Por Ronaldo Faria
Coisa de antigamente, quase
demente, como o bêbado que mente à vida e desmente seu próprio viver. Uma
retreta no coreto, uma treta a travestir de cores e odores as dores dormentes
que pedem apenas para dormir. Feito amores ausentes de dois que plantam a
semente de amar. Defronte, um mar que margeia o que pode ficar ou estar apenas
para se fazer passar. Enfim, o fio cortado e jogado à tesoura voadora que se
mexe à frente do espelho. Antes dele, alguns vários no desvario de brilhar sob
os óculos maltratados pelos olhos cansados de enxergar.
Entre tantos metais num
assoprar, respirar, soltar e prender o ar, dedos a correr o frio instrumento de
intento, vem o cheiro do vento que rompe e irrompe à noite numa magia de
lembranças e devassidão. Talvez umas pernas se abram logo ali neste instante,
quem sabe uma língua se fartará de prazer a fazer em si mesma num desaguar de
saudades e madrugadas nunca vividas ou chegadas. Um recital de prazeres e
vendetas a vender ilusões e paixões, sermões e senões. Cantilenas para falenas
que esvoaçam entre flores nunca vivas e vozes em desditas finitas, mil.
Assim, ao som do instrumento vil, feito comensal que se farta de temperos mil e sais, o silêncio se faz. Na suntuosa orgia que vagueia entre dias passados, passeios de degredados, demências de rastros perdidos, vai-se o que resta, presto, daquilo que se presta, em festa, à escuridão que é servidão do desejo de se desejar. Por fim, no reencontro do chorinho que une paisagens passageiras, como meeiras de um louco a vagar nas vagas que o oceano dá, espera-se a vida, que não tardará. Do lado de fora, a escuridão borbulha de faróis que correm na esperança de um dia poder chegar.