quarta-feira, 21 de agosto de 2024

A falta que algo faz

 Por Ronaldo Faria

 


“Que falta faz o óculos para escrever. Que falta fazem os ósculos e óvulos para se viver.”
Jerônimo, homônimo daquilo que se quiser crer, pensava: “Venha o que vier, tamo junto!” Ele era apenas mera e rara realidade. Cansou de crer em santos, Nostradamus e sânscritos escritos perdidos numa tumba qualquer. Seu acreditar agora era de um finito minuto. Mudava a cada hora de nova oração. Devoto do tempo ateu, onde a pessoa se dá bem ou se fodeu, passeava nas nuvens de pungência etérea que só a Terra dá. A noite agora por fim se enternece e chega reluzente e crente de que é eterna ou terna pungente ao poeta louco de se embriagar de canto ou verso lindo.
Jerônimo, heterônimo de si mesmo, bastardo tragado na nostalgia que a jia coaxa até ser comida pela jiboia, sabe que logo ali defronte está a tardia chegada que desce a ladeira como fosse uma ruma de filhos de Gandhi. Mas, nesse momento, de tormento e lamento, tanto faz como se fez. O feio ou bonito em algo se se tornará. Para ele, estar aqui ou em Bagdá, pouco o texto formatará. Nas bombas que explodem sempre pelos lados de lá, a dor sincroniza o ultimo sopro de vida que ecoa no luar. Enfim, os derradeiros raios de luz fazem solfejos de fim da dor. Daqui para frente, no enfrentamento de si, Jerônimo delimita a linha da lucidez e do torpor. Não haverá certeza ou louvor.
Na esquina, dessa onde a quina já machucou muitos bêbados em quedas por demais, alguns alguéns brincam de goles mil derramar. Certamente, no alto do mar, no ato do amor, o vasto envolver de pernas, ventres e braços. A envolvente incerteza que a certeza da incerta volúpia dá. Um tanto de tântrico querer, um esmero de cadafalso que o viver falso traz vozes e frases atrozes em artroses milenares. No poste que posta como luz a quirela de emoções e canções mil, milhares de insetos buscam a morte no iluminar longe do luar. Na festa que o infausto da soberba traz, vêm as vestes da seminua Camélia a quem Jerônimo quer entregar seu coração. Os seios fartos, parcos para quem não os beijou, as pernas que guardam no meio o anseio fugaz, o corpo translúcido a dançar na madrugada fria. No ensejo, o certo e o abstrato. Enfim, um ato. Substrato no trato de um câncer que foge de si para a morte do mesmo alguém.
A fugir das linhas certas e decrépitas da rima lunar, Jerônimo, que não é rei de nenhum sertão, caminha feito Pero Vaz de Caminha, a escrever asneiras de que em plantando tudo dará. Certamente, um dos poucos letrados de poucas caravelas no além do além-mar, pensava descrever o que via ou a loucura que viveu nas milhares de léguas que mil éguas não teriam feito por antes morrerem afogadas. Mas, se não houver sonhar, de que vale o próximo acordar? Jerônimo, longínquo ser que não veria a luz elétrica tudo esplandecer, ao menos vivia sua falácia de no porto mais perto chegar. Nele, holandesas, suecas, islandesas, francesas e quem mais mulher for, estavam a esperá-lo, saído do ralo dos mares navegados. Feliz, prostrado na mesa da taberna, com canecas de vinho derramadas, enfim encontrará a sua amada. “Pode, neste ser, ao menos dar uma mamada?” Essas, dizem, foram suas últimas palavras. No ancoradouro próximo, outras galés emergem e submergem para o novo mundo buscar.

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