Por Ronaldo Faria
Saudade. Maldade. Perversidade. Lá no
fundo, a cidade. Distante, conflitante, mistério na vida e na dor atenuante.
Entre eu e o meu eu mesmo, a fábula que, em inglês, diz siga-me. Follow me...
E eu vou seguindo. Na trilha que
escurece e brilha. Percorre ruelas cheias de pó e pedras, pedaços de histórias,
histriônicas e esotéricas. Histéricas. Reais. Que delimitam a lucidez e a
loucura. Marcam e perfuram, aprofundam o limite entre a descoberta e a cura.
Nos deixam entre a vida e a eternidade que não verá a manhã, nem a noite e
sequer a tarde. Nada nos fará dormir sem pesadelos bisonhos, pedaços de sonhos, a
chegar a nenhum lugar.
Por aqui, entre uma tela que brilha e
uma ilusória cerca que sangra, fico travestido de saudade, um ser sem poder.
Sem corpo, copo, cópula, estrada para Cornucópia. Alguém entre o dedo mínimo e
a língua na outra boca. Carcomido por si mesmo, caminhando longe do açude, do
rio, do litoral. Submerso entre a embriaguez e a madrugada que aflora em
sofreguidão irracional.
No copo, vodca e coca. Inconsequente e
vulgar. Sob a lua minguante, entre esquinas, prostitutas e mulheres, sinas,
seres lunares à senda de trilhar. Corpos desnudos, palavras vãs, vaginas.
Coração perdido e anginas. Ladeiras de paralelepípedos, descidas de areias e
sereias a beirar um canto escondido e o cântico do mar. Mistério escondido a
arfar.
Aqui na frente, lá de lado, acolá,
mais um descarregar de líquido alucinógeno, misturar de preceitos e trejeitos,
desejo de servir e sorver loucuras e pernas de mulheres transformadas em
mesuras, medusas e semideusas. Logo, "Deus", me dá ao menos em devaneios aquela
que eu quero antes da fuga que chega depois do derradeiro vendaval. Livra-me de
morrer antes que eu descubra se há em mim amor ou mal. Que seja eu a ligação
perdida entre os filhos, o avô e o pai.
Agora, entre a liberdade que se faz e
se desfaz na inusitada chegada que se encerra (à antiga) na esquina onde aporta a
escuna que me leva ao universo entre o início e o fim, digo-me corpo
inútil, fútil, a verter limites do que eu quero e aquilo que me é dado, por
fim. Na perfídia desmedida e infinda, despeço-me aqui. Afinal, sem saber, acho que já
passou o meu Carnaval.
“Sejam quais forem os sentimentos e os
interesses humanos, o intelecto é, também ele, uma força. Esta não consegue
prevalecer imediatamente, mas por fim seus efeitos revelam-se ainda mais
peremptórios. A verdade que mais fere acaba sempre por ser notada e por se
impor, assim que os interesses que lesa e as emoções que suscita tenham
esgotado a sua virulência”.
Sigmund Freud, in As Palavras de Freud