Por Ronaldo Faria
Ouvindo Mário Adnet, bateu (para
variar) saudades do Rio de Janeiro (e tantos e outros tantos meses). Bebendo
Smirnoff Caipiroska (é horrível, mas vicia - juro nunca mais comprar),
lembro-me das dores do ciático, para lá de dolorosas hoje pela manhã, que eu
troquei por umas doses nesta noite/madrugada ao invés de um Voltaren. Preciso
transformar as minhas hérnias de disco em um CD de Bossa-Nova. Com luzes trocadas por
lâmpadas fluorescentes (no tom azul), tudo parece mais incerto e perverso (na
finitude blasfêmica da interinidade metafísica da vida).
Mas seja o que “Deus” quiser,
principalmente depois de editar 40 mil mortos sob tremores e dores paquistanesas,
onde para os mortos nem há mesas. E fica uma pergunta: como terá sido a morte
de cada um? Que terão pensado no último suspiro? Terão tido, aos milhares, o
último suspiro?
Inspiração é a ação transfixa ao
quadrado da imaginação e da inanição. Vem e volta, vem e vai, desvirgina e
vaticina. É o que é. E se basta. Vasta, lembra que o homem rimou no ônibus o
que um atônito passageiro não poderia repetir. Aliás, em casa, nem sabe direito
o que ele disse ou diz. Nem lembra da prosa airosa ou da poesia para uma meretriz. A
letargia das letras o faz simplesmente um eterno aprendiz. Pena que deixe
fugir, tal qual um peixe em verniz, letras e sonhos, num esmeril que não solta
limalhas (vida aos canalhas). No máximo, uma e também outras falhas. Lá fora, o
azul do dia virou um incandescente negror, refletido em néons e tons de
asfalto. Quem sabe, numa esquina, um assalto. No costado, o vaso de planta que
não dá flor. Vai meu último cigarro. Amanhã, quem sabe, pigarro. Na música, a
pergunta: “Cadê Mimi?”
Transpiração é a vazão performática e
asmática da insensível solidão. Fica e sai, vomita e cai, faz-se graça e
gracejos, bocejos talvez. No CD, tempo do Tom vivo. Tempo bom, em Jobim.
Praguejo e ciúmes em
segredo. Do corpo, o degredo. Da graça, a desgraça do ensejo.
Da saudade, a vermífuga palidez de quem caiu sobre a mesmice inexistente de uma
segunda sem feira. Pura asneira. Sordidez e verso transverso e maléfico.
Quisera todos os malefícios do mundo fossem o toque de um teclado louco e
rouco. Quisera as almas subissem feito fumaça cinza e cheirosa, com cheiro de
Índia lutando contra uma fronteira cheia de tremores tectônicos e afônicos,
pedindo para ficar um pouco mais sobre a terra miserável de um país fugaz. Mas
qual, a Terra não dá lar ou paz. No máximo vários ais...
Reação é como canção simbiôntica na
busca ínfima da sua própria ótica, no afã que apraz. Sobe e desce, geme e
desvanece, cria impropérios na ilusão solerte e solta um jorro de gozo e
esperma entre mãos, bocas e vãos por onde possa escorrer. E quanto universo, e tantas
mulheres morenas e tântricas, e porventura, na aventura da vida, lembranças
brandas de uma infinidade de barcos parados no mesmo cais. E assim continuamos:
contínuos de nós mesmos, calejados de prósperos impropérios e prosopopeias,
certos de que apenas vale o prazer.
No final, não haverá muito que fazer
ou ater. No máximo, em plena madrugada, aquiescer. Talvez um pedaço do
universo. Talvez a certeza de ser um ser pequenino e perplexo, olhando para o
próprio plexo. Meio perdido, um tanto esquecido e outro tanto, feito a mais
cândida criança, apenas querendo ser querido no espaço partido. Ficam aqui o sinhô e o próprio
umbigo. Alguém aí tem um fogo ou um figo?