sábado, 29 de junho de 2024

Cavaleiro solitário

 Por Ronaldo Faria


O bar está fechado. Parece há tempo. Mas Hermínio não se dá por vencido. Enquanto houver uma sede por beber, beber-se-á. Afinal, como disse o presidente louco, se fosse sólido, comê-lo-ia. Afinal, para quem comia Eloá, o que viesse era lucro. E lucrar do nada já é um ganho a se fazer e parafrasear.
Mas os bares parecem que fecharam mais cedo, no enlevo do final de mais um ano. As pessoas, ao que parece, preferem se tornar misantropos, seres amorfos e trôpegos, quando o ano está para dar o último suspiro. Como o foi o derradeiro suspirar da filha amada num leito frio de alumínio.
Mas, afinal, para que servem os bares, esses espaços de lumiares e luminárias que se prestam para o garçom cobrar o devido pelas loucuras e angústias, augúrios, tragicomédias vespertinas para as anginas de gente que sobrevive na sobrevida que a chuva que vem com o Verão que se derrama na súbita trama?
Nas mesas que a volúpia da loucura traz para embriagar a saudade que nada mais traz do que os erros cometidos e tardios, vadios, banidos, os seres múltiplos e metamórficos se perfazem em presto no resto da sanidade atroz. No caixa, o sorridente Genésio nem lembra mais que já foi rima para mulher do vizinho.
Contudo, porém, o bar está cerrando as portas que não existem e molham os pés dos raros bebuns que ali resistiram e persistiram. A madrugada que daqui a pouco se tornará dia, torna o torno que cria novas formas numa fórmula molecular. E brinca de esquecer a vida, batuca na cuca e aconselha um “vá dormir”.
No mundo que parece se entreolhar, o segurança maior que o pé direito que se endireita no bar, mostra que é hora de “transitar”. Quem, na sã consciência que ainda resta e presta, pensará desigual? Estrada retomada, chapiscos de parede mortal a riscar os braços, abraços que não chegarão no dormir do então.
Sentimental, diríamos um quase débil mental, Hermínio, eflúvio como massa corpórea, chega ao lar. Lá fora, no aforismo que uma baleia nunca conseguirá engolir, o mundo persiste e insiste em inexistir. Quisera ele se chamar Jonas. Ao menos seria bíblico. No istmo da saudade, rio e mar esperam sobreviver antemão.

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