livre) e também pode ser ouvido inteiro no YouTube em https://www.youtube.com/watch?v=zA8BnjZ7zZ4&list=OLAK5uy_nTwzVsSNbSHBEHVZPKvmKy7frpB1R9KyU . 

quinta-feira, 21 de abril de 2022

A Silvio Rodríguez

 Por Ronaldo Faria

Ao unicórnio azul, prateados sonhos de se ter. Sejam estes quais forem. Talvez um voo a mais. Um pouso inconsciente ou demente. Um desejo de rever, recomeçar, deixar, ser. Seja em que lugar for. Entre lágrimas ou dor. Ao tempo, atemporal fortuito, um temporal de certezas incertas e falésias em indiscriminada avalanche daquilo que parece só infinito mas é derradeiro odor.

quarta-feira, 20 de abril de 2022

Curare, onde a música e a cantora se completam

Por Edmilson Siqueira 

Quando meu carro tinha um CD player, fiz cópias de muitos discos e botei tudo num porta CD para ouvi-los enquanto dirigia. Um dos campeões de audiência dessa época é Curare de Rosa Passos. Era, e é, na minha opinião, o trabalho de Rosa que mais se aproxima da bossa nova, ela que já foi chamada de João Gilberto de saia. 


Claro que Rosa é uma das melhores intérpretes do Brasil, além de ser inspirada compositora e exímia na arte de tocar violão. Seus discos são produzidos com o mesmo cuidado com que se dilapida diamantes e é difícil dizer que um é melhor que o outro.


Talvez esse Curare tenha caído tanto no nosso gosto por essa afinidade com a bossa nova, com um repertório irrepreensível. Evidente que a interpretação da moça, sensível, delicada e afinadíssima ajuda muito.  

A primeira música é a que dá nome ao disco e seu autor é Bororó, um nome não muito relacionado com a bossa nova, mas nem por isso fora do alcance dos ouvidos mais sensíveis. Apesar do nome sugerir o apelido de um compositor do morro, Bororó é Alberto de Castro Simões da Silva (1898-1986), sobrinho da Marquesa de Santos, funcionário público no Rio, mas mais conhecido como cantor, compositor e, principalmente, boêmio. A primeira gravação de Curare foi de Orlando Silva. E é dele também outra linda música: Da Cor do Pecado, seu primeiro sucesso. 


Jobim é o principal compositor desse disco. Dele, Rosa escolheu Fotografia, Dindi (com Aloysio de Oliviera), A Felicidade, Só Danço Samba e O Nosso Amor (essas três com Vinicius); três sucessos de Haroldo Barbosa - Tim Tim por Tim Tim E Adeus América (ambas com Geraldo Jacques) e Eu Quero Um Samba (com Janet de Oliveira); dois de Ari Barroso - Aquarela do Brasil e Folha Morta; um de Djavan - Sim Ou Não; um de Johny Alf - Ilusão à Toa e um de Carlos Lyra e Vinicius - Coisa Mais Linda.  


Como se vê, a seleção de música é das melhores e Rosa Passos dá a todas elas, uma interpretação pessoal, fugindo das gravações que já existem e recriando muitas vezes esses sucessos já tantas vezes gravados e regravados por aí. O que, convenhamos, não é tarefa fácil. Mas a baianinha tem talento de sobra.  


Só para se ter uma ideia desse talento, em sua página na internet há a seguinte anotação: "Em 2006 Rosa se apresenta ‘solo’ no palco do Carnegie Hall Zanken Hall em um show de voz e violão. Rosa dedicou o ano de 2007 ao público brasileiro e em novembro de 2007 apresentou-se no Blue Note de New York, prestigiada casa de jazz, uma série de seis shows que anteciparam sua participação como homenageada da Berklee College Of Music em Boston onde ministrou oficinas de música com presença do corpo docente e alunos da renomada escola. Em janeiro de 2013 gravou um cd dedicado à música de Djavan, através da MdA International e voltou a percorrer o Brasil e mundo com apresentações junto a seu grupo." 


Pois é, a moça, dona de 17 discos, não deixa por menos. Tenho dez CDs de Rosa Passos, dois ou três autografados, pois ela se apresentou na antiga e saudosa Estação Santa Fé de Barão Geraldo e estávamos lá, Zezé e eu, encantados, numa mesa a poucos metros dela. 

Curare pode ser ouvido integralmente no YouTube (https://www.youtube.com/watch?v=yXo0kQWrY80&list=PLTaRWr5sdDvloEK2I6k25xLTifrPaYbEt) e pode também ser adquirido nos bons sites do ramo. Vale a pena não só ouvir, como ter esse disco na coleção. É coisa fina. 

terça-feira, 19 de abril de 2022

Waly Salomão 3

 Por Ronaldo Faria

Gritemos e nos engalinhemos, nos engalfinhemos, naquilo que isso for. Nos esforcemos para aguentarmos quem não nos entende e nunca nos entenderá. Seja em que esfera for. Sorte do Vinicius, Tom e tantos mil outros que optaram pela orgia ou solidão. Fechar ou se abrir entre janelas sobre a Guanabara. Sob a distância, a alquimia de ser, ver e ouvir e se calar. Se dar em si mesmo em nome dos outros, se amputar, se calar, se fazer um nada a nadar nas antropofagias de se matar. Ouvir as “verdades” e calar. Viver o amor perfeito no peito que se esvai vida afora. Em mililitros ser julgado. As ideias, os versos e reversos, esses que se fodam. O tanto vivido, sobrevivido, renascido, refeito, premido, calcinado de pesadelos e desmazelos, que se foda. A vida é, enfim, uma foda maldada. Eu preciso...

Oh, minha honey baby.”

(Wally Salomão)

segunda-feira, 18 de abril de 2022

Prazeres matinais

Por Edmilson Siqueira 

Cliquei sábado de manhã no YouTube para assistir alguns vídeos e o programa me aparece com a capa de um CD onde dois artistas negros, já na terceira idade, se olham de frente, meio que abraçados, num olhar mais que fraterno. O título do CD é Collaboration, eu não conhecia e, por um impulso provocado pela bela foto da capa, cliquei para ouvir. 


O som que começou a tocar, sem trocadilhos, me tocou logo de cara.  Um piano esperto, uma bateria presente, porém discreta, um contrabaixo fazendo a base. A música é Rhythm-A-Ning e exige grande concentração dos solistas, mas eles tocam como se já a conhecessem há muito tempo, transmitindo não só a beleza do ritmo, mas o prazer de fazer a coisa certa e bonita.  


A segunda faixa é lenta, mas é um clássico e quando começa já arrebata o ouvinte. Uma introdução simples para as primeiras notas de Summertime ao piano, enxutas, certas e prazerosas. Aí eu já quero conhecer mais e invado o Google à procura de referências sobre o disco. E descubro que o baterista é Elvin Jones e o pianista é seu irmão mais velho, Hank Jones. No contrabaixo Richard Davis. O disco foi gravado no Avatar Studios, em Nova York, nos dias 12 e 13 de maio de 2002, com exceção de uma faixa que foi gravada na Sony de Tóquio em fevereiro de 2004. 
   

Mas o disco tem mais histórias. Pesquisando em sites de vendas, sou informado que as sessões do Avatar Studios resultaram em três discos e que esse Collaboration é o terceiro, todo ele com faixas alternativas, com exceção da faixa gravada em Tóquio. O primeiro álbum, Autumn Leaves, está disponível na 441 Records. O segundo, Someday My Prince Will Come, foi lançado pela Sony Columbia.   


Descubro também que esse é o último álbum gravado pelos dois irmãos e que a faixa de Tóquio, Memories of You, é, possivelmente, a última gravação dos dois juntos. Ela foi gravada em 5 de fevereiro de 2004 e Elvin Jones morreu em 18 de maio do mesmo ano. 


Pra quem não sabe, inclusive eu, Elvin Jones foi um dos bateristas mais influentes da história do jazz moderno. Seu irmão, Hank, ótimo pianista por sinal, escreveu no encarte do Collaboration um texto intitulado "Elvin, meu irmão". Um trecho: "Eles dizem: 'Os bons morrem jovens'. Concordo. Thad e Elvin sim. Eles dedicaram suas vidas ao que amavam e acreditavam, mesmo que isso significasse encurtar suas vidas. Como membro da família, às vezes me pergunto se pudéssemos ter feito menos e permanecido juntos como uma família por mais tempo. Por outro lado, respeito sinceramente o desejo de Elvin de viver sua vida (tocar). O mundo da música de hoje não existiria sem ele. O fato de ele ter sido um grande baterista que influenciou todos aqueles que vieram depois dele ficará para sempre nos discos e na memória das pessoas." 

Além de Rhythm-A-Ning e Summertime, o disco tem ainda Satin Doll Blue Bossa, Long Ago And Far Away, The Shadow Of Your Smile, Autumn Leaves, My Funny Valentine, Moose The Mooche e Memories Of You. 


Por fim, é um trio de jazz com a formação clássica de piano, baixo e bateria, com um excelente repertório levado por três músicos não só altamente experientes, mas também deveras talentosos. Ganhei o sábado ouvindo os três.


O disco está à venda nos bons sites do ramo e pode ser ouvido inteiro no YouTube neste endereço: https://www.youtube.com/watch?v=9WWCz49zAA4 

Presságio natalino

 Por Ronaldo Faria O Natal corre brejeiro e cheio de cheiros, madrigal. Se esconde nas cercanias de casarios perdidos no tempo ao vento qu...