Por Ronaldo Faria
A gentil Bixby desliga o
celular depois de perguntar docemente se era isso que Pafúncio queria. Era?
Talvez sim, talvez não. Mas ele disse que sim. E o aparelho silenciou. Por fim,
silêncio sepulcral. Pafúncio vivia num lugar tão longe e ermo que nem entregador
de aplicativo passava ali. Vez ou outra um pássaro perdido do bando resolvia
pousar numa árvore despetalada de lá. Mas era raro. Quase bizarro. Contudo,
Pafúncio não ligava para isso. O importante nesse instante era pensar em Maria,
amada que na sua fidalguia não dava espaço para em seu mundo vassalo entrar.
Como Pafúncio amava Maria, a
primeira na primazia e tardia na paixão... Na devassidão que a vida dá, entre a
calmaria e a orgia, lembrava de dias passados e travessias em rios, mares e
pinguelas. Se deliciava de noites entre lençóis e falsos sóis que despertavam o
casal para na madrugada se amar. E vinha a ele o sabor da saliva da amada, um
penetrar desbragado e louco, acariciar pleno de doidivanas tramas e ensandecidas
chamas. Tudo como Nostradamus, vidente que previa tudo de forma tão maluca e
insana que a tudo cabia sempre, teria dito: “Num continente qualquer, em
qualquer época do mundo um homem e uma mulher se amarão de tal forma e jeito que
nem o mais perfeito amor poderá traduzir”.
Um pedaço de unha que teima em
nascer no canto do dedo separado do todo lhe irrita sobremaneira. Com cortador
à mão, Pafúncio cata o pedaço ínfimo e infame e o corta. Apóstata de si, volta
às lembranças, andanças em dias de Carnaval, fugas em ruas pequenas onde se
esconde abaixado no carro para que Izak, judeu de quipá, quiçá não o visse.
Para ele, na imensidão que a solidão dá, o importante era viver o silêncio, a
discrepância atlântica entre dois continentes que a vida separa. Moldar
amarras, criar reentrâncias que possa caminhar e traçar. Pafúncio, no furdunço
da felicidade errática, pratica o lembrar que não o faz esquecer de que a vida
é também navegar contra a tormenta. Pensa em religar o celular, mas desiste.
Riste, em chiste, no ar existe apenas a pena de bater fora do bumbo que sua
escola esqueceu na avenida no descalabro de desfilar para um desfile sem par.
(Com o som de Aécio Flávio e Orquestra de Cordas num tributo ao Chico
Buarque)