Por Ronaldo Faria
A despedida foi um beijo rápido,
quase iconolátrico. Desses que a gente dava nas esquinas dos Anos 70 de um
século atrás. Fosse na boca da amiga colorida ou do amigo da vida. Como certeza
do fim, a presteza bucólica que nem a cólica mais forte traz. Na mesa de
madeira, onde fórmica não há, o incrédulo crer que a noite irá amanhecer. Em volta,
a voltear num ir e vir sem sentido, o claustro onde as virgens do amor se
descobrem entre flores e pedidos de dor.
-- Truta, pra você é tudo
puta?
-- Qual é mano? Ficou doido
sem cheirar ou fumar? Nunca disse isso.
-- Esquece. Você não disse. Eu
sei. Mas não tem pra você uma que sirva?
-- Claro que tem. Mas ficou bem
pra trás. Se fosse de agora, talvez também fosse jamais.
-- Quer dizer que o que vira no
agora é foda demais?
-- Pode ser. Afinal, a gente
só conta à história que se faz, não aquela que não se fez.
-- Tá certo. Nessa resenha não
tinha mesmo que me meter.
Maurício do Cavaco e Leonardo da
Pulga estavam sentados tentando escrever o samba-enredo da escola querida.
-- Vale colocar na letra a
Verônica que fez a chapa esquentar?
-- Nem pensar. Isso é samba de
avenida, não é história de quem se tentou comer.
-- Tá certo. É preciso pensar
no enredo. Mas “Baile florido na maestria da Iemanjá do mundo corrido” não cabe
umas mulherada safada?
-- Não. Nosso corre tem de ser
longe do asfalto profano. Temos que pensar nas fantasias, nos carros alegóricos.
Você imagina um carro com a cara da Maria da Folia? Da Gracinha da Orgia? Das meninas
da casa da Dona Leontina? Não! Tem que ser coisa da vida da comunidade. Que
chegue pra qualquer idade ou jurado.
-- Cê tá certo. Pode crer.
-- Seu Manoel, manda mais umas
pingas pra abrir o nosso pensar! Põe na conta da escola! Quer dizer, se a gente
ganhar.
-- Você soube do Zé Meleca?
Xingou pra caralho um cara que nada tinha a ver com a dor dele. Só porque chegou
travado e pediu um café e o cara não tinha pra dar. E o tal carinha, coitado,
tinha acordado a acreditar que a vida tinha algo pra dar. Foi um monte de merda
que ele falou.
-- Esse Zé Meleca ainda vai
encontrar um cabeça quente que vai pipocar geral. Quem sabe assim, num pé de página,
ele não sai no jornal?
-- Mas ainda existe jornal?
-- Sei lá! Nunca comprei. No máximo
peguei emprestado de um miserável que não sabia ler.
Ambos os dois, como se falaria
na trama a se falar, escrevem no papel as rimas e as notas a se contar e cantar
na passarela.
-- Esse tal de Niemayer era brasileiro
pra fazer a passarela do samba?
-- Sei não. Deve ter sido um
gringo que queria comer nossas passistas e colou feito parasita no governador
que ganhou uns vários por cento na jogada.
-- É. Deve ter sido. Saravá e
Oxalá rima. Vamos meter no samba.
-- É nós. Tá posto!
-- Ô Manuel, larga a caneta
que dobra o pedido e traz umas geladas pra nós na manha.
No alto do morro, onde a lua
chega depressa, a pressa da dupla em encerrar a canção que pode explodir na
avenida, com povão e gente qualquer a cantar, vira necessidade primordial. O julgamento
da agremiação será logo perto, decerto e presto.
-- E aí, Pulga, você acha que
virou legal?
-- Sei lá, Cavaco. Agora é
entregar pra Deus e os santos na Terra. Se não der certo, no ano que vem vamos
tentar outra vez.
-- Aí você acha que cabe a Verônica?
-- Puta que pariu. Tu vidrou
nessa preta!
-- É que você não sabe o
cheiro que ela exala. É coisa de Exu, Pomba-Gira e o que tiver de ser.
-- Vamos crer que esse ano vai
virar. Se não for, vamos descer a Sapucaí na mesma treta.
-- Com certeza. É botar fé em
quem ganhar. O importante é a escola arrebentar!
--Manoelito, manda outras e
algumas. Na ruma e na rima que brota de nós, alguma truta ainda vai fisgar
nossos anzóis.
-- Caralho, puta frase. É nós!
Põe no samba de 2025. Com esse a gente vai ganhar!
(Com Evandro Fióti)
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