quarta-feira, 23 de abril de 2025

Perguntinhas tacanhas e tontas

 Por Ronaldo Faria


A trágica realidade do derradeiro pulsar? A sentença da perfídia que qualquer clamídia traz? A incerteza trágica do vangloriar por nada conquistar? E a pipoca do colégio na Tijuca, como comprar sem ter grana, saber-se-á qual seja ela? E tem o pirulito do Zorro, a bala assassina Soft, o chocolate comprado antes de pagar o barbeiro e quase levar a sova única que era, talvez, melhor do que o olhar severo. Mas e a parede que se abriu para nos levar no berço do quarto do casal casual? Foi sonho? Se o tivesse sido, por que permanece vivo até hoje? Saber-se-á. Saberemos um dia, no acolá. Agora, prestes a lembrar que apertei a mão de Luís Carlos Prestes no auditório da PUC, formato da formatura sem fotos ou gramaturas. Se muito a brisa no apartamento de Ipanema em meio a entremeios fugazes. Depois, cada um com seu cada qual infame ou não como inhame que brota do chão. Assim, por fim, de saudades e efemérides casuísticas e cáusticas, vivamos cantigas de paz.  Afinal, que tempo diferente era esse há quase 70 anos? Pra nós, quase 50. Com certeza um tempo de cartas demoradas, talvez um telegrama fugaz, um telefonema de fichas às dezenas a pingar no aparelho maldito, a incerteza célere de momentos felizes, como diria o poeta maior, no penar. E como saberíamos que agora viajamos pelo universo do verso em devaneios bêbados sem destilados tragados? Tempo, senhor da vida, nos traga o trago ensandecido que, como diz a música, já sabemos que descolorirá...

terça-feira, 22 de abril de 2025

O blues elétrico em estado puro*

Por Edmilson Siqueira


"The Super, Super Blues Band" é um álbum que reúne três lendas do blues de Chicago: Bo Diddley, Muddy Waters e Howlin’ Wolf. A proposta era simples, mas ambiciosa: juntar três dos maiores nomes do gênero para uma sessão de blues incendiária, recheada de improvisos, trocas de provocações musicais e uma química sonora inigualável. O resultado? Um disco, lançado em 1967, que se tornou um clássico do blues elétrico, capturando a essência do gênero com energia e espontaneidade.
Na década de 1960, o blues passava por uma transformação. Enquanto o rock absorvia sua essência e a cultura jovem se voltava para novas sonoridades, os grandes nomes do blues tentavam se manter relevantes. Chess Records, gravadora fundamental para blues elétrico, resolveu apostar em projetos que reuniam seus maiores artistas para atrair a atenção do público e não perder de goleada para as bandas de rock que surgiam e estavam dominando as paradas.
O produtor Marshall Chess teve a ideia de ressuscitar uma outra ideia, baseada no sucesso do álbum Super Blues (1967), com Muddy Waters, Bo Diddley e Little Walter. A proposta era repetir a fórmula, mas substituindo Little Walter por Howlin’ Wolf, um dos mais carismáticos e intensos vocalistas do blues. Era um encontro delicado, pois Waters e Wolf eram conhecidos por sua rivalidade dentro da Chess Records, o que prometia ou elevar ainda mais o nível das gravações ou...
O resultado é que o álbum é um verdadeiro campo de batalha sonoro, como afirmam os críticos. As faixas, quase todas reinterpretações de clássicos do blues, são conduzidas por um instrumental pulsante e pelo duelo vocal entre Howlin’ Wolf e Muddy Waters, com Bo Diddley adicionando sua marca registrada no ritmo.
A primeira faixa, "Long Distance Call" (McKinley Morganfield), já define o tom do disco. Waters, com seu vocal melancólico e guitarra característica, se contrapõe à rouquidão poderosa de Howlin’ Wolf, enquanto a batida de Bo Diddley adiciona um som hipnótico. "Ooh Baby/Wrecking My Love Life" (Ellas McDaniel e Clifton James e Kay McDaniel), a segunda faixa, segue a mesma linha, explorando os vocais intensos e guitarras vibrantes.


 
"Sweet Little Angel" (Robert McCollum) é daqueles blues onde a guitarra e o piano se divertem enquanto o cantor sofre expondo seus amores e sofrimentos. Um prato cheio para os amantes do gênero.
"Spoonful" (Willie Dixon), outro hino do blues, apresenta uma interpretação visceral, onde Wolf praticamente rosna as letras, enquanto Waters responde com sua voz lamuriosa.
A quinta faixa é "Diddley Daddy" (Ellas McDaniel e Harvey Fuqua) e é a amostra eloquente de os roqueiros dos anos 60 nasceram todos apaixonados pelos blues.
"The Red Rooster" (Willie Dixon), um dos maiores clássicos de Howlin’ Wolf, ganha uma nova versão com a participação de Muddy Waters, transformando a música em uma conversa acalorada entre os dois. 
Por fim, o disco traz uma versão de "Goin’ Down Slow" (James B. Oden), onde os três músicos se revezam nos vocais, construindo um clima de tensão e emoção que é amplificado pelo poderoso instrumental.
Apesar de ser um álbum de jam sessions e improvisos, "The Super, Super Blues Band" conseguiu capturar a essência do blues de Chicago, reforçando a importância de seus três protagonistas. A reunião de Waters, Wolf e Diddley gerou um registro que, mesmo sem grandes inovações, tem um valor histórico imenso.
O álbum também se tornou um marco na carreira dos três músicos. Muddy Waters continuou sua trajetória influenciando o blues-rock, sendo regravado por bandas como The Rolling Stones e Led Zeppelin. Howlin’ Wolf manteve sua posição de gigante do blues, e Bo Diddley seguiu deixando sua marca no ritmo e na guitarra elétrica.
Com o tempo, "The Super, Super Blues Band" ganhou status de culto, sendo lembrado como um dos últimos encontros de titãs do blues em sua forma mais pura. O disco é uma celebração do gênero e uma amostra da energia inesgotável desses três mestres. Para quem busca entender o blues em sua essência, este álbum é uma audição obrigatória.
Howllin" Wolf morreu em 1976; Muddy Waters em 1983 e Bo Diddley em 2008.
O disco pode ser comprado nos bons sites do ramo e o preço é meio salgado. E pode ser ouvido na íntegra no YouTube em https://www.youtube.com/watch?v=UKOFN4Ky7UM&list=PL1_xC3Lcwoh5fC9-R0oJ__OFhYHeUGDHo .
 
*A pesquisa para este artigo foi auxiliada pela IA do ChatGPT.

segunda-feira, 21 de abril de 2025

À Rita eterna Lee e tantos mais

 Por Ronaldo Faria


-- Se a Rita Lee estivesse aqui, o que ela faria?
-- Ronaldo, isso é pergunta a se fazer?
Porra, surge Toquinho a tocar.
-- E se Vinicius de Moraes estivesse vivo?
-- Aí seria o paraíso em Terra!
-- E se Adoniran estivesse aqui?
-- Nesse caso seria sacanagem para virar eternidade de bar.
 
Num canto qualquer, a presença constante da mulher amada, forma da fórmula que o receituário do farmacêutico terapêutico não traduz em luz. Aquela dos lábios mordidos, ardidos, lambidos, traduzidos em coqueirais desvanecidos à negação de uma dancinha de Vanderléa. Compêndio urdido em separações forjadas e unções promulgadas e devastadas faça-se na alforria da vida os grilhões que é se viver. Por um triz a cada respirar fortuito e quem sabe último, o importante, como diz o porteiro de café matinal, é acordar. E quiçá, ser feliz.
 
-- E se o Toquinho não tivesse pisado na bola?
-- Mas qual bola? Tudo no fim não vira a mesma merda?
-- Infelizmente. Parece que sim...
-- Então é o passado que conta?
-- Parece que sim.
 
Daqui, enfornado num canto quadrilátero, o poeta, profético, profilático e hermético, vai a crer que num asilo nascido na nascença, como disse Cazuza, tudo se resolverá enfim.

sábado, 19 de abril de 2025

Trovadores urbanos

 Por Ronaldo Faria


O lampião de gás mal ilumina a calçada em que está. Nela, casais voltam do cinema com ódio dos lanterninhas a irritarem e evitarem o primeiro beijo fortuito roubado. Mas, agora, defronte do portão, ninguém impedirá os lábios de se tocarem. Porém, como um sortilégio do destino, a mãe espera quase de véspera a moçoila chegar.
-- Gabriela! Já pra dentro!
A menina quase mulher feita de todo, obedece a matriarca. O jovem, rapaz que ainda irá demorar a virar um homem inteiro, sai de fininho do lugar. Ele sabe que é hora de esperar. A boca de Gabriela ainda lhe voltará ofegante a chegar. De tantos dias que faltam para a vida virar, é certo que isso acontecerá.
Na rua, chorões tocam para a amada que, deitada na cama com lençol de cetim, sonha em ser como as mulheres que se escondem na casa de luzes vermelhas e sons de vitrola de 86 rotações esganiçada e real. No poste prostrado até que a rua vire avenida e seja derrubado, o cachorro vira-lata urina um mijo quente e fortuito. No boteco perto, amigos se embriagam em tragos homéricos. Logo, em périplo, seguirão para suas casas. Todos soturnos e macambúzios chegarão decerto nalgum lugar. Sobre eles, um utópico e róseo luar. Talvez a estrada que trilhamos, mas nunca conseguiremos findar. Ao meio dela haverá um coração que irá parar, uma poesia taciturna que não findará, um amanhecer que chegará sem o respirar. No largar do tempo, o lagar fugidio e misterioso que as respostas que fazemos no “se fosse diferente” não têm respostas postas.
-- Gabriela, te amo!
O grito, entre quatro paredes, paradoxo da paixão, surge surdo para aquela que se deseja. Mas ela saberá do que foi dito e redito. Famigerado e esfomeado de línguas e cuspes que adentram a garganta infanta, o poeta ouve o tango cantado de um paulistano que ouvimos sem saber o destinatário real. Sem olvidarmos o mal, translúcidos e lúcidos ao dia que logo irá raiar sem muito a dizer ou virar, ficamos à espera de um alvorecer disseminado de lampejos de canções.

quinta-feira, 17 de abril de 2025

Sem remediar o futuro

 Por Ronaldo Faria


-- Reduzi o remédio do tédio ao meio. Descobri que ele atacava o fígado. Pode um fármaco ser tão famigerado?
-- Não, não pode.
Quase de bode, Belisário, emissário de si mesmo, concorda com tudo que ainda o faz acordar. De acordo com as premissas que nem o padre consegue dissecar na missa, segue impoluto. Um mero puto, diriam.
-- Lembrar do Leblon, do Méier, da Tijuca, das desventuras e bem-aventuranças do passado é um erro?
-- Acho que não. Mas quem sou eu, um não-sonhador, para responder?
Cheio de nenhuma resposta e postas de peixe que nunca chegaram para ele comer, Belisário é apenas uma pena volátil que cai do céu onde nunca saberemos o fim. O pássaro que a largou em pleno voo poderá ser uma mera pomba pública e voraz ou um beija-flor no seu parar de asas a rimar poesia e fútil cruz.
-- Amanhã será já sabemos como. Mas fugir do seu destino em desatino é muita covardia?
-- Essa eu sei responder. É!
Menino e solitário, no sacrário que o destino concebeu, Belisário permanece concebido e enternecido, renascido, no silêncio que a noite traz. O que lhe apraz? Pouco ou nada. Rouco quando redescobre a alegria de viver nas mesas de bar, cercado de gente que à pena ser, seu caminho é um desritmado surgir de tempos em tempos, transversos caminhos fúteis, famigerados e famélicos aninhos entre os seios da amada, a acordar na madrugada para fazer a cama, enlouquecida, viajar e rodar no quarto.
-- O amor pode resistir à distância, mesmo que ela esteja perto?
-- Com certeza. Na frieza da realidade, a fugidia ternura dormirá retinta de sangue que o coração apaixonado ainda tinge a cada madrugada vadia.
Depois de tal explicação, Belisário, arcaico senhor de suas saudades suadas e ímpias, entre lagoa de sapos e porres de vodka nas ondas do mar, se submete à vida. Logo mais dormirá, terá pesadelos, anginas, prazeres refeitos. Será, enfim, um ser normal. No local, ninguém, em sã consciência, dará aval.

terça-feira, 15 de abril de 2025

No arco-íris irado

 Por Ronaldo Faria

 


Branco no preto ou preto no branco? Tanto faz! Na efeméride das cores apenas o amor se faz. E se algo se perfaz no infinito painel de cores que percorrem quem vive entre a sanidade e o Pinel, faça-se ou foda-se!
 
Gerúndio (esse foi o nome que o pai colocou na criança por achar bonito) acordou na madrugada se perfazendo de acolhimento e sentimento. “Quem sonha com jumento joga no burro?” – pensou. Na rua – o apartamento (apertamento para a realidade) ficava no primeiro andar de uma avenida barulhenta e poluída – os carros voavam colados no asfalto. Volta e meia, meia na volta, um ônibus parava no ponto para despejar trabalhadores cansados e suados na busca de tentar reviver. Entre seres de luzes ofuscados na fumaça do cigarro e falácias que o profano enaltece nas sentenças efêmeras da vida, Gerúndio vai tentar esquentar o arroz de três dias passados com um ovo sabe-se lá de quando. “Como diria o poeta, não põe no meu. Coloca no do Abreu”. A fome há de passar, mas e a saudade? A maldade da outra, louca, a desvanecer seu amor numa esquina qualquer como toda e qualquer mulher? A quimera que vira via transversal e letal para quem só sabe amar à beira-mar, onde irá? Gerúndio, estupefato e banal, no jazigo ainda vivo que não tem nem sete palmos acima das pedras portuguesas, faz o prenúncio do prepúcio rasgado e refeito de amor. A ouvir Karnak, vira senhor da língua russa e escreve em cirílico que o lírio é o surgir de vida na mais morta terra escavada. Veste um escafandro e desce milhares de metros no mar do próprio desejo. Seu ensejo é viver nos olhos verdes que a sina joga aos seus sonhos encerrados. Num canto, esquecida, a enceradeira quer apenas voltar aos anos 50/60 do século passado para se sentir parte do todo e não pedaço do acaso.
 
II
 
O camelô garante que o produto tem procedência e decência. Se habla paraguaio ou diz que “china é podutro garantido”, saber-se-á. Também, pelo preço que está, tanto faz. Logo juntou uma ruma de pobres de grana, mas ricos de espírito, para comprar as imagens dos santos de umbanda. Logo ali uma banda de forró forra de sons e barulho o lugar. Na tevê passa o jogo que serve de preliminar para o Flamengo jogar. Felisberto, aberto a tudo que perto puder chegar, grita alto que se não comprar agora só no Natal. “Freguês, ainda estamos em abril. Se abrir o bolso agora você garante que não irá se levantar da cama em novembro! Só não aproveita quem for funcionário público com décimo-quarto salário na conta!” De raiva, homens e mulheres jogados às traças da vida, como jornais velhos e amarelados, fadados ao lixo, correm para a banca. Às portas das poluídas e brancas águas turvas da Baía da Guanabara, a sofrida realidade passeia em subterfúgios que os refúgios da tristeza fazem surgir. Assim, de centavos em centavos que não mais existem no mercado, os minutos vão passando deveras em esferas longevas. Talvez um poeta perdido, um ébrio calcinado, um ser fugido de algum hospício ainda entendam as ínfimas vendas. Sob vendas que escondem um centímetro além da escuridão, o vento faz voar as pétalas que a roseira já morta despeja no chão.

domingo, 13 de abril de 2025

Miles Davis, Gil Evans e uma obra prima

 Por Edmilson Siqueira*


"Sketches of Spain" foi lançado em 1960 e é um dos álbuns mais inovadores da carreira de Miles Davis, não fosse um trabalho conjunto com outro gênio, o pianista e arranjador Gil Evans. Pois o disco transcende as fronteiras do jazz tradicional e adentra a elementos da música clássica e do folclore espanhol. Esse projeto ambicioso demonstra não apenas a versatilidade de Davis, mas também sua disposição em explorar novas sonoridades e expandir os limites do gênero.
A peça central do álbum é o famoso "Concierto de Aranjuez" (Adagio), uma adaptação da obra do compositor espanhol Joaquín Rodrigo. Davis e Evans transformam essa peça clássica para violão e orquestra em um espetáculo a parte, mantendo sua melancolia original, mas adicionando novas emoções através do trompete expressivo de Miles. O resultado é uma interpretação de tirar o fôlego, que se tornou um dos momentos mais icônicos do jazz orquestral.
Além de "Concierto de Aranjuez", o álbum conta com outras faixas igualmente marcantes, como "Will o' the Wisp", baseada em uma peça de Manuel de Falla, e "Saeta", inspirada nos cantos religiosos da Semana Santa espanhola. "The Pan Piper" e "Solea" também se destacam, refletindo o fascínio de Davis pela música flamenca e sua capacidade de traduzir sua essência para um contexto jazzístico.



A colaboração entre Davis e Evans, já consolidada em álbuns anteriores como "Miles Ahead" (1957) e "Porgy and Bess" (1958), atinge em "Sketches of Spain" um nível de sofisticação impressionante. Os arranjos orquestrais de Evans conferem uma riqueza harmônica e tímbrica que contrasta com a abordagem mais econômica e introspectiva do trompete de Davis. O diálogo entre esses dois elementos cria uma experiência auditiva única e envolvente.
Embora "Sketches of Spain" tenha sido recebido com alguma resistência por puristas do jazz, que o viam como uma incursão excessiva na música clássica, o álbum acabou sendo reconhecido como uma das obras mais ousadas e inspiradoras de Miles Davis. Sua influência transcende o jazz, impactando músicos de diferentes gêneros e consolidando Davis como um artista inovador e inquieto.
Com sua fusão magistral de estilos e atmosferas, "Sketches of Spain" permanece como um testemunho do gênio criativo de Miles Davis e de sua capacidade de reinventar-se continuamente. Se o jazz é uma linguagem em constante evolução, este álbum é uma de suas declarações mais poéticas e atemporais.
O disco pode ser ouvido na íntegra no YouTube em https://www.youtube.com/watch?v=bJvu-6H8Pgo&list=OLAK5uy_l9dLGs_e3_u31Tf599Vrnwsg95JxPkr_Y&index=2 e pode ser comprado nos bons sites do ramo.
 
*A pesquisa para este artigo foi auxiliada pela IA do ChatGPT. 

sexta-feira, 11 de abril de 2025

A lua rosa

 Por Ronaldo Faria


-- Você viu a lua rosa?
-- Qual?
-- A lua rosa, cheia, mas da mesma cor. Branca.
-- Por acaso, não. Não tenho tempo de olhar para o céu.
No palco inexato da paródia, como um paradoxo ácido e ávido de ser algo real, os dois traziam a verborragia dos bêbados à cena ideal. Letal, a cachaça descia tardia pela Rua do Lavradio. Pelos paralelepípedos, em epíteto trágico e volátil das palavras, escorria o verbo do verso no esgoto cercado de lodo. Um louco vaticinava o cenário que a cidade desbravava. Um grupo de idosos descia tempo a fora com suas bengalas e passados em passadas curtas. Uma pomba cagava sobre o carro importado sem se importar com a pintura cristalina. Uma ou outra nuvem iluminava o rosto da jovem anuviada pelo amor perdido e perfeito. No vazio de um peito atormentado, dentadas de bocas banguelas comiam o resto de farofa que o restaurante de luxo jogava no lixo. Nos lábios molhados e sedentos dos amantes púberes, a plúmbea lua rasgava as nuvens que se misturavam cinzas e límpidas. Em alguma nau catarineta o poeta marginal buscava o que rimar com ...
 
II
 
O carro supersônico e atômico do super-herói percorre a cidade. Precoce ao crime que ainda não aconteceu, o homem de uniforme desforme e amarrotado arrota a cerveja que tomou na caverna que é seu esconderijo. Rijo, riste, risível e errôneo, erra de mão na esquina e quase bate na contramão o automóvel no poste onde a luz há muito queimou. Dá a volta e liga o turbo. Do seu veículo sai uma labareda imensa de fogo amarelo, verde e azul. “Colocaram gasolina batizada”, pensa ao ver a fumaça cinza que sobe também. “Nunca mais deixo o Alfred levar no posto perto de casa”, sentencia. Mas o bandido, cruel e covarde, desses que ri da morte e zomba da justiça, certamente estará com uma donzela sem zelo para mal fazer. “Aguarde-me (ele falava o português correto), Miriam Lane”, sem saber que estava a invadir a história de outro herói interplanetário. Acelera o carro e o velocímetro marca 150, 180, 200, 270, 300 quilômetros. “Faltam agora só alguns metros”, vaticinava. Seu erro foi passar numa blitz da polícia militar. Teve de parar o carro e soprar o bafômetro. “Seu esquisitão, desce do veículo, mostra a carteira e fica na boa pra não ter sacode-iaiá” – disse o PM pragmático. Foi enquadrado por velocidade acima do autorizado, usar roupa estranha fora de época, falta de documentação e pagamento do IPVA, além de estar acima do nível alcoólico permitido. “Tu vai conversar com o delegado, otário. Só pode ter fumado um baseado pra esquecer que o Carnaval foi em fevereiro”, exclama o policial.
Como, raro leitor? O que aconteceu com Miriam Lane? O chá de bebê dela e do Pinguim está marcado para o próximo mês. Eles pedem, encarecidamente, por fraldas descartáveis. O super-homem, que poderia salvar a trama,  estava de férias em Andrômeda e não ouviu os gritos da ex-amada do morcego que descansava em Bangu 8.

quarta-feira, 9 de abril de 2025

A Cazuzar

 Por Ronaldo Faria


Na Zona Sul, depois que o azul do céu já deixou o lugar, bêbados, sonhadores, fumeiros, poetas, profetas e milagreiros infestam o Baixo Leblon. Talvez um desabrigado de tetos, o saudoso de tetas, desafetos da vida, batalhão de auto-homicidas (se é assim que se escreve) ou suicidas. Pouco importa. Na porta fechada ninguém bate. E coração estraçalhado não se abre.
Ps.: coloque-se tudo acima no feminino e tudo que todes podem ser...
A ver as ondas reverberarem o barulho de espumas e mares ou marés, José e Kátia, catadores de sílabas e sons, solidões e tons, seguem a pisar a noite em grãos de areia e infinitas saudades. As maldades ficaram bem atrás, num mundo que ninguém mais traz. Sonhar? Saber-se-á. No raiar do amanhã, no afã de querer estar noutro lugar, talvez ambos ainda percorram os muitos bares que o bairro dá. O cheiro de brisa que vem do oceano e dos cigarros ciganos é só o que faz as luzes dos postes prostrar a solidão. Na imensidão que posterga o fim logo ali na frente, o infame drama daqueles que buscam a sensação de poder ser. Na Avenida Delfin Moreira, o definhado mendigo pede trocados e piedade. Nos prédios de milhões, a dúvida é chegar na meta ou dobrar depois que ela chegar.
José e Kátia tomam a chuva fina que cai dos céus da vida e das emoções. O lugar que os acolheu, não há mais. Os tempos mudaram. Fratricidas de si mesmos, descobrem que não há porque se machucarem pela pessoa errada. No mundo, não existe contos de fadas. Fodas talvez. E apenas sofismas em cataclismos de lábios conectados e a frase para a amiga da Barra: “Dedicaram um livro pra mim!” Por fim, no fim de correr e percorrer a Floresta da Tijuca, factível ensejo do desejo da índia primeira, as curvas do carro transbordam de certeza e sina a cisma de saber que não há para onde chegar. Ao fim de tudo, apenas o mar, sorrisos, corpos limítrofes a se tocar, carícias de abrir e fechar o lugar que Tom Jobim fazia questão de estar. Assim, personagens e performances abruptos rompidos e rasgados sem saber em que horas estão, viram passado, histórias histriônicas a relembrar saudades desmesuradas em engano. Porquanto, só pra rimar, a incerteza de que alguém voltará a atender o telefone e, após milhões de dias dizer, resoluta: “José?”

terça-feira, 8 de abril de 2025

O Cair da Tarde de Ney Matogrosso

 Por Edmilson Siqueira*

 
Lançado em 1997, "O Cair da Tarde" é o décimo sexto álbum solo de Ney Matogrosso, um dos artistas mais versáteis e inovadores da música brasileira. Praticamente o único sobrevivente de um grupo que explodiu no Brasil na década de 1970, o Secos & Molhados, Ney construiu sólida carreira como intérprete, criando grandes sucessos e até hoje lotando casas de shows pelo Brasil afora. 
Neste disco, Ney presta homenagem a dois ícones da música brasileira: Heitor Villa-Lobos e Tom Jobim, interpretando composições desses mestres com a participação especial do grupo instrumental Uakti. Esse grupo, por sinal, é também inovador e talentoso: produz um som único e muito bonito a partir de instrumentos que eles próprios constroem e tem agenda repleta de shows no Brasil e no exterior. E pra ficar melhor ainda, o Uakti não está só: há um grupo de instrumentistas, digamos, convencionais em todas as faixas.
O "Cair da Tarde" é composto por 14 faixas que exploram a riqueza da música brasileira, combinando elementos eruditos e populares. Entre as canções, destacam-se interpretações de obras de Villa-Lobos, como "Melodia Sentimental" e "O Trenzinho do Caipira", além de "Águas de Março", esse só instrumental com o Uakti.


 
A faixa-título, "Cair da Tarde", que abre o disco, é uma composição de Villa-Lobos que captura a serenidade e a beleza do entardecer na floresta amazônica. A letra poética, de Dora Vasconcellos, e a melodia envolvente refletem a profunda conexão do compositor com a natureza brasileira. 
O disco, como um todo, é uma demonstração cabal da capacidade de Ney Matogrosso de transitar entre diferentes gêneros musicais e de reinterpretar clássicos da música brasileira com originalidade e sensibilidade.  
A surpreendente e sensacional colaboração com o Uakti adiciona uma dimensão única ao álbum, incorporando instrumentos não convencionais e sonoridades experimentais que complementam a voz distinta de Ney Matogrosso. Essa parceria resulta em arranjos inovadores que respeitam as composições originais, ao mesmo tempo em que oferecem uma nova perspectiva sobre elas.
Depois de "Cair da Tarde", o disco prossegue com as seguintes músicas:
- Modinha (Jobim e Vinicius)
- Veleiros (Villa-Lobos e Dora Vasconcellos)
- Tema de Amor de Grabriela (Jobim)
- Modinha (Serestas) (Villa-Lobos)
- Sem Você (Jobim e Vinicius)
- Melodia Sentimental (Villa-Lobos e Dora Vasconcellos)
- Canção em Modo Menor (Jobim e Vinicius)
- Prelúdio Nº 3 (Villa-Lobos e Hermínio Bello de Carvalho)
- Caicó (Tema folclórico)
- Cirandas: Se Essa Rua Fosse Minha, Terezinha de Jesus, Condessa, O Cravo Brigou com a Rosa (instrumental), A Maré Encheu e Passa Passa Gavião (instrumental)
- Trenzinho Caipira (Villa-Lobos com poema de Ferreira Gullar)
- Águas de Março (Jobim) 
- Pato Preto (Jobim)


 
Além do YouTube (https://www.youtube.com/playlist?list=PLrt7VbxNS8reSAh22GM5vP59kho3mcB--), o álbum está disponível em plataformas de streaming como Spotify e Apple Music. E também para compra nos bons sites do ramo.
 
*A pesquisa para este artigo foi auxiliada pela IA do ChatGPT.

segunda-feira, 7 de abril de 2025

Na estrada de Lenine e Jackson do Pandeiro

 Por Ronaldo Faria



-- Ele comprasse?
-- Comprou.
-- E pagasse?
-- Pagou.
-- E você cobrou o certo?
-- Decerto.
-- Como decerto? Cobrou ou não o certo?
-- Sei lá. Mal sei o valor das coisas. Ele pagou aquilo que você pediu.
-- E nem quis desconto?
-- Esse é o ponto. Quis.
-- E você deu?
-- Claro que não. Preço marcado é preço cobrado.
-- Fez bem. Então me passa a grana.
-- Que grana?
-- A que você recebeu pela venda.
-- Que venda?
-- A que eu te mandei fazer, caralho!
-- Essa? Essa não fiz.
-- Como não? Tu acabou de me dizer que faturou?
-- Me enganei.
-- Como assim?
-- Acabei embaralhando as ideias. Você pergunta muito.
-- E o que você fez com a mercadoria?
-- Troquei por um jumento com o Zé Lorota.
-- Como assim?
-- É que antes de encontrar o Bastião encontrei Zé Lorota. Ele viu o que eu levava e perguntou se eu queria trocar no jegue.
-- Como assim? E tu trocou?
-- Troquei. É que tu ainda não deu visão no Gumercindo.
-- Quem é Gumercindo?
-- o jegue!
-- Só pode ser brincadeira. Não acredito que você trocou a mercadoria num jumento.
-- Pois troquei. E nem precisa agradecer.
-- Agradecer? Você me fodeu!
-- Que é isso. O bichinho é novinho. Ainda tem muito pra viver.
-- Viver? É tu, seu cabra burro, que não tem mais vida pra cagada cometer!
Foram dois tiros certeiros: no peito e na cabeça. O “vendedor” nem precisou dar o último suspiro. Caiu sem estrebuchar. Logo ali do lado a feira de domingo rolava entre barracas de carnes, moscas e fubá. Mandioca, aipim e fruta de caju. E o barulho era tanto que o corpo só foi achado três dias depois por um moleque que corria atrás do maranhão perdido. Puto da vida com a grana da mercadoria perdida, o dono da venda tenta agora cruzar o jumento com sua égua preferida.
-- Pra alguma coisa essa merda tem que servir...
Do outro lado da cerca o animal zurra de felicidade.

sábado, 5 de abril de 2025

Forfé geral e Zé Ramalho

 Por Ronaldo Faria 


No forfé que Jeremias armou, sobrou pra todo mundo. De Epaminondas a Mané Piraju. Os meganhas chegaram batendo geral em todo mundo. Sobrou bordoada até para o Seo Gastão, senhor de 90 anos que batia ponto na birosca só pra achar que ainda estava vivo. Foi um tal de dizer “não sei quem foi” e “nem estou aqui” que o eco de qualquer caverna seria mentira de taverna. Os homens da lei não quiseram nem saber: desceram o porrete sem fé e nem dó. Da cintura pra cima, era tudo melhor. Do lado de fora, o sargento, que não aguentava ver sangue nem com unguento, só gritava “bate mais e manda ver que a cerveja depois é por minha conta”. Jeremias, o causador de tudo, apanhava sem dó e dor. Seu crime: amar a bela Marinalva, filha do doutor da cidade e das leis. Do lugar, o grande burguês. “Quem tirar mais sangue desse meleca de gente ganha um final de semana de folga inteirinho!”
-- Jeremias, tu me ama mesmo?
-- Claro, Marinalva. Daqui até depois do sol.
-- Que coisa mais linda de alguém falar.
-- Pra você eu serei sempre poeta. No funeral ou na festa!
-- Como você consegue rimar coisas tão díspares?
-- Disparo?
-- Deixa pra lá. Vem aqui me beijar.
O juntar dos dois surgiu de repente, no rompante que o amor dá e flerta em querer ser. Viram-se num entardecer na praça da igrejinha dedicada a São Simão. Ela comprava um sorvete de graviola. Ele ouvia a viola de Mestre Longuinho. Entreolharam-se de soslaio e dali surgiu um amor cheio de beijos e saudades afins. No outro encontro, sob o tronco de ingazeira, juntaram lábios e afagos, fogosos desejos e tragos de uma descansada em imburana que ele tinha trazido. Dali para depois não faltou nem um segundo. O mundo era pequeno para tanto calor e tocar, sublimar tristezas e desabrochar de riquezas. Eram potes e baús de gozo, salivas e trocar de gostos e gestos num gestual que nem mesmo o ser mais animal conseguiria fazer. E assim foram de encontro em desencontro a ver o mundo que não vai acabar. Mas, como em todo o conto de louvor há um Calabar, aos ouvidos do coronel Otílio a história foi chegar. Ferido no desejo de ver a filha casar com o varão do major Hermes Cançandão e juntar terras e riquezas, não pensou duas ou três vezes. “Antônio da Peixeira, vai na cidade e manda o sargento Pedro de Tonha descer o cacete geral. ” Nem precisou de resposta. O capanga montou o alazão e disparou pela estrada forrada de luar.
No bar do Crispim, ali aonde ainda tinha um pouco de felicidade, invadiram os oito soldados da lei que o grupamento dispunha. Coronel Otílio prometeu dar moedas que eles nem na melhor das loucuras saberiam dispor em alcunha. “Mas é só pra quem bater gostoso e bem dado. E em Jeremias vale isso e mais mil”, professa o cabra que dá as ordens do doutor. Depois de tal profecia, nem precisava cobrar que a coisa fosse bem feita. Rolou cacete e a cobra piou e a maritaca se arrastou. Quando os meganhas deixaram o lugar, estava tudo em cacos. Havia feridos, corpos ardidos, gritos urdidos. E lá num canto, sem encanto ou pranto algum, Jeremias jazia numa poça de sangue que parecia igual quando sua mãe teve seu cordão primeiro rasgado e partido.
-- E aí, tudo ajeitado?
-- Coronel, nem se você eu teria feito melhor ou igual.
-- Pague todos e deixe um troco para consertar o bar do Crispim. Diz pra ele que não foi nada de rixa. Só um acerto de contas. Senão, diga o que quiser. A vida é mesmo um faz de conta.
Seis meses depois, no dia de se casar com Carlão, filho do major Hermes Cançandão, Marinalva foi achada enforcada no pé de ingazeira, vestida de vestido de noiva e com um bilhete em que dizia sim para Jeremias. Nessa noite não houve folia. Deitado na rede a ver o mundão além das vistas que lhe pertencia, coronel Otílio disparou um tiro certeiro no coração.

quinta-feira, 3 de abril de 2025

Plantios

 Por Ronaldo Faria


Plantemos cervejas e cerejas. Uma para cada instante. Para agradar o ébrio e o infante. Aquele que dilacera seu coração e o outro que sonha no frescor da dor. Por isso, deixemos esse plantio brotar, emergir da terra, se transformar em mares e cantos de bar, meros lugares a andar. E levemos a produção até o público final. Cada um, decerto, saberá ao certo fazer com ela aquilo que tiver de ser feito. No peito desnudo, para um o gozo e ao outro o universo, o seu mundo disperso. Logo, plantemos cervejas e cerejas e esperemos as chuvas e sóis que as farão surgir. E se urgir o desejo de tê-las antes dos brotos brotarem, possamos dormir profundamente para tudo não matar antes de ser. Nalgum lugar, além-mar, outro alguém estará as mesmas sementes a regar...

terça-feira, 1 de abril de 2025

Morar em Babilônia

 Por Ronaldo Faria

 


Aurora está deitada no alpendre a tentar aprender a sina de viver. Em meio a descobrir que a cachaça derruba o bêbado e o ébrio de fim de semana, não se culpa de submergir à própria loucura. No alforje que sempre leva na busca de um cavalo branco e manco onde seguirá nua pelas areias brancas da última praia que conseguirá enxergar, o mistério do tédio em perfídia a tramar. Suas feridas, nunca cicatrizadas, são, pasmem, a certeza de que há nós atados nas estradas onde almas cansadas descansam sem saber.
Aurora, plenipotenciária senhora, jovem demais à eternidade e idosa dadivosa ao momento pleno, sabe que o agora é muito pouco. O homem que a segue, rouco, estupefato pelo fato de somente a conhecer, não passa de um louco a quem deixaram sair do hospício sem a camisa de força. Por ele Aurora tem pena. E nessa piedade segue a procissão que o padre Narciso, seguidor de Padim Ciço, clama por alívio da dor. Nela, uma ou outra beata chora lágrimas que podem fazer a semente brotar no chão esturricado e pisado do sertão.
O amanhã será, decerto e quase certo, incerto e presto, pronto, um novo incesto. No verso do sanfoneiro cego que toca debaixo do umbuzeiro, o casal acasalado e agarrado prepara o gozo que se fará vida nova para o lugarejo colocar na estatística do IBGE outro nascituro a menos. No rádio de galena surge o narrador a vibrar com o gol do Flamengo. Para Aurora, melhor fosse que no meio do rio seco surgisse a galera lusitana para navegar além da janela ou da gamela onde descansam as tripas do carneiro esquartejado.
-- Aurora, posso entrar?
-- Claro. Só não sei se terá cama para recostar.
-- Não tem problema. Não sei dizer nada mais que um fonema. Qualquer coisa, apelamos para telegrama ou telefonema... quiçá uma dança. Na eletrola, a folia vai rolar.

domingo, 30 de março de 2025

Clima de jazz

 Por Edmilson Siqueira


 O disco se chama "Jazz Moods", o que pode ser traduzido para "Clima e Jazz" ou algo parecido. Só que o conteúdo é de jazz puro, o que, obviamente, cria muito mais que um clima para se ouvir grandes instrumentistas. 
E são grandes mesmo. Olha só a seleção das 12 faixas: Stan Getz, Dave Brubeck, Stephanie Garappelli, Kai Winding, Gerry Nulligan, Dizzie Gillespie, Phil Woods, Winton Marsali, Chick Corea, Gary Burton, Art Blakey & The Jazz Messengers e Michael Urbaniak. Só cobra criada, como diria Adelzon Alves no programa "Amigo da Madrugada", lá na Rádio Globo do século passado. 
Convenhamos: juntar um time desse num só disco já é uma façanha. Infelizmente, a única informação do pobre folheto do CD que tenho, é que todas as gravações foram produzidas pelo RTV Communications Group, da Flórida (USA). E o CD é inglês. Ainda bem que a lista das músicas traz os intérpretes, compositores e onde e quando foram gravadas. 
Assim, é possível saber que a primeira faixa - "Autum Leaves"  e apresentada por Stan Getz - é de autoria de Kosma, Prevert, Mercer e Parsons e foi gravada ao vivo num Concerto na Riviera, em Cannes (FR) em 23 de janeiro de 1980. Acompanharam Getz, Andy Leverne, Brian Bromberg e Chuck Loeb. E, como praticamente todas as outras faixas, se trata de um clássico, inclusive essa versão de Getz, que, digamos, viralizou à época, quando esse verbo só era usado em relação a perigosos vírus. 
 


A segunda faixa fez parte de um disco histórico de Dave Brubeck: "Blue Rondo" (Brubeck) e essa gravação também foi feita ao vivo, no mesmo local da primeira faixa, só que três anos e cinco dias depois. Brubeck se apresentou com Chris Brubeck, Rabdi Jones e Bill Smith.
Em seguida aparece Kai Winding, com Frank Strazzeri, Kevin Brandon e Ted Hawke numa gravação de estúdio, realizada em Hollywood (CA) em primeiro de setembro de 1977. Se o grupo não é muito conhecido por aqui, a música é. Trata-se de "Morning of the Carnival", a nossa Manhã de Carnaval de Luiz Bonfá e Tom Jobim. Preciosa gravação, diga-se.
O grande Gerry Mulligan vem a seguir, com "Applecore 6.16" dele mesmo. O time que o acompanha é dos mais respeitáveis: Lionel Hampton, Hank Jones, Bucky Pizzarelli, George Duvivier, Grady Tate e Candido Camero. 
Dizzy Gillespie, que dispensa comentários, é o dono da sexta faixa, "Slewfoot" (Bland). A gravação não tem data nem local, mas as palmas no fim (se não foram acrescidas) revelam uma gravação ao vivo. E no palco estavam outros 14 músicos fazendo a cozinha toda para o sopro majestoso de Gillespie. 
"Caravan" (D. Ellington, Tizol e Mills) com Phil Woods pede passagem na sétima faixa.  O grande saxofonista do jazz está acompanhado aqui de John Fosset, Marc Fosset e Louis Bellson. A faixa foi gravada já num estúdio digital em Ohio (USA) em 22 de setembro de 1987.
 


O estudioso da história do jazz, grande trompetista e diretor da Jazz at Lincoln Center Orchestra em Nova Ypork, Winton Marsalis, se incumbe da mais que clássica "My Funny Valentine" (Rodgers e Hart) na oitava faixa. Com um time excepcional - Bobby Watson, Billy Pierce, Charles Farnbrough, Jimmy Willian e Art Blakey - a música foi grava ao vivo no Bubba's Restaurant em Fort Lauderdale, na Flórida em 11 de outubro de 1980. 
O Concerto de Riviera, em Cannes, é o responsável por mais uma faixa do disco. Gravada também em janeiro de 1980 (não há registro do dia), "Moment's Notice" (John Coltrane) nos traz ninguém menos que o grande pianista Chick Corea, acompanhado da Oliver Jackson Orchestra.
 A décima faixa - "African Flower" (D. Elington) ficou para Gary Burton com seu vibrafone, acompanhado de piano, bateria e contrabaixo nas mãos de Ahmad Jamal, Sabu Adeyola e Payton Crossley. Também gravada no Concerto da Riviera em Cannes, em 26 de janeiro de 1980.
 A décima-primeira faixa ficou com Art Blakey & The Jazz Messengers. Trata-se de "A Wheek Within A Wheel" (Watson). Na gravação, também em 11 de outubro de 1980 na Riviera, os "jazz messengers" de Blakey foram Winton Marsalis, Billy Pierce, Jimmy Willians, Charles Farnbrough e Ellis Marsalis.
 E, por fim, a última faixa, a mais recente de todas, gravada em 1993, no Village Vanguard, é com polonês Michal Urbaniak. Violinista, saxofonista, compositor e arranjador, ele toca "Softly As In A Morning Sunrise" (Romberg e Hammerstein), acompanhado de piano, bateria e contrabaixo de Mike Gerber, Ron Carter e Lenny White 
 Enfim, trata-se de um grande disco, com músicos e repertório excepcionais. Não encontrei no YouTube para ouvir de graça. Mas há alguns exemplares à venda no Mercado Livre.

Com os Paralamas do Sucesso e a porra de uns óculos que não dão pra ver a tela direito

 Por Ronaldo Faria Óculos trocado porque o outro estava embaçado. Na caça da catraca de continuar a viver ou da contradança do crer vai ag...