Por Ronaldo Faria
Pega a viola, cantador de mil
cantares, e segue a trilha que lhe foi traçada por qualquer santo
violeiro. Com todo o perdão de São
Gonçalo.
Pega a sílaba e forma versos e
trovas por toda a página branca, poeta catatônico de crer que ainda é possível criar
vidas de um sonhador.
Pega as lágrimas derramadas do
coração pouco e pede perdão, amante de histórias histriônicas e cheias de rios
a vazar água pra fora.
Pega suas preces largadas ao
léu por um céu qualquer, ser inebriado e embriagado de fé, e vai renascer no
sertão da secura que é verdade.
Pega as notas que invadem a
noite escura sem fim e vai se embriagar de poesia finda, senhorio de si mesmo
na pensão que a vida ainda dá.
Pega o astrolábio e a bússola
que mostram as rotas que a retidão finge dar e navega nas trevas e trovas, ancião
de caminhos sem início e fim.
Pega as cantigas antigas que
se fazem novas na notívaga chegança, criança renascida de cada loucura, e as
faz renovadas e lânguidas a brotar.
Pega no ar o cheiro de arruda
que se esvai no incenso que tenta ter senso qualquer na saudade da mulher desvairada
na saraivada da vida.
Pega o amor que se perdeu e redescobre
nos cobres que pagamos a cada dia para sobrevivermos no ermo à certeza na
felicidade utópica.
Pega os sermões da missa
inacabada e coloca na boca do padre a hóstia que mata a fome daquele que crê na
curva da estrada para se salvar.
Pega o rebanho que caminha
para a morte e se arrepende, muda de rota e o leva aos pastos onde nasce o mais
florido e carregado pé de amora.
Pega, por fim, o fim de tudo.
Faça que ele se refaça em trovas e trovões numa noite de luar rotundo. E se puder
ainda pegar algo, jogue tudo fora.
(Com Renato Teixeira, Pena Branca e Xavantinho)
