Por Ronaldo Faria
Ao longe e perto o Morro Dois Irmãos se enche de raios de sol. Ao pisar passos poucos e trôpegos na areia do Leblon, Afrânio, que não é de Mello e nem de Franco, vê os raios fulgidos e fugidios da manhã brejeira se entremearem em casebres e ruelas. Ele sabe que a providência divina, essa que ensinam nos púlpitos perversos e sem versos de religião qualquer, não há. Por isso caminha já sabedor que a busca da felicidade não permeia a cidade. Quem sabe um copo de cachaça, uma mesa quadrada de madeira, cadeira perto do mar não refaçam a esperança de não ter vindo a este mundo em vão? “Se eu vim, o que eu tenho ainda a pagar?”
Mão levantada e dedo em riste pede
o cardápio. O velho patrício haverá de servi-lo. “Traz uma gelada, uma porção
de batatas com queijo, uma do alambique”. Pedido anotado. “Espero que tudo venha
do meu agrado” - pensa. No céu, uma aeronave passa em luzes brilhantes e barulho
de turbinas. “Queria estar nele, fosse para onde for”. Chega o pedido. Tudo OK.
O que poderia agora dar errado? O celular toca. “Não vou atender, foda-se”. Uma
chuva breve e molhada cai do alto. E como chegam lembranças, andanças, catanças
de emoções.
Do asfalto, como fosse um assalto de querências e tristezas em perfídias, um casal briga pelo fim que não deveria ter acontecido. Por que as pessoas rompem laços efêmeros e lascivos? Saber-se-á. Também, se não soubermos, que causa terá? Não sabemos sequer o segundo que virá, quanto mais o destino dos outros. Outrora, se amaram, se tocaram, uniram corpos, carne e sonhares. Hoje, nem soníferos dão o parágrafo letal. Barulhento, um ônibus leva pessoas na busca do lar. Nalgum momento o tormento em acalanto pedirá para, enfim, chegar.