Por Ronaldo Faria
O violão se cala de tristeza
nas mãos do poema. E embaralha vozes e trovas nas covas entreabertas da
madrugada. Nas trevas, entravadas e entregues das ruas da Tijuca, o samba se
enturma nas coxas daquela que se atira ao dito ritmo. No rumo do poste rodeado
de insetos à busca de calor, o homem bambeia de lá pra cá e até dali por acolá.
A noite cauterizada ninguém vai calar. Nas pedras que se acolhem num nome
pomposo de paralelepípedo, retas e perpendiculares, onde pares pulam em festa, casais
caminham de mãos dadas. No céu há quem diga que vê fadas.
Mas o violão, calado e cansado
de tocar magia e sonoridade, está surdo e mudo. Catatônico feito o velho
nonagenário que bebe seu xarope tônico. Dicotômico, o poeta fica à espera da
quarta-feira para encher de dedos as páginas brancas, quase tântricas. Em cada
dedo existirá um pouco de letra perdida, sumida na cabeça que roda sem parar.
No automóvel que rompe o silêncio sepulcral que cala bocas e gestos, um ou
outro ser em descalabro e gelado porvir. No telhado, gatos espocam em gemidos
cálidos seus pulos de muro em muros. Na árvore as folhas despetalam em mil
talos.
O violão, porém, no contudo que só o entretanto se faz em toda a via, descansa num canto da sala. Falta-lhe as mãos que o encheram de brincadeiras e tons nas mais diversas tonalidades. As cores que teciam suas cordas de música e emoções viraram unções na dramaturgia que é a vida ao fechar as cortinas. No fim da estrada talvez um lampejo de morte ou angina. Com sorte, talvez lhe chegue uma consorte cheia de carinhos e aninhos. E acolha na colher da volta as estranhas entranhas do destino daquilo que tiver de ter sido. Na sombra do fim, nos resta em réstias só o olhar a ver-se fito.
