Por Ronaldo Faria
Repetir o erro por repetir. Mas, não fosse tal erro, de que valeria
viver?
Felisberto, esperto e presto a
entender os ditames da vida, feito fosse mero robô na roubada entre recarregar
as baterias ou murchar de vez, espera que o sono insone seja um trombone a soar
nos ouvidos. E o acorde a querer correr entre um tropel de cavalgaduras humanas
ou seguir alijado às lajes e cordas da rua, submerso nos seus mares deflagrados
e amargos. Afagos, só das mãos em gozo subliminar e infiel à solidão.
Felisberto, ser imberbe e ignóbil
corpo a latejar e rastejar na terra viva, vai a dedilhar teclas onde asseclas
do bem-viver pregoam a imensidão. Na canção que percorre beijos ternos, a fuga
dos eternos caminhos que o descaminho há muito traçou. Na caça que pede que a
pele pare de morrer, esturricar, desaparecer, o grito de espera a acreditar que
a morte trará, por fim, a entrega que a trégua da certa loucura não deixa tragar.
Felisberto, na concretude
frágil que os tijolos do pensar dão, vai minuto a minuto a descer e subir na
ladeira que o tempo faz. E se desfaz inócuo e loquaz. Ele sabe que a vida já
lhe fez incrédulo e cego para dias em versos e reversos. O marasmo continuará a
lhe deitar ao lado de um corpo inerte e que nada transpira ou inspira. Seu
universo hoje se restringe ao timbre da saudade que sequer fluía uma sílaba
além da verve efeméride canina.
Felisberto, peito aberto e
incerto, rasgado de prolixa e finda arritmia, é apenas pena arrancada de um
pássaro recém-nascido que deve ter morrido no canteiro a ser exterminado. Ao
menos, pensa agora, o olho começa a piscar de nervoso. “Deve ser o mínimo de
humanidade que há meses vivi.” No passado grandiloquente, repetido talvez,
meses de poucos dias que tracejam a certeza de que há felicidade, seja rápida e
efêmera no corpo da fêmea.
Felisberto, desperto em si e
esperto ao tempo que se esvai no vaivém fugaz, pede apenas que a cena do teatro
não termine com plateia vazia. Todo artista espera ao menos um aplauso ao acaso
cansado da vida. Na perfídia efêmera da partida certa o que resta é festança
que as noites sertanejas de fogueira e cheiro de lampião no querosene que foge
para o ar a brincar de cor cinza. No jogral da sina, alguém goza a trepar enlouquecida
por cima.
Felisberto, analfabeto e
carente de afeto, como feto a comer as sobras da mãe famélica, apenas sabe que
o hoje é o anteparo que o amanhã trará em remissão e visão de sempre a rotina
cretina retomar. No mar, o ar que a maré e a maresia trazem na tradução
espontânea e terna que a pele, na sua mais cutânea essência, não sabe traduzir.
No vapor que a dor faz em eflúvio, a fugidia maestria de mentir a si mesmo que a
estrela brilha no além.
Queria hoje estar a comer um meia-lua e mudar o destino ao desatino
qualquer...
(No som do Zeca Baleiro)
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