Por Ronaldo Faria
-- E aí, vai sair porrada ou não?
-- Tenham calma, isso é discussão besta! Ela é gostosa e ponto final!
-- Nem fodendo, vocês são homens ou não? Mete a mão ou a faca logo na cara!
-- Porra, vocês estavam bebendo de boa até Esmeralda aparecer!
-- Pega logo a garrafa vazia e quebra na cabeça dele!
-- Mulher é pra se admirar, não é para se matar!
E tantas frases mais ditas por apaziguadores e detratores. Malditas ou benditas frases. Tudo para que os amigos de bar virassem a mesa num trocar de socos e pontapés ou que voltassem a beber voláteis e unidos, em risos.
-- Se o cacete rolar geral, vou chamar a polícia! – gritou detrás do balcão o dono da birosca, Manoel do Benfica.
Acima da cena a lua surgia despretensiosa no céu e ciosa de que talvez visse seu prateado iluminar o vermelho de sangue a se esvair morro abaixo. Uma pomba trepava com outra à espera de um ninho de ovos a brotar. O cachorro da Dona Clemência latia desesperado com o gato do Seu Vicente que subiu no muro só pra sacanear. João Pires da Gama, que não era vascaíno, chegava do trabalho, cansado, e só queria tomar uma dose para relaxar. Lucrécia, sempre com raiva dos pais pelo nome infausto, seguia para a vendinha onde iria comprar o feijão da mistura noturna (se é que o resto do botijão ia conseguir cozinhar). Gastão, motorista do lotação, enxugava o suor de chofer a passar pelo local na direção da garagem do circular. Valtinho da Pindura, cujo nome já falava tudo, implorava outra pra pagar depois, quando a vida melhorasse. Assim, com a vida a seguir sua sentença e retidão, foi preciso que Esmeralda, vendo a cena que causara sem querer, resolvesse voltar e gritar alto, do alto da maior formosura do lugar.
-- Seus dois bostas, ouçam bem: sou pra casar, sim, quando eu assim decidir e quiser, e também pra ficar de bunda ao ar livre quando desejar. Mas isso porque eu decido o que quiser. Mas, pra vocês dois, bundas moles ao contrário da minha, não tem nem casamento e nem rola-rola na rola. Se eu precisasse de merda iria para o banheiro cagar! Tomem tento e jeito, arremedos de algo...
Dita a sentença, linda no seu requebrar natural que tanto chamara a atenção do mundo inteiro, ela voltou para casa, onde tinha muito mais o que fazer. Estarrecidos, macambúzios e sorumbáticos, perplexos e sem ação, os dois antes beligerantes voltam a se sentar nas cadeiras que serviriam de armas letais. Com riso amarelo nas bocas quase desdentadas, se olham e falam, quase uníssonos: “Seu Manoel, desce outra pra comemorar!” Na biqueira próxima o vapor desce com duas gramas que o bacana, que riu da cena, quer comprar. Do alto, a lua respira feliz por apenas servir de sentença para os poetas.

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