terça-feira, 22 de outubro de 2024

Reencontro em dois ainda com o Maestro Moacir Santos

 Por Ronaldo Faria

 


-- Jussara é você?
-- Claro. O tempo passou tanto que não dá nem pra me reconhecer?
-- Não é isso. É que você, eu, nós mudamos. Aos trancos e barrancos.
-- Sei não. Engordei muito? Os preenchimentos se perderam?
-- O quê? Que preencher é esse? Pra mim só é o do imposto de renda.
-- Você parou no tempo? É a ressignificação do rosto.
-- É, com certeza. Afinal, o paraíso, mesmo em seus percalços, é onde estamos felizes...
-- É harmonização facial.
-- Claro. O importante é estar de acordo com os contornos que o desejo nos dá.
-- Gostou?
-- Quem sou eu pra gostar? Pouco ou nada conheço desse troço. E, sem troça, não sou expert em beleza.
-- Eu sei. Você é geneticamente limitado externamente, mas a mente pode ir além e ver o belo do outro como se fosse você o mais belo.
-- Infelizmente eu acho que faltei nessa aula de psicologia e autoestima próprias.
-- Tudo bem.
-- Mas e o compadre Edivaldo? Vai bem?
-- Larguei daquele traste. Resolvi ser um novo alguém.
-- Sei. Mas o que ele fez?
-- Nada.
-- Nada e você largou quase 40 anos de casada?
-- Foi. Achei que ele não me acompanhava mais no rejuvenescimento interior e exterior. Hoje eu sou como uma flor, a rebrotar.
-- Como assim?
-- Eu estou em contagem regressiva. Não faço mais anos há algum tempo. Volto dois ou três anos a cada semestre.
-- Sei. Entendi. Então, com quantos anos você está agora?
-- Acho que 28 ou 29. Parei de contar quando cheguei nos trinta.
-- Certo.
-- Quer dizer, não queria dizer, mas vou falar: completei 18 ontem.
-- Sério?
-- Seríssimo. Virei menina-moça!
-- Sei. Que bom.
-- E você?
-- Eu, pela certidão de nascimento, continuo com 72.
-- Nossa, tem idade para ser meu avô!
-- É. Fazer o quê? Sou das antigas, ainda sigo o calendário gregoriano.
-- Se eu fosse você, e vai aqui um conselho de amiga na flor da juventude, entrava na faca e remoçava uns trinta ou quarenta anos. Você ainda pode dar uma canja... É só se abrir para a vida.
-- Não, obrigado. Meu plano não cobre e eu vivo de aposentadoria do INSS.
-- Tadinho... Valeu pelo papo, mas eu tenho que ir. O Paulão, o salva-vidas do Posto 8, tem que me dar aulas de respiração boca na boca.
-- Claro. Foi bom te reencontrar.
-- Claro que foi. Mas não se anime. Não sou dessas sugar baby. Não preciso de daddy mais. Meu divórcio me deu independência total.
-- Parabéns. Valeu.
-- Fui. Beijinhos pra você!
Enquanto Jussara, na verdade agora Juju, se afastava o senhor septuagenário que o tempo procrastinou olha para o calçadão e revê, num delírio de sol a 48 graus, o sorveteiro oferecer Chicabon.
-- Me vê um e outro pra bombonzinho que se foi. Mas eu só tenho dez cruzeiros...

(Em homenagem a Nicole Kidman)

Acabou...

 Por Ronaldo Faria Acabou! Acabou o Carnaval, o sal da areia colado no corpo, o suor que escorreu entre perfumes falsos e tresloucados beijo...