Por Ronaldo Faria
Ano: 1950. Voz: Maysa. Música: O Barquinho. Tempo de reprodução: 2:19.
Para Arnaldo não há muito o
que ver. A amante de sempre já não existe, os imbróglios de se fazer dois já
não brilha nem sequer o poste queimado antes do Posto 6. Alhures, haverá uma
rua sombria, com seus botecos e bares a envolver urinas madrigais, cheiros de
creolina, poesias rasgadas nos guardanapos usados. Mas ele segue sonolento e
lento na busca do seu quarto e sala onde deitará o corpo envolto numa manta
fina. Afinal a janela ficará aberta e a brisa irá chegar.
Arnaldo sobe no elevador onde
grades ainda fecham a porta e abre a porta do apartamento 1020 jogado de frente
para outro prédio triste. Ouve tosses mil. “Como é foda morar num edifício lotado
de velhos”. Abre a geladeira, sonha que o gelo esteja com os centígrados de uma
geleira e pega a cerveja. Senta no sofá rasgado e, de bom grado, toma, sôfrego,
um gole que acaba em arroto. Põe um disco na vitrola. Maysa, com seus olhos verdes,
canta uma bossa que não é nova.
Para Arnaldo, pouco importa.
Há muito o tempo inexiste. Triste, olha pela janela o que parece ser a briga de
um cafetão com sua propriedade. Respira o ar que vem com cheiro de mar, olha
para o céu e uma lua sobremaneira pungente lhe dá boas vindas. Mais um dia
a menos, Outro dia a mais. Ele sabe que pouco lhe resta. Vontade já não há.
Menino eterno, põe o corpo, a crer que viver é sonhar.
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