Por Ronaldo Faria
O derradeiro e último gole. O
que ele nos traz? Onde começa, lá no início, e termina como líquido numa terrina?
O que desfaz, apraz, liquefaz? Não sabemos. E isso é que faz dele o melhor, o
primórdio do passado, o futuro ineficaz, o presente da gente. Quem sabe, ávido
de se descobrir, não seja um descortinar do nosso mais fiel interior, aquele
que se esconde no recôndito que só serve pra culpar nosso viver num morrer que
chegará logo mais. Onde nada seremos, viveremos num inexistir de unguentos,
teclas digitadas em lamentos. Quiçá, nos queixaremos ao tempo ser tão rápido e
fugaz. E fugiremos de nós, brincaremos de alguma coisa qualquer, frigiremos
ovos numa panela suja e na fé, quem sabe até. Afinal, o final não cabe a nós,
entre óbitos e algum algoz.
Ele subiu o morro como quem
desce para um asfalto que inexiste. Presto, pôs os olhos a ver o tempo que se
foi. Disse oi àquele que sobe, prestimoso lembrou tempos de Borel. Ou, pensando
agora: “Quando a coisa é muito boa, falta a coragem de lutar”. Mas ele lutou, brigou
no trem, no ônibus, na desvariada andada sob o sol inclemente de uma zona norte,
torta ou prestes à própria sorte. Na atmosfera linear, a Lua Cris cruza o céu iluminada
e feito parecida a maçã. Mas ele continuou a subir o morro íngreme e disforme,
como fosse a forma mais certa de ser. Mas o que será o cercear de uma flor?
Ficará morta sem saber brotar ou far-se-á rosa para o mais fortuito amor? Roubada
de um quintal em ser. Nas cordas do violão, certamente brincará de essência e
ciência para o poeta arquitetar seu dissabor. Senão será somente semente a
florir num canto qualquer do ser sem lamento. E assim provar que o amor sempre
saberá vencer.
Saber colocar o último líquido
que sai e se esvai num copo sem deixar cair é coisa de prática de anos e vidas
de fragmentos perdidos e inusitados, fardos de histórias histriônicas ou patéticas,
verves de fragmentos que lotam a mente da gente como fossem passagens a se
liquefazerem em espumas e cores amarelas, fátuas certezas de que o momento é
agora, mesmo que em ágoras alguns gritem feito loucos iguais àquilo que somos. Zumbis
e soníferos mendicantes de algo que nos faça senhores de si, ao menos nos
pesadelos que chegam entre o negror e o alvorecer, vamos a brincar de ser. A
vida, solerte, rápida, única e saber-se-á que dará frutos que nem Maria-sem-vergonha
dá. E assim continuaremos, uníssonos, senhores de si, ensimesmados, fugazes,
bêbados e trêbados, iremos em dias e diásporas a viver o que nos resta a repetir
entre um alvorecer e um luar. Certamente, em algum lugar, viveremos nosso sonho
imaginário no torpor.
II
III
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