Por Ronaldo Faria
“A igreja de pedras,
benfazeja, bendiz quem é puritana ou meretriz?”, se questionou Tâmara
travestida de beata. Na exata hora que saía a procissão, a cisão entre o
entrevero e o esmero que surgiu horas antes, por causa de um reles diamante. “Afinal,
quem te deu?” – perguntava incisivo o delegado gordo e careca que, sentado atrás
da mesa ensebada, se dizia autoridade da festa. Na testa, restos do frango que
comeu. Na boca, pedaços devassos de uma vida sem graça. Para ele, tanto fez, fazia
ou fará o amanhã. Fosse um dos três mosqueteiros da literatura, nunca seria D'artagnan.
Quem sabe um bufão. Senão, um pé de página de ermitão, desses que ninguém sabe,
nunca viu ou verá. Mas, lá estava ele, alienado de tudo a perguntar. Tâmara, em
sua tragédia que a comédia abarcaria sem pestanejar, não quer sequer rir. Para
ela, a vida é apenas um chegar sem saber onde irá chegar. Na fé, certamente
haverá algum lugar. No olhar daquele que na cena não está, talvez no colarinho
que sobe há somente uma brisa de se viver. Quiçá, um rolê. “Daqui, no turbo freezer
ligado para vencer o calor que se esparrama no horror, vou passando vontade daquilo.”
Tâmara, tresloucada na sua loucura famélica, famigerada até o sol nascer, crê
que os próximos capítulos irão capitular em sonoras Babilônias que se fuma do bom
na sala de estar. No Baixo Leblon, a alternância de uma noite em noir francês e algo que só saberá quem
falar inglês. No mundo que se espraia na praia, dois corpos prostrados ao amor
maior se embrenham no briefing de
nada escrever. “Não posso esquecer de que a vida é um mero transcender. Na
próxima hora, talvez nem respire ou inspire na inspiração que a transição performática
nos dá.” Para Tâmara, a pisar os pés na areia fofa que fosca lua deixa esgueirar,
talvez algum passo vire prosopopeia em cafeína pura. Senão, quem sabe uma droga
pesada no café esturricado da manhã. Todavia, entretanto e porém, nunca
saberemos o que a vida nos trará. Em algum lugar da terra, um trator amassa o
que alguém, há tempos, construiu para ser para sempre.
(Com Rashid a rodar)