Por Ronaldo Faria
Um copo no balcão a pedir
mais. No sorriso solto e embriagado, um fardo a seguir. O afago do tempo, feito
pimentinha a cobrir pedaços de pé de porco que descem a dentro para o sempre. Um
canto de cidade em seu centro onde o cantar não entoa mais. Loucos e bêbados se
sobressaem nos ônibus que chegam e vão no vão que se esvai entre esgotos e
torpes ébrios soltos a brincarem de cair e levantar. Um gole a mais, camiseta
de proveta a nascer de uma amizade entre goles e golfadas. A lua, do alto, sem
saber se é cheia ou nascente, se faz pungente e emerge para iluminar o último
urinar no banheiro de todos e de ninguém.
Um copo a buscar o derradeiro gole no fole da embriaguez que se transforma em música e cantar no entardecer de descobertas e cobertas jogadas ao chão para receber os corpos dos amantes desnudos de prazer e ilusão. No chão, o frio que percorre o lugar se desfaz entre águas jogadas de esguicho e mijo. Lá fora toda cruz se perfaz de milagre a versejar poemas e fonemas sem exatidão qualquer. Um adeus logo se fará e lágrimas vão cair no porvir do sempre virá. A voar, o passado encarnado de doenças, cânceres e redescobertas. No levar ao quadrado igual, um nó desatado sem saber sequer se um dia irá de novo juntar os dois no solar.
Um copo e um pingente de
espírito santo no pescoço da esteta. Em sânscrito, o embriagado poeta tece
poemas como se fosse o futuro um único manto. Entre um mercado de cheiros e
pesos, na lânguida e ávida saudade da volta, homens e mulheres se travestem de
alegrias e mimos para voltarem para casa, onde a tristeza os espera para
recebê-los incongruentes e tementes da solidão. No mesmo lugar, as mesmas
desmazelas e o finito prato no fogão. Em algum ponto do planeta haverá certezas
e unção. Senão, valeu apenas ter sido, como um suicídio que a gente cria e
desfaz a cada novo raiar de sol a desenrolar tramas, incertezas e orgia.