sexta-feira, 6 de setembro de 2024

A mosca moscando

 Por Ronaldo Faria


A mosca se enche de vitamina D, mesmo que não precise precisar. Decerto, ela não liga se irá torrar. Se o sol pode queimar, certamente também poderá refrescar a cada batida de asa. Na fome de afugentar a fome que deve estar a lhe cobrar, díptero braquícero doméstico que ela é não liga em ser foco da lente. “Já sou foco de coisa bem pior, otário”, deverá ter pensado daquele que a eterniza.
Na mesa ao lado, Florisvaldo, amigo de Datolfo Cataldo, florista a que tantos amores quase perdidos deu um jeito, espera Anastácia, a falácia amorosa de sua ignóbil vida. “Está cedo ainda. Ela chegará” – pensava sem ressalvas. A ver a mosca moscando a moscar, fácil de se matar, ele apenas ouvia o som redundante que vinha das caixas de som que a vida é bela e que nós e que estragávamos ela.
Num mantra próprio e exótico, quase erótico, a mosca passeia sobre a cor de abóbora. Quantos restos de comida e tantos odores não existirão lá? Ali era o seu lugar. Ao lado, quase no lodo, Florisvaldo sentia certa inveja do inseto que curtia em volta todo o ar. E Anastácia, essa história romântica quase dramática, mistura de amor e física quântica, que fim levou? O tédio impiedoso veio chegar.
Ele, senhor de derrotar milhares de moinhos em seus ventos mil, sem nenhum ancho amigo que se chamasse Pancho, só sabia que teria de esperar. A vida, enquanto corre nas veias, não há como parar. Se atirar ao mar e nas ondas se afogar para depois virar manchete de jornal popular? Nunca. Seu amor iria desaparecer e nas páginas de uma história sua, escrita na memória do tempo não poderia falar.
De repente, assustada por algum vento irregular ou saciada em sua maneira de se alimentar, a mosca decide ir para outro lagar. Tempero novo pode nova saciez deleitar. E Florisvaldo ficou só. Solitário e contemplativo, motivo de riso. Anastácia, asmática, decerto teve uma crise e por isso se ausentou. Melhor que assim tenha sido e seja. No mar que arrebenta ali, a areia briga com as ondas como Muhammad Ali.
 
(Novamente tendo aos ouvidos e mentes os novos da MPB. Deus lhes dê vida eterna)

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