Por Ronaldo Faria
Pierrô, esquece a tua colombina. Ela
não combina mais a fantasia com a tua. Os olhos cansaram da purpurina do salão
e os confetes deixaram de cair do alto do salto a gingar no vazio coração. A
avenida está tardia e a bateria deixou seus instrumentos quietos num canto
qualquer. A porta-bandeira há muito não vê seu estandarte tremular. O
mestre-sala mora num quarto e cozinha longe do mar. O arlequim vende
quinquilharias de Pequim. A passista passa longe dos prantos da arquibancada
que agora aplaude um destaque sujo de nanquim. Baianas rodopiam a ouvirem o pio
da ave que deita ao sol da mangueira, quente no calor. Compositores se
decompõem ao samba de autores mil. No ritmo do ritmista solitário da dispersão,
ainda foge da garganta dos aflitos a derradeira canção. Como recomeço de quatro
dias à dor imortal do amor que, no samba-enredo, se fez campeão e fatal.
Por isso, Pierrô, esquece tua
colombina. Para com teus passos em descompasso. Deixa de lado a fantasia
escondida em tantos dias e sai nu pelas ruas a gritar que é preciso cantar para
a dor ter fim. Que é preciso reaver o sorriso perdido nos dentes brancos
daquela que passa entre as alas da escola a dançar e cantar como fosse o
Carnaval de um despacho a qualquer santo imortal. É preciso olhar nos olhos que
brilham, rebrilham e borbulham a saltarem da íris feito cor do mar. Assim,
Pierrô, deixa o choro às cinzas de uma quarta-feira que, sobremaneira,
far-se-á. Jogue todas tristezas e mazelas no esgoto e deixe que o suor a descer
de ti seja eterno esquecer. Afinal, a árvore quase já morta ainda quer crescer. Dança e
requebra, quebra e lança ao longe a tua ilusão. Deixe que se refaça a canção.
Distante, no ditame do enfim, uma rosa, como diria o poeta, há de falar do
perfume que rouba de ti.
(Ao mestre Cartola e o
Carnaval)
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