Para onde levamos nossas
vidas? Ficamos no ensejo de sempre relembrar ou fizemos um caminho por outros
caminhos que nos rodearam em esquinas nas sinas e esperanças anchas de um
porvir? Achamos, perdemos, traduzimos errado emoções, porções e copos que se
davam nas mesas dos encontros e desencontros da vida? Talvez, ou não ou quem
sabe sim. Seguimos esquinas escuras e prematuras, fomos caímos e levantamos em vão
nos tantos vãos criados que pisamos. Sobrevivemos às escusas que o destino nos
dava, aos maiores poetas da alegria, aos famigerados contrários, aos corpos dos
amores que cheiravam a amor eterno e terno. Vivemos em noites e madrugadas arfadas
e infladas, inflamadas de paixão e tesão, decibéis e alcaloides. Fomos chamar o
insone Juca vários dias mesmo sem conhecê-lo ao vivo e a cores e, no desmazelo dos
encontros e desencontros que o tempo e o destempero nos dão, levantamos em dores
de cabeça no dia de depois para nos prepararmos para nova orgia. Descobrimos
que as cartas escritas a mão e cheias de saudade reprimida ou o telegrama de
frases curtas, mas rápido como a paixão, deixaram de existir. O instantâneo da
internet deixou um vácuo nas emoções das esperas, no abrir o envelope com borda
verde e amarela a crer que este trazia notícias além de qualquer alegoria
tardia.
Fomos jovens numa juventude
tardia. Nascidos muitos ou quase todos na metade do século passado, entre
parteiras, mães de primeiro amor ou na primazia da liberdade que pouco havia,
cumprimos um estágio entre a verdade plena e as mentiras que surgiram. Sínteses
de tormentos em que a tal liberdade era tolhida por fuzis e carabinas, torturas
e tortuosas mentiras, crescemos a esmo. Nos tornamos Nostradamus da esperança
de que tudo um dia acabaria, vimos nossas profecias chegarem de avião do outro
lado dos oceanos que dividem o planeta. Sorrimos, perseguimos nossos sonhos,
acordamos dos pesadelos, consagramos a hóstia com o sangue daqueles que lutaram
para o sol raiar em qualquer lugar. Juntamos, acasalamos, casamos, separamos,
refizemos tratos e troças, tivemos filhos, netos, fetos inconcebíveis, histórias
mil e até histriônicas. Mudamos de cidade, de espaços plenos, lugares. Alhures,
sequer lembrávamos que existia um lugar onde nos encontrar, seja no interior ou
no mar. Da bucólica Comendador Tórlogo Dauntre, perdida no bairro de nome
Cambuí, às pedras do Estácio ou da Lapa cariocas. E assim, ensimesmados ou
trôpegos de poesia e harmonias fora do quadrado, fomos buscar nossos caminhos
alinhavados. Por fim, como gatos, brincamos no novelo de lã que o destino, em
desatino ou sete vidas, sentenciou.
Que a vida ainda nos dê, hoje e sempre, como diz o poeta do samba Nelson Cavaquinho, carinho concreto, reto e certo e mão amiga...
