Por Ronaldo Faria
Gostosa além da conta. Era essa
a referência que qualquer home, lúcido ou chapado, tinha para Verônica. Mesmo
que estivesse afônica, a tônica dos homens era igual: “Como ela não há. Temos
que tirar o chapéu para a dupla que a fez!” E o Seu Amâncio e a Dona Zuleika
nem eram tudo isso. Dois comuns, desses que a gente corre os olhos toda a vez
que entramos num trem de subúrbio ou numa rua qualquer. Mas ela, com certeza,
era a mulher. Seu corpo não tinha um centímetro ou polegada fora do lugar. A
boca era doe outro mundo. Aliás, se um ET tivesse outra igual, que o planeta seja
invadido nessa hora. Os olhos brilhavam fora das íris. Eram com vida própria,
na forma mais exótica que há. Enfim, Verônica era uma escultura ambulante de
semblante que nenhum artista conseguiria reproduzir. E ela sabia o quanto valia
à mente tardia do macho que a desejava possuir. Subia o morro como se flutuasse
além das nuvens. E não dava crédito qualquer a nenhum mero mortal. Seu portal
era bem mais acima do que o final.
Mas ela era bem mais do que gostosa,
apetitosa ou qualquer sinônimo que o gênero dê. Afinal, os tempos são outros. O
discurso é outro. Verônica, musa delirante de delírios ofegantes, não se
prendia em estereótipos, olhares óticos, versos utópicos. Era uma deusa
inclemente, dessas que cortam as vísceras dos loucos e dos que vivem noutra
dimensão, em diáspora absoluta e frágil. Era muito mais do que vasos e músculos,
úteros e peitos. Era algo afeito ao sonhar que o defeito das mentes não chega
ao coração. Para ela, não há oração, procrastinação. Verônica é muito mais,
aliás. Seu rebolado, atolado de trejeitos e defeitos, é muito melhor do que um bailado
de cisne qualquer. Seu pensar, falar, sonhar, até a caligrafia, são muito mais
além do que possamos pensar. No salão o samba rola. No teto, rolinhas põem ovos
em proporção. A ação está prestes a acabar. Verônica entra em casa. Maldito sejam
os tijolos que a escondem. Que um lobo qualquer de história infantil os derrubem.
Longe de tudo, o poeta poetiza a mulher maior.