Por Ronaldo Faria
Dois cantores se encantam de entrelaçar sons e tracejar claves de sol
numa noite qualquer. Entre as notas denota-se o refrão. No verso translúcido da
sofreguidão, a descrente canção.
E lá seguia ele a dançar num desandar trôpego e sôfrego de tanto tropeço pelo asfalto que, fausto à imensidão, parece não ter trajeto igual à mão da morena sem jeito. Sob a luz dos postes iluminados, acordes de mariposas que buscam a claridade feito caça noturna da raposa.
E lá caminhava o homem a esperar o galo fazer sua sinfonia tardia ao despertar da vida. Sobre ele, uma lua desbragada e largada brilhava solitária e entregue aos sonhos de todos amantes. Discreta, entrava pelos veios que uma cortina ou outra deixava e caía ao lado dos corpos nus.
E lá se perdia, na perda mais vazia do que ninho largado pela cotovia, entregue a embriaguez e azia. Vez ou outra se prostrava diante do nada e nadava por si mesmo, em mares e oceanos profanos e insanos, tempestades e marés sem pé e nem cabeça, num afogar sem cercanias.
E lá, depois de se cansar de tanto querer, diriam os descrentes da paixão, se deixava dormir tendo como lençol as nuvens que passavam sem saber aonde chegar. Puxava, então, um taco de coberta e ressonava patético e lúdico a se entregar aos pesadelos que o levavam sem saber voar.