terça-feira, 22 de julho de 2025

Predestinação na procrastinação

Por Ronaldo Faria


-- Angélica, onde está você? Cadê aquele amor que invadia a madrugada e viajava pelos mais loucos lugares e camas desforradas como rosas defloradas no vento para o nosso alento? Que fim levou nosso amor? De herança ficou apenas essa infinita dor?
Wanderley, parado diante do sinal que piscava vermelho para o carro da cena parar, viajava na maionese própria, antípoda da felicidade. Amante que já fora arfante entre lençóis do antes de sóis, seu caminho era hoje um descaminho franzino. Pequeno diante das mágoas do mundo e gigante na solidão sempre a renascer, quase menina.
Andarilho de estribilhos, equilibrista de trilhos, mergulhava nas próprias palavras para tentar se fazer entender. No cerzir de atalhos, caminhava na busca de ser. Ébrio contumaz, pouco ou nada loquaz, vivia nos seus oceanos a tentar algum porto de continente qualquer alcançar. De bússola, seu soluçar. Logo ali, na esquina onde se escondia a próxima sina, a luz solidária do olhar perdido. No anhangá em todos nós, nós que se desatam na madrugada escura.
-- Angélica, em que deriva de maré a tua jangada se desfez e adernou na dor? E me deixou aqui, grumete de nenhuma viagem a buscar alguma galé. Aonde navegar? Em que tormenta naufragar? Talvez no mar infinito em díspares rotas de insensata imensidão.
Sabendo-se eterno catador de conchas tronchas e quebradas, com os pés da amada ali do lado, dança agora um fado. Sem par. Para Wanderley, o mundo é globo sem lei. Mas, talvez, a da gravidade exista na grave verdade do mar que não despenca universo a fora. E assim ele vai. Grandiloquente sem a trema que dava sabor à trama de escrever. Na taberna quente onde faz a verve verdadeira transpirar, suplica por sirenas, sereias ou até a sirene de ambulância que traga Angélica, mesmo estropiada e escalafobética, para sua parca fonética. Mas, como todo canto ou conto barroco, virou somente mais um escritor escroto para quem é aquele que não sabe sequer ler.

(A ouvir Vander Lee)

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