Ninguém cantou soul music como ele e, dificilmente alguém
cantará. Ele saiu de um emprego comum onde ganhava pouco, aos 15 anos para
entrar na banda de Little Richard e ganhar algum dinheiro a mais e ajudar a
família. Onze anos depois, ele morreu num acidente de avião. Nesse curto espaço
de tempo, se transformou num dos maiores cantores do EUA e, com certeza, no
maior, até hoje, de soul e rhythm and
blues.
Estou falando de Otis Redding, nascido na cidade de
Dawson, na Georgia, em 1941. Sua carreira foi meteórica. Após participar do
grupo que acompanhava Little Richard, dois anos depois juntou-se à banda de
Johnny Jenkins, The Pinetoppers, com quem fez uma excursão pelos estados do Sul
como cantor e crooner. Uma apresentação em uma sessão de gravação da gravadora
Stax, levou-o a assinar um contrato para gravar seu primeiro single,
"These Arms of Mine", em 1962.
A própria Stax lançou o álbum de estreia de Redding,
"Pain in My Heart", dois anos depois. Inicialmente popular
principalmente entre os afro-americanos, Redding mais tarde alcançou um público
mais amplo de música pop americana. Junto com seu grupo, ele fez pela primeira
vez pequenos shows no Sul dos Estados Unidos. Mais tarde, ele se apresentou no
popular clube noturno de Los Angeles Whiskey a Go Go e viajou pela Europa, se
apresentando em Londres, Paris e outras cidades importantes. Ele também se
apresentou no Monterrey Pop Festival em 1967, poucos meses antes do fatídico
voo.
A Spotfy anuncia sua discografia de estúdio completa em
dez álbuns e, claro, ele não pode ter gravado mais que isso em apenas onze
anos, já que sua principal atividade eram as excursões, inclusive fora dos EUA.
Seu estilo único, derivado do gospel e sua facilidade de
interpretação, aliada a uma voz marcante e sincera, fizeram dele, rapidamente,
um ídolo. Sua facilidade em enveredar pela música, fazendo improvisos que
poucos conseguiram ou conseguem, deram a ele um lugar de destaque num mercado
musical que já era gigantesco na metade dos anos 1950.
Seu primeiro disco já continha cinco composições suas,
provando que ali estava nascendo um fenômeno. Acompanhado de uma banda enxuta -
três metais, guitarra, bateria e contrabaixo - Otis colocava sua voz como mais
um instrumento, sem jamais perdeu a profundidade de seu canto e a sinceridade
de interpretação.
Um dia, navegando pela
Amazon, deparei com uma oferta de uma caixinha com cinco CDs de Otis
Redding e outra de Sergio Mendes. A dos brasileiros já foi assunto aqui. Eu me
lembro que dei uma vasculhada na oferta e descobri que eram cinco discos de
estúdio de Otis, todos eles com as capas originais - o que, aliás, torna
impossível ler os textos das contracapas que, na cópia para o tamanho CD,
ficaram quase microscópicos.
Mas eram os cinco discos iniciais de Otis, o que me daria,
além do prazer de ouvi-lo cantar, uma boa ideia da carreira desse fabuloso
astro.
Além de "Pain in my Heart", a caixa traz
"The Great Otis Redding Ding Soul Ballads", "Otis Blue - Otis
Redding Sings Soul", "The Soul Album" e "Complete &
Unbelievable - The Otis Redding Dictionary of Soul".
Entre as 59 músicas - são 12 em três discos e 11 nos
outros dois, que era o que cabia nos LPs - estão alguns de seus maiores
sucesso, como "Pain in my Heart", "Stand By Me", These Arms
of Myne" e Lucille", todas do primeiro disco. No segundo, destaques
para "That's How Strong My Love Is", Nothing Can Chance my Love"
e Home in your Heart". No terceiro, logo na segunda fa0xa,
"Respect", um megassucesso de Otis e, na quinta, "I've Been
Loving You Too Long", que depois foi gravada também pelos Rolling
Stones. E ainda há "My Girl"
(outra gravação dos Stones) e, invertendo o jogo, "Satisfaction" o
eterno hit da banda inglesa, que nunca escondeu suas origens no soul e rhythm and
blues. Aliás, essa gravação de Otis virou cult e até hoje é lembrada pelos
amantes do rock.
O quarto disco traz um texto na contracapa, sem
identificação do autor, que começa assim: "Há muitos cantores de soul, mas
grandes cantores são raros. Otis Redding é um dos grandes. Em poucos anos ele se
tornou conhecido, através das suas gravações de sucesso e suas excitantes
apresentações, como um digno sucessor dos legendários cantores de blues do
passado. É um disco onde as
interpretações de Otis atingem quase um ápice.
O quinto e último disco da caixa, começa com outro
sucesso: "Fa-Fa-Fa-Fa-Fa (Sad Song)", mas contém uma das melhores
interpretações de Otis, que até hoje é muito tocada em rádios voltadas ao jazz
e ao soul: "Try a Little Tenderness", grava por muita gente depois
dele. Outra, digamos curiosidade do disco, é a versão dele para "Day
Tripper", de Lennon e McCartney.
Os discos lançados depois desse, ou eram gravações que
ele já havia feito em estúdios para lançamentos futuros, ou gravações ao vivo
de seus muitos shows, não só nos Estados Unidos.
E do seu maior sucesso, a composição sua e de Cropper,
"Sittin' on the Dock of the Bay", que a tantos encanta até hoje, ele
não desfrutou. Seu lançamento foi póstumo, como póstumos foram muitos prêmios
que ele recebeu, bem com a criação de prêmios com seu nome, a inclusão em
vários Halls of Fame e a colocação de seus discos em muitas listas de melhores
de todos os tempos.
Enfim, o mundo perdeu, precocemente, um artista que, com
certeza, tinha muito ainda a nos mostrar nas décadas seguintes. Se vivesse até
hoje, teria 83 anos, só três anos a mais que Mick Jagger que ainda está por aí,
esbanjando energia e talento.
A caixa com os cinco CDs está à venda por aí, nos bons
sites do ramo. Vale a pena.