Por Ronaldo Faria
Encarquilhado, defenestrado, com
alguém que nem a gente (em mente) a dizer na fila do ônibus, “por favor, pode
subir”. Carros pararem nas ruas e os motoristas com um gesto de afeto a mexerem
as mãos num “pode passar”. Gumercindo estava assim: entre o começo do fim
definitivo e o fim efetivo do começar a dormir a sete palmos. “Nem fodendo,
quero ser cremado. “Do pó viestes, ao pó voltarás!” Do alto, se alto ou algo existir,
Deus briga por sua alma com Satanás. Na rua, um samba de pagode eclode.
Numa tela dessas que fica
ligada nas vitrines de loja popular pulula um vídeo do Ney Matogrosso. “Quero
chegar aos 82 que nem ele. Lógico que não terei a grana que ele tem, mas me
basta o seu pique. Não estar babando na fronha.” O pensamento de Gumercindo se
espraia pela noite que se embrenha numa futura madrugada tragada de mais um
dia. E brota de notas que se denotam ao silêncio quieto que surge feito grotão
escondido num pequeno senão. Como a grota em Angico que matou Lampião.
Sonoro, bêbado, embriagado,
feliz por ter comprado dois reais e vinte centavos de bala de canela, Gumercindo
se refastela nas vielas que separam seu dilema da trama grandiloquente que
sobrevive sem trema. Na trama subsequente (e cadê a trema de novo?), está no
barraco a ferver um ovo. Beberá um gole de pinga barata e logo dormirá naquilo
que deitar de bruços vale um largar. Ney canta que vale romper tratados e trair
os ritos. Na vida de caminhos tortos, que sobrevivam os poucos e derradeiros
sangues latinos.