Por Ronaldo Faria
Na avenida o samba já nem se
lembra que desfilou e fez a alegria da passista e do compositor. Para ela
vieram os desejos carnais de tantos carnavais, para ele a cantoria de milhares
de vozes vorazes em si como vestais a cantarem os versos desiguais.
-- Jerônimo, homônimo heteronômico
fugaz, vale a pena achar que os carnavais do passado foram a verdadeira
delicadeza?
-- Sei lá... Ou melhor, sei.
Um deles ao menos foi. Mas só um, que permanece vivo no eterno relembrar.
Fevereiro de algum ano do
Século XX, vinte para quem faltou nas aulas de números romanos. Jerônimo, a
amada e outros interlocutores anônimos para a prosa brincavam no salão. Antes,
ambos estavam na avenida. Logo mais estarão na cama, a brincar de fim de folia,
a fazerem a cama correr os poucos metros quadrados e enquadrados no depois e
após apócrifo do senão. Tudo começava na parede e parava na porta, como querendo
sair sala a fora, abrir um portão, descer escadaria e se largar na rua que descia
para encontrar a avenida.
-- Foi bom esse Carnaval?
-- Como assim? Quer que o
paraíso se perpetue?
Claro que Camila, personagem
essencial para se entender a história, queria. Mas havia realidade e passado, a
fatalidade tardia, tríade de rebentos que já não chorava pelos peitos mas prendia
desejos e carências infindos, pendia entre o desejo de ser feliz e a obrigação de
fazer outrem feliz.
-- Vamos simplesmente viver?
No estupor do momento o
silêncio e o lamento da vida se fazem notícia de jornal na voz de Camila. No
final de qualquer coisa,,metros e metros quadrados, guardados na lembrança
que não se esvai.
-- Está lembrando o que, Jerônimo?
-- Nem eu sei. Talvez fosse
melhor esquecer de vez. Mas como seguir adiante se não houver algo a lembrar, a
nos mostrar que a tal felicidade existe de fato, mesmo sem ser unanimidade? E se
por um momento fátuo, inócuo, fizemos parte dessa minoria? Se pudemos de uma
forma efêmera, macho e fêmea, acharmos que fomos felizes?
-- Talvez você tenha razão. Mas
de que vale a razão de antemão? Afinal, mil e tantas variantes existem entre um
início, o meio desatinado e o pseudo fim?
-- É, afinal o que é a razão?
Mero e destrambelhado tesão? Um slow
motion do passado arfado e calado em si? Sorrisos e afagos que dançaram de
forró a fado? Fatalidade de duas vidas cruzadas em teclas e teclados, separadas
na esquina fatídica do não...
Na décima e algo se saberá de que os amigos exaustos de quererem encontrar respostas para a vida se entregam à
saideira. Nessa hora a certeza do fim derreou, o momento já não há, o tormento
do amanhã vira deletéria imprecisão. Das tantas caixas de um acústico sonoro surge
a noite enfim. Logo mais o caminhão de lixo surgirá para carregar recicláveis e
emoções do passado.
(Com Celso Fonseca a rolar)
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