Por Ronaldo Faria
O bom da vida às vezes é sequer relembrar seja o que for que tiver de lembrar.
No rádio de galena à base de
gerador a gasolina, onde o som saía sei lá em que rotação, à luz de um lampião de
querosene que cheira inesquecível, a saudade de uma infância que hoje até parece
nunca ter existido. Do brincar com um carro de boi em que os sabugos de milho
compunham as parelhas de oito. E como era bom buscar na casa do milho, depois
de debulhar, aqueles que eram quase vermelhos, “bois” pintados. Como era felicidade
ter oito, cada um com seu nome, a correr nas trilhas feitas por pisadas na terra
calcinada e sem nada dar. Depois, um caminhão de madeira puxado com corda e
embalar pão a correr pela imensidão. Senão, o odor inebriante da bosta de gado,
das queimadas para fazer a vida rebrotar, do fogão de lenha a crepitar. Os
banhos de cuia, as cuias para o banho que foi aquecido nas chamas de vida morta,
a rede onde o corpo descobria que dormir sem pesadelo até que é bom (e como é),
O amanhecer do gado que pasta sem mundo, do galo cantando, do despertar entre
um gosto de achocolatado e leite de peito da vaca que nunca mais vi. Talvez,
até, do carro de boi de verdade com seu chiado a transpor as estradas cravadas
pelo suor de sertanejos que marcaram e demarcaram um universo paralelo, que até
hoje faz lembrar e chorar, coisa atávica e cravada numa eternidade que não há. Como
alguém nascido nos Anos 50 e meio preso na temática da alma do brasileiro que
se perdeu sabe-se além em que momento. Sem lamento, me resta apenas rever algo
que poucos viveram ou viverão (cada um com seu cada qual). Ou um lugar sem luz
elétrica, sem água corrente, sem “internet”, sem celular ou algo mais pode ser
lugar? Creiam e acreditem, do que existe hoje era bem melhor...
No bailar do mundo, faça-se apenas uma imortal vaquejada.
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