segunda-feira, 30 de junho de 2025

Na retórica histriônica da esotérica memória

 Por Ronaldo Faria


No subúrbio suburbano e atávico do maior amor primeiro entre trilhos de ferro, efêmeros projetos de vida, beijos lambidos e misturados de cuba libre e gim com tônica, vai José, pai de Jesus e que não penetrou Maria no barraco da comunidade antes do anjo, que era vapor da biqueira, avisar da chegada dos alemães. Aliás, soube também pela amada, cabrocha da escoa de samba do lugar, que era pai sem nunca ter sido. “Como assim”, teria dito à Maria. “Leia o Kamasutra antes de um monte de móvel criar”, teria ela respondido ao agora padrasto aflito.
A cerveja meio quente e outro tanto gelada do boteco incrustado no morro bastardo da cidade, que só era visitado na época da política encher de promessas o cartel de políticos safados, era o líquido que alimentava José, quase Josué se a vontade da tia carola tivesse se preservado. “Como assim ela foi a predestinada na Terra para trazer o Salvador?” A pergunta soou estranha para José Palavra Pouca. Na verdade, honrando seu nome dado pela vida, ficou calado. Melhor sem falar nada do que estar colado numa ribanceira de cara para as formigas comerem.
-- Seu João Português, traz mais duas do alambique pra mesa!
Presa de si mesmo, José fica batendo e rebatendo na sua cabeça tal coisa tão linda ou finda. “Vou ser pai sem ser de um cara que vem pra Terra e para o morro para salvar sem precisar mandar um salve geral todos nós!” A ideia, aos poucos que a loucura da bebida chegava e emergia de todo no todo, parecia até legal. “Tirando que no morro vão me chamar de corno, até que a notícia não é de todo ruim” – refletia sob o holofote forte que compensava o poste onde a lâmpada foi destruída para se testar um AK47.
Assim, desconexo da realidade ou da verdade, voltou para o barraco. E lá estava, escrava do seu destino, Maria com o filho do Criador que ela nunca viu e nem sequer na penetração gozou. “É esse o dono do morro, das biqueiras e do geral?”, perguntou José. “Acho que é ele, mas tem crescer”, respondeu Maria ainda com o cordão umbilical sem cortar. “Tudo bem. Corta essa porra de ligamento e vamos beber uma 51”.
Passaram-se anos. Muitos e dezenas de anos. Jesus cresceu nas vielas curtas e diminutas do morro e pregou desde cedo o seu proceder. Começou fogueteiro, virou olheiro no asfalto, vapor, segurança, contato com o exterior, contador da biqueira, chefe da quebrada, superior. Hoje, na mansão que se espraia na área de preservação florestal, destruída e tangida de histórias e hóstias que ele distribui de graça a cada domingo, malhadas, é o senhor do pedaço. Aliás, Senhor do Pedaço. Maria e José moram lá e sabem que o destino, mesmo que escrito em desatino, se fez. Afinal, dependesse do Estado a comunidade estaria tão bem? Aliás, ali ninguém passa fome, deve pro SPC ou tem parente nascido ou morto esquecido por ser. No novo livro do “novo testamento” sob a testemunha de homens e mulheres existentes e crentes sem lamento, Jesus é o unguento maior.
-- Se eu sou ateu? Qual é a sua, meu irmão? Aqui quem manda é Jesus! No resto, vais tomar nos seus cus...
 
(Ao som de João Bosco e ser carioca, com muito (imenso) amor)

Magos

 Por Ronaldo Faria Dois magos (homem e mulher, se é que em mago há sexo definido ao infinito) descansam na noite que brilha e dir-se-ia luna...