Por Ronaldo Faria
Devagar ele traz divagar
tardio e um ou outro cheiro de relva. Sobe no espaço em passo no descompasso que
os olhos ainda sabem enxergar. Prazenteia em estrela perdida no céu um escarcéu
que junta anjos, demônios, homens e mulheres, sinônimos de algo que em nada se
parece com Deus. Brinca e brinda a brincadeira da cantoria imaginária e lúdica
que trupica, mas não cai. No cais do mar revolto e distante, Anabela pragueja a
ausência de Cassimiro, casmurro e ausente há tempos, desde que foi no barco de
Altamiro na busca de lagosta e centavos minguados.
-- Amor, vai ser pouco tempo. É
tudo por nós, pra buscar nosso canto de encanto onde vamos ter uma ruma de filhotes
e pixotes.
-- Mas e se o barco virar e
você afundar pra sempre na imensidão?
-- Isso não vai acontecer. Reza
pra Nossa Senhora dos Bons Ventos. Ela há de nos guiar além-mar.
E assim ele zarpou, com
Ferreira e Zaqueu. Singraram ondas e marés, ventanias e calmarias. Viram
sereias, baleias e até Netuno, mesmo que esse tivesse aparecido soturno e noturno
depois de duas garrafas de pinga cada um. Caminharam em ondas cheias de branco,
oraram ao passado, tracejaram em bússolas e olhares para o Sol a melhor rota
para voltar e descobriram cardumes no ardume que os olhos estavam com tanta
secura. Amigos de infância, desses que juntam brincadeiras arteiras e
lembranças, resistiram à falta de ventos e prosseguiram na busca do aconchego. Maria,
Sebastiana e Mazé estavam em algum porto a esperar.
Assim, no fim que o porvir faz
por fim despontar, conseguiram voltar. Cansados, queimados de um sol inclemente
que os queimou mais do que queima toda gente, desembarcaram quase ausentes da
missão que tiveram de cumprir. E lá estavam elas, suas amadas e famélicas de amor, mulheres
por serem lembradas. Barbados, esturricados e sem vento para acarinhar, os três
se jogam na brincadeira que chamam de amar. No recôndito anacrônico de pau-a-pique, onde
apenas dois corpos podem se juntar, o trio de pescadores de desejos se esmera
em entregar seus corpos às cópulas do chegar. Naquilo que ainda carece de
rimar, o marejar de olhos no choro do prazer envolve vozes quietas e prestas a vociferar
o langor. Lá fora, bezerros berram pelas mães noutro pasto. O tempo agora é vasto.
(Com Paulo Matricó)

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