Por Ronaldo Faria
A vida se esvai na urina de um
banheiro de bar. No autoflagelo das noites que se madrugam enternecidas e
entorpecidas, num tanto de saideira, outros tantos de saudade, mais um pouco de
inverdade, maldade dos neurônios que se fazem e perfazem em simbióticas sinapses
neuróticas. Sob a ótica do meio vazio e meio cheio, o recheio de piano a untar
e juntar as bolhas do copo a borbulhar. No olhar da urna que guarda a vida, o
vento do ventilador que ventila a dor. O quadro dependurado, azulejo azulejado
e impresso, a pressa do impreciso até quando. Afinal, tudo na vida é mero
desmando. Talvez um xote, um baião ou um xaxado. Achado, quiçá. Hoje nesse
mundo, quisera estar na Ilha de Itamaracá. A ver Lia, esteja ela onde estará. E
nos acordes de um mundo de cifras e notas denotar que existe e sempre existirá
um novo lugar, um lagar, um largar. Na largura da métrica da semínima ou da coisa
mínima, a semiótica que há muito a ótica esqueceu. No lavradio de uma serra que
escapou da sanha da serra eletrificada, a espera da esporádica e errática
poesia que surge do nada. Que faz de um aprendiz de poeta que pouco leu e sabe
apenas um misto de alguma coisa um algo a se decifrar. De onde virá? Quem, na
verdade, escreverá? De onde surgem palavras, métricas, rimas, rumos e falar?
Como um engodo ambulante pode saber se expressar?
Mas a vida se esvai na urina
de um banheiro de bar. Vaticina gotas e jatos no jorrar de lembranças, anchas e
achadas sabe-se de onde lá. Liquefaz em cor de ouro o tesouro que cada um tem e
traz. Transfixa o olhar inebriado da fila vencida, da porta que se abre para o
universo de gotículas esparramadas no chão, histórias sem começo e fim, senão.
Quem sabe um réquiem àquilo que termina, uma ode à esperança que germina, uma
valsa para qualquer coisa que se acredita seja a próxima sina. Talvez novo
amor, trocar de carícias e camas desfraldadas de fadas e fatos incertos e
certos no limiar de do calor que só dois corpos entrelaçados sabem compor. E
nova história será criada, nova lembrança será gerada, nova orgia escancarada.
Para cada uma, a múltipla magia de acreditar que depois da noite vem o dia.
Senão, a insensata crença de que o novo será novo de novo, como a galinha pensa
a por o seu ovo. Mesmo que ele, choco, não gere a vida em colostro. Mas, de
onde virão as ideias, as prosopopeias (seja lá o que elas queiram ser), as
efemérides que dormem n’algum lugar e, de repente, surgem para se fazer par?
Mistério etéreo e que naufraga no nosso mais íntimo e ínfimo mar, um dia,
qualquer um desses que ainda teimamos percorrer e vivenciar, nos dê uma mera e simétrica
resposta, nem que seja póstuma, só por dar ou, ao menos, tentar nos enganar.